Fides Infantum e Fides Infusa

Fides Infantum e Fides Infusa são conceitos da teologia magisterial sobre a fé, especialmente no contexto do batismo, da vida espiritual das crianças e da natureza da graça divina. Essas ideias foram moldadas por Agostinho de Hipona, Tomás de Aquino, Martinho Lutero e Ulrico Zuínglio. Essas doutrinas discorrem como a fé é percebida em relação aos infantes e à vida cristã em geral.

Fides Infantum (Fé dos Infantes)

Fides Infantum, ou a fé dos infantes, refere-se ao conceito teológico que aborda o estado espiritual dos infantes, particularmente em relação ao batismo e à salvação. Propõe a discutir como os infantes, que ainda não podem crer conscientemente, podem ser receptores da fé e da salvação.

  1. Agostinho de Hipona: Agostinho foi fundamental no desenvolvimento da ideia de fides aliena, que se refere à fé de outros—tipicamente dos pais ou da Igreja—sendo aplicada aos infantes durante o batismo. Esse conceito lançou as bases para entender como os infantes poderiam receber a fé de maneira vicária, apesar de sua incapacidade de crer conscientemente. A ênfase de Agostinho no pecado original tornava o batismo infantil essencial para a salvação, uma vez que ele postulava que, sem o batismo, mesmo os infantes seriam excluídos da visão beatífica de Deus.
  2. O Destino dos Infantes Não Batizados: No contexto de fides infantum, o destino dos infantes não batizados tem sido um tema de debate teológico:
    • Limbo: Tradicionalmente, a Igreja Católica ensinava que infantes não batizados iriam para o limbo, um estado de felicidade natural, porém sem a visão beatífica de Deus. O limbo não era considerado um lugar de sofrimento, mas sim uma forma de exclusão da plenitude da comunhão com Deus.
    • Batismo de Desejo e Fé Parental: Alguns teólogos, influenciados pela ideia de fides aliena, argumentaram que a fé dos pais ou da Igreja poderia, de alguma forma, bastar para o infante. Outros propuseram o conceito de batismo de desejo, sugerindo que a misericórdia de Deus poderia estender a salvação a esses infantes por meio de um desejo implícito pelo batismo.
  3. Perspectivas Protestantes: Durante a Reforma, figuras como Martinho Lutero e Ulrico Zuínglio engajaram-se com o conceito de fides infantum no contexto do batismo infantil:
    • Martinho Lutero: Lutero argumentava que os infantes poderiam possuir sua própria fé, concedida por Deus, no momento do batismo. Ele enfatizava a importância da ação de Deus nos sacramentos, sugerindo que mesmo os infantes poderiam receber o dom da fé, alinhando-se com sua crença na salvação pela fé somente.
    • Ulrico Zuínglio: Zuínglio divergia de Lutero e dos ensinamentos católicos, vendo o batismo mais como um ato simbólico de inclusão na comunidade do que uma concessão de fé. Ele questionava a necessidade do batismo infantil para a salvação, argumentando que a fé não estava vinculada ao sacramento em si.

Fides Infusa (Fé Infusa)

Fides Infusa refere-se ao conceito de fé infusa, um dom sobrenatural de Deus que permite à pessoa acreditar nas verdades da fé cristã. Essa ideia é central para a teologia católica, particularmente no âmbito do pensamento escolástico.

  1. Tomás de Aquino e a Fé Infusa: Tomás de Aquino foi instrumental na articulação da doutrina de fides infusa. Segundo Aquino, a fé infusa é distinta da fé adquirida, que vem por meio do raciocínio humano e do estudo. A fé infusa é um dom divino dado no batismo que santifica a alma, permitindo que ela compreenda e consinta às verdades sobrenaturais.
    • Graça Santificante: Aquino ensinava que a fé infusa faz parte da graça santificante, que inclui as virtudes teológicas da fé, esperança e caridade. Essa graça não é merecida pelo esforço humano, mas é concedida gratuitamente por Deus como fundamento para a vida espiritual e o início da jornada para a salvação.
    • Necessidade para a Salvação: Na doutrina católica, fides infusa é necessária para a salvação, pois permite que os crentes sustentem as verdades divinas com certeza. Aquino enfatizava que essa fé não é simplesmente um assentimento intelectual, mas uma virtude infundida por Deus que orienta a alma em direção a Ele.
  2. Comparação com a Fé Adquirida: A fé infusa contrasta nitidamente com a fé adquirida, que resulta do estudo, da reflexão e do processo humano natural de aprendizado. Embora a fé adquirida possa levar à compreensão, ela é insuficiente para a salvação sem a graça infusa que transforma e eleva a natureza humana para participar do divino.

Influência na Doutrina Católica

O conceito de fides infusa é afirmado nos ensinamentos católicos e continua sendo um alicerce da compreensão da fé e da graça pela Igreja. O Concílio de Trento (1545–1563), que abordou muitas questões levantadas durante a Reforma Protestante, reforçou a importância da graça infusa e da fé no processo de justificação e salvação. A teologia católica continua a ver fides infusa como um elemento fundamental da vida cristã, capacitando os fiéis a aceitar e viver de acordo com as verdades divinas.

Perspectiva do batismo dos crentes

Os defensores do batismo dos crentes argumentam que o batismo só deve ser administrado àqueles que podem professar conscientemente a sua fé em Jesus Cristo. Esta perspectiva rejeita inerentemente os conceitos de fides infantum e fides infusa, uma vez que não reconhecem as crianças como capazes de ter fé ou de compreender o significado do baptismo.

A rejeição da fides infusa alinha-se com a crença de que a fé não é algo que pode ser transmitido ou infundido; antes, é uma resposta pessoal à revelação de Deus. Esta visão enfatiza uma compreensão relacional da fé, onde os indivíduos devem envolver-se ativamente com a sua crença, em vez de confiar na fé de outros (como os pais ou a igreja).