Comma Johanneum

O Comma Johanneum (ou Comma Johannina) refere-se a uma frase que consta em alguns manuscritos de 1 João 5:7-8, que descreve a unidade das três pessoas da Trindade.

Comma Johanneum ou Comma Johannina é o texto em manuscritos latinos (e cerca de uma dezena manuscritos gregos tardios) de 1 João 5:7-8, onde se lê:

“Porque três são os que testificam no céu: o Pai, a Palavra e o Espírito Santo; e estes três são um. E três são os que testificam na terra: o Espírito, e a água, e o sangue; e estes três concordam num.”

Na quase totalidade dos manuscritos gregos aparece:

Temos, portanto, três testemunhas,o Espírito, a água e o sangue, e as três concordam entre si.

O Comma Johanneum está ausente na vasta maioria dos manuscritos gregos do Novo Testamento, aparecendo somente em oito manuscritos tardios, dos quais quatro contêm a passagem apenas em notas marginais adicionadas posteriormente. O manuscrito grego mais antigo que inclui a frase no texto principal data do século XIV. A ausência da passagem em escritos patrísticos e em manuscritos anteriores indica que o texto não fazia parte do original. Uma observação corrente é que, se essa passagem estivesse disponível, teria sido usada nos debates teológicos dos primeiros séculos sobre a Trindade.

A cláusula foi introduzida na Vulgata Latina após o século IV, possivelmente como uma glosa em um manuscrito latino. Esta prática de inserir notas marginais no corpo do texto principal pode ter contribuído para sua disseminação. O primeiro manuscrito grego conhecido que contém o Comma, o Codex Montfortianus (ca. 1520), foi produzido após a circulação das primeiras edições do Novo Testamento grego impresso. Este manuscrito foi apresentado a Erasmo de Roterdã, que, após não incluir a passagem nas duas primeiras edições de seu Novo Testamento grego, decidiu incorporá-la na terceira edição (1522), devido à pressão e ao aparecimento deste manuscrito.

A Comma Johanneum não se aparece nas tradições manuscritas copta, armênia, georgiana, etíope, árabe, eslava, gótica e siríaca. Contudo, retraduções nessas línguas do final da Idade Média, a partir do século XIV, que têm como base o latim ocasionalmente constam essa passagem. Essa cláusula aparece apenas em alguns manuscritos latinos dos séculos VI-VII em diante, com uma difusão cada vez maior a partir do final da Idade Média.

A inclusão do Comma Johanneum influenciou a tradução do Novo Testamento em algumas tradições. A maioria das traduções modernas a omite. Tradutores como Martinho Lutero não a incluíram inicialmente em suas obras, embora edições posteriores de sua tradução alemã tenham adicionado a cláusula.

Biblistas como Wettstein e Metzger sustentam que a cláusula se originou em homilias latinas do século IV, onde o texto foi interpretado alegoricamente para referir-se à Trindade. De lá, a passagem foi incorporada a cópias da Vulgata Latina. A inclusão no Novo Testamento grego de Erasmo provavelmente decorreu de pressões teológicas e políticas, refletindo os debates religiosos do período da Reforma.

A ausência do Comma Johanneum em manuscritos gregos antigos e em escritos patrísticos sugere que ele não fazia parte do texto original de 1 João. Apesar disso, a cláusula teve impacto na história textual e teológica da Bíblia, especialmente no contexto de debates sobre a doutrina da Trindade e em tradições de tradução bíblica.

Sumário de ocorrências

Nome e Número do ManuscritoData EstimadaTipo de Ocorrência da CJObservações
GA 221margSéculo X (manuscrito). Nota marginal da CJ feita após c. 1850? Nota marginalAdicionado após a composição original. Manuscrito mais antigo com a CJ.
GA 177margSéculo XI (manuscrito). Nota maginal da CJ estimada ser de 1785.Nota marginalAdicionado após 1551 (com base na presença da referência de capítulo e versículo). Escrito por Ignatius Hardt, um padre de Munique.
GA 88marg (Codex Ravianus)Século XII (manuscrito). Data posterior incerta.Nota marginalCJ adicionado posteriormente.
GA 429margSéculo XIV (manuscrito). Após 1522 (CJ)Nota marginalCopiado da terceira edição de Erasmo. Único membro de seu grupo de manuscritos (Harklean) a conter a CJ.
GA 629 (Codex Ottobonianus)1362–1363No textoManuscrito grego mais antigo conhecido com a CJ. A redação difere da forma do Textus Receptus. É uma diglota grego-latim, sugerindo uma tradução do latim para essa passagem.
GA 636margSéculo XV (manuscrito). Data posterior incertaNota marginalCJ adicionado posteriormente.
GA 61 (Codex Montfortianus)Século XV/XVINo textoErasmo usou este manuscrito para adicionar a CJ à sua terceira edição do Novo Testamento grego.
GA 918Século XVI (provavelmente 1573–1578)No textoCJ provavelmente derivado da terceira edição de Erasmo.
GA 2318Século XVIIINo textoManuscrito de comentário, influenciado pela Vulgata Clementina. CJ possivelmente copiado de uma edição posterior do Textus Receptus.
24731634No textoPossivelmente uma cópia de uma edição posterior do Textus Receptus.
634Não aparece nos aparatos críticos
635Nota marginalNão aparece nos aparatos críticos
Omega 110No textoNão aparece nos aparatos críticos

O Codex Wizanburgensis, mencionado por apologistas como contendo a Comma Johanneum, na verdade é um manuscrito latino.

Sumário das conclusões:

  • Aparição Tardia: A maioria dos manuscritos contendo a Comma Johanneum são do século XIV ou posterior, levantando questões sobre sua autenticidade.
  • Notas Marginais: Muitos manuscritos colocam a Comma na margem, sugerindo que foi uma adição posterior ou considerada uma leitura variante.
  • Variações Textuais: A redação da Comma varia entre os manuscritos, especialmente no Codex 629, o que sugere tradução do latim.

BIBLIOGRAFIA

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https://evangelicaltextualcriticism.blogspot.com/2020/01/the-greek-manuscripts-of-comma.html