O Livro de Ester é um romance da diáspora. Com astúcia e coragem, a moça Ester salva o povo judeu de um genocídio.
Canonicidade e Testemunhas Textuais
A canonicidade de Ester gerou debates históricos entre as comunidades religiosas, mas é agora amplamente aceita tanto por judeus como por cristãos.
O Livro de Ester, embora não mencionado no Novo Testamento, em Filo ou em Qumran, possui uma rica história textual. Sua mais antiga menção vem de Flávio Josefo, o qual sumarizou a história de Ester em suas Antiguidades Judaicas (11.184-296), demonstrando seu conhecimento e relevância no período. Já por volta de 135 d.C., Aquila elaborou uma tradução grega da Bíblia Hebraica, da qual um fragmento de sua versão de Ester sobreviveu em Ester Rabá 2:7, evidenciando que considerava Ester como Escritura. Os manuscritos mais antigos que possuímos incluem o Códice de Leningrado 19A, o Códice Vaticano e o manuscrito 319 da Septuaginta. A Vetus Latina, uma antiga tradução latina, também contém uma versão de Ester, datada de 330-350 d.C. As testemunhas textuais posteriores revelam uma abundância de manuscritos hebraicos, visto ser um dos livros mais copiados das Escrituras. As versões gregas, notadamente a LXX e o Texto Alfa (AT), apresentam seções adicionais ausentes no Texto Massorético.
Autoria e Data
A autoria de Ester permanece indefinida, envolta em anonimato. Alguns especulam o envolvimento de figuras como Mardoqueu, Esdras ou Neemias, mas as evidências são escassas. A narrativa do livro provavelmente situa-se entre 464-400 aC, sendo ambientado no período persa alinhado com o reinado de Xerxes (486-465 aC), embora Artaxerxes I ou Artexerxes II também sejam indicados como potenciais identidades para o rei Assuero.
Discrepâncias textuais
Os acréscimos gregos a Ester, especialmente nos capítulos 11-16, introduzem discrepâncias e expansões notáveis ausentes no Texto Massorético hebraico. Estas adições, embora ausentes nas tradições talmúdica, targúmica e siríaca, concentram-se em elementos religiosos, detalhes históricos e enfatizam a intervenção divina. Não foram encontrados versões de Ester entre os manuscritos do Mar Morto, mas há um putativo Apócrifo de Ester de Massada.
Debates sobre canonicidade
A canonicidade de Ester enfrentou escrutínio nos círculos judaicos, com a sua ausência nos Manuscritos do Mar Morto levantando questões. Embora a versão do Old Greek (a Septuaginta) conste esse livro, as opiniões variaram entre os rabinos. Os primeiros debates cristãos incluíram a observação de Jerônimo de que os acréscimos estavam ausentes nos textos hebraicos de sua época.
O livro de Ester aparece entre os Cinco Megillot dos Escritos na versão hebraica. Já nas versões gregas aparece no final dos livros históricos.
Historicidade
A historicidade de Ester, antes amplamente aceita, agora encontra questionamentos. Improbabilidades e contradições com fontes externas, como Heródoto, levantam dúvidas. No entanto, o livro se alinha com os costumes, a arquitetura e os nomes persas/iranianos, sugerindo um cenário histórico. A continuidade da tradição do purim é um elemento para reivindicar sua historicidade.
Gênero e Objetivo
O gênero de Ester abrange elementos de conto de sabedoria, conto de corte, história da diáspora, comédia e etiologia de festival. Seu propósito vai além da documentação histórica, visando dar legitimidade à festa de Purim, não instituída na Lei Mosaica, e incentivar a resistência à assimilação.
Teologia
Embora a presença de Deus permaneça oculta (é o único livro bíblico sem referência explícita sobre Deus), temas religiosos permeiam Ester. O jejum, as coincidências providenciais e a declaração de Mardoqueu sobre o papel de Ester sublinham a intervenção divina, mesmo no oculto. Os motivos teológicos destacam a interação entre a ação divina e a iniciativa humana.
Esboço estrutural
- Contexto Histórico e Apresentação dos Personagens (1:1-22)
Apresentação do rei Assuero, seu vasto império e a rainha Vasti.
Banquete real e a deposição da rainha Vasti por desobediência.
Busca por uma nova rainha e a seleção de Ester.
Mordecai, primo e tutor de Ester, e sua importância na trama. - A Ascensão de Ester e a Conspiração de Hamã (2:1-18)
Ester é levada para o harém real e se destaca entre as candidatas.
Ester é coroada rainha, mas mantém sua identidade judia em segredo.
Mordecai descobre uma conspiração contra o rei e a revela através de Ester.
Hamã, um oficial de alta patente, é promovido e exige honra de todos. - O Decreto de Extermínio e o Desespero dos Judeus (3:1-15)
Hamã, enfurecido por Mordecai não se curvar diante dele, planeja destruir todos os judeus do império.
Hamã lança sortes (Purim) para determinar a data do extermínio.
O rei Assuero, sem saber do ódio de Hamã contra os judeus, assina o decreto.
A notícia do decreto se espalha e causa grande desespero entre os judeus. - A Coragem de Ester e a Reviravolta da História (4:1-17)
Mordecai informa Ester sobre o decreto e a persuade a interceder pelo povo judeu.
Ester, apesar do risco, decide revelar sua identidade judia ao rei.
Ester organiza um banquete para o rei e Hamã, onde revela o plano de Hamã.
O rei, furioso, ordena a execução de Hamã e eleva Mordecai a uma posição de destaque. - A Salvação dos Judeus e a Festa de Purim (5:1-10:3)
Ester intercede novamente pelo povo judeu, e o rei permite que eles se defendam.
Os judeus se reúnem e derrotam seus inimigos, liderados por Mordecai.
É instituída a festa de Purim para comemorar a salvação dos judeus.
Mordecai se torna o segundo homem mais poderoso do reino, e Ester é honrada por sua coragem.
