Communicatio idiomatum

A communicatio idiomatum (em português, “comunicação de idiomas”) é um conceito da cristologia qu se refere à interação entre as naturezas divina e humana de Jesus Cristo, afirmando que, em Cristo, as propriedades e características de ambas as naturezas podem ser compartilhadas e atribuídas mutuamente, sem confusão ou alteração. Essa doutrina é fundamental para a compreensão da união hipostática — a união das duas naturezas em uma única pessoa.

O conceito tem suas origens nos escritos patrísticos, especialmente em Cirilo de Alexandria no século V. Cirilo empregou essa ideia para combater o nestorianismo, uma heresia que negava a união plena das naturezas divina e humana em Cristo. Para Cirilo, essa união é tão profunda que se pode afirmar que propriedades divinas se aplicam à humanidade de Cristo e vice-versa. Sua formulação foi essencial para as decisões teológicas do Concílio de Éfeso (431) e do Concílio de Calcedônia (451), que consolidaram a compreensão ortodoxa da pessoa de Cristo.

Teólogos posteriores refinaram o conceito, distinguindo diferentes aspectos ou “tipos” de communicatio idiomatum. O primeiro é a atribuição genérica de propriedades de uma natureza à outra, como quando se afirma que “Deus morreu na cruz”, reconhecendo que a morte, própria da natureza humana, é atribuída à pessoa divina por meio da união hipostática. O segundo é a atribuição específica de propriedades, como no caso de dizer que “o Filho de Deus foi crucificado”, atribuindo o sofrimento humano à segunda pessoa da Trindade. Por fim, há a atribuição idiopática, que se refere à possibilidade de afirmar, por exemplo, que “Maria é a Mãe de Deus”, reconhecendo que a maternidade se refere à pessoa divina encarnada, embora Maria seja plenamente humana.

A communicatio idiomatum tem um papel crucial na teologia cristã, especialmente para a compreensão da pessoa de Cristo e sua obra salvífica. Essa doutrina permite afirmar que Jesus é verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, sem divisão, separação, confusão ou mudança. Ela também fundamenta declarações como a de que “Deus sofreu na cruz”, sem implicar que a natureza divina, em si mesma, seja passível de sofrimento.

Ao longo da história, a communicatio idiomatum tem sido objeto de debates teológicos. Algumas controvérsias giram em torno dos limites da comunicação entre as naturezas de Cristo, especialmente quanto à possibilidade de atribuir características de uma natureza à outra. Outros debates se relacionam à kenosis, a ideia do auto-esvaziamento de Cristo na encarnação, e às suas implicações para a mariologia, em particular o papel de Maria como a “Theotokos” (Mãe de Deus).

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