Problema da linguagem teológica

O problema teológico da linguagem é como a linguagem humana pode expressar ou descrever adequadamente Deus, dadas suas limitações inerentes e a natureza transcendente do divino. Essa questão insere-se tanto em epistemologia e na filosofia da linguagem religiosa.

Três abordagens oferecem respostas a esse problema: a univocidade, equivocidade e analogia. Elas têm sido assuntos de extensa discussão desde filósofos gregos e pensadores escolásticos até filósofos da linguagem contemporâneos, bem como cientistas da cognição e linguistas.

A univocidade refere-se à proposição de que uma palavra possui um potencial referencial. Isto é, há uma correspondência segura entre a palavra e o objeto que a denota. Às vezes, a univocidade tem sido intimamente associada ao isomorfismo, uma crença que afirma que as palavras refletem com total precisão a realidade que elas expressam.

No polo contrário, a equivocidade apresenta uma perspectiva que desafia a noção de significado fixo atribuído às palavras, antecipando potenciais mal-entendidos em todas as formas de comunicação.

No meio do caminho entre essas duas perspectivas, Tomás de Aquino introduziu a teoria da analogia na linguagem. Essa teoria postula que a fala pode ser entendida proporcionalmente ao discernir tanto as semelhanças quanto as diferenças entre um objeto e sua representação. Assim, ainda que limitada, a linguagem é adequada para comunicar coisas divinas.

No discurso teológico contemporâneo, há quatro campos distintos continuam a empregar inconscientemente combinações dessas abordagens.

O literalismo, muitas vezes considerado como uma ideologia da linguagem, prioriza as funções semânticas e referenciais da linguagem sobre seus aspectos pragmáticos, performativos ou dependentes do contexto (Coleman, 2006). Os defensores dessa perspectiva veem a linguagem e as proposições como o meio ideal de articular discussões sobre Deus. A univocidade considera uma relação íntima entre linguagem e realidade, sem maiores problemas ou limitações para a completa comunicação mediante a linguagem humana. A crença na univocidade por vezes recebe o nome de literalismo. Contudo, não se trata de uma leitura literal, pois muitos que se identificam como leitores literais apelarão para a linguagem simbólica ou contextualizada quando encontram passagens.

Uma abordagem alternativa é o raciocínio analógico, que reconhece as limitações inerentes da linguagem humana ao descrever o divino. É guiado por vários pressupostos:

  • A linguagem é confinada pela condição humana decaída e pelas terminologias e restrições contextuais do mundo cultural.
  • A linguagem emprega relações análogas, símbolos e figuras de linguagem.
  • A linguagem permanece adequada, apesar de suas limitações, para comunicar a revelação de modo humanamente compreensível.
  • A linguagem nunca pode capturar exaustivamente toda a essência de um assunto.
  • Somente Jesus, como o Logos (a Palavra de Deus), espelhou perfeitamente a realidade divina.

A linguagem analógica é semelhante ao emprego de vários mapas para representar os mesmos territórios, com alguns mapas servindo a propósitos específicos, enquanto nenhum pode abranger totalmente todos os aspectos do território.

Uma posição minoritária, é a teologia negativa. É encontrada entre adeptos da deconstrução de Derrida, místicos, na teologia apofáttica e nas vertentes niilistas. Postula que a linguagem seja totalmente incapaz de comunicar as coisas divinas. Assim, há uma dependência em outras formas epistemológicas (experiências, por exemplo) para uma plena compreensão da realidade divina.

Por fim, a teoria da inefabilidade desafia a suposição tradicional de que a linguagem seja o único veículo para obter o conhecimento e o significado. Embora reconheça a capacidade comunicativa de transmissão do conhecimento pela linguagem, admite a existência de um domínio de experiência ou compreensão que transcende os limites da linguagem. Considera o conhecimento tácito, o raciocínio contingencial, formas não verbais de comunicação, conhecimentos relacional e a posteriori. Essa perspectiva pode ser encontrada em várias tradições filosóficas e religiosas e se cruza com tópicos como misticismo, ceticismo religioso e as limitações da cognição humana.

BIBLIOGRAFIA

Ashworth, E. Jennifer and Domenic D’Ettore, “Medieval Theories of Analogy”, The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Winter 2021 Edition), Edward N. Zalta (ed.), https://plato.stanford.edu/archives/win2021/entries/analogy-medieval/.

Coleman, Simon. “When silence isn’t golden : Charismatic speech and the limits of literalism”. In Matthew Engelke & Matt Tomlinson (eds.), The Limits of Meaning: Case Studies in the Anthropology of Christianity. Berghahn Books, 2006 pp. 39–63.

Rayment-Pickard, Hugh. Impossible God: Derrida’s Theology.  Taylor & Francis, 2018.