Pelágio (c. 354-c. 420) foi um teólogo romano-britânico que argumentou que os humanos tinham a capacidade de escolher o bem ou o mal. Seus ensinamentos foram declarados heréticos.
Pelágio chegou a Roma no início dos anos 380 d.C., inicialmente para estudar Direito. Interessou-se pela teologia cristã e as Escrituras; embora fosse um leigo. Vivendo como monge, sua erudição e estilo de vida moralmente rigoroso atraíram muitos seguidores. Chocado com a frouxidão moral de muitos cristãos romanos, começou a desenvolver suas ideias teológicas. Salientava o livre-arbítrio e a capacidade humana de fazer o bem. Defendia que Deus não exigiria o impossível, e, portanto, era possível cumprir os mandamentos divinos.
Em 410, após o saque de Roma pelos visigodos, Pelágio e seu discípulo Celestio fugiram para o Norte da África. Foi lá que ele se deparou com a oposição de Agostinho de Hipona, que se tornou seu principal adversário. Agostinho criticava duramente suas ideias sobre o pecado original e a necessidade da graça divina.
Em 412, Pelágio partiu para a Palestina, enquanto Agostinho continuava a publicar obras que atacavam seus ensinamentos. Apesar da crescente controvérsia, Pelágio foi julgado e absolvido em dois sínodos em 415, o Concílio de Jerusalém e o Sínodo de Dióspolis, conseguindo defender-se com sucesso das acusações de heresia.
Em 416, no entanto, a maré virou. Dois concílios africanos condenaram seus ensinamentos, e o Papa Inocêncio I o excomungou. O recém-eleito Papa Zósimo chegou a pronunciar Pelágio inocente em 417, mas a pressão contínua de Agostinho e de outros bispos levou a uma reviravolta papal.
A condenação final veio em 418. O Concílio de Cartago emitiu nove cânones que condenavam o pelagianismo, uma decisão confirmada pelo Papa Zósimo. O imperador Honório ordenou seu exílio, e os registros históricos de Pelágio desaparecem a partir daí. Acredita-se que ele tenha morrido no exílio, possivelmente na Palestina. A condenação de suas ideias foi reafirmada no Concílio de Éfeso em 431
A peculiaridade de Pelágio reside na sobrevivência de suas obras, permitindo a comparação direta entre suas ideias e as acusações de seus opositores, algo incomum para heresiarcas. Seus escritos também permaneceram amplamente disponíveis durante a Idade Média. Similar ao caso de Prisciliano de Ávila, construiu-se um espantalho acerca de sua pessoa e ideias.
O caricato “pelagianismo” formulado por Agostinho e os concílios de Cartago nunca existiu como um movimento coeso e doutrinariamente distinto. Pelágio não propôs novas doutrinas. Suas ideias eram correntes mesmo entre seus opositores ou autores tidos como ortodoxos como Atanásio, Jerônimo e Teodoreto de Ciro. Contudo, Pelágio viu-se envolvido em debates sobre a interpretação das palavras “graça” e “predestinação” nas epístolas paulinas, que geraram questionamentos sobre a natureza humana e a salvação.
O corpus pelagiano
Apesar de ter sido declarado herege e de suas obras terem sido suprimidas, um número significativo dos escritos de Pelágio sobreviveu, muitas vezes sob os nomes de figuras mais aceitas, como Jerônimo. vAlgumas das principais obras existentes atribuídas a Pelágio:
- Comentário sobre as Treze Epístolas de São Paulo: Esta é sua obra mais longa Concluída antes de suas maiores controvérsias teológicas, é uma fonte primária para entender seu pensamento sobre o livre-arbítrio, a graça e a natureza humana. Na Idade Média, foi frequentemente atribuída a São Jerônimo.
- Carta a Demetrias: Esta carta foi escrita para uma nobre chamada Demetrias que havia decidido seguir uma vida de ascetismo cristão. É uma exortação a uma vida de virtude e uma fonte crucial para entender as visões de Pelágio sobre a capacidade humana para a bondade e sua ênfase no esforço moral.
- Epístola a Celantia: Outra carta de direção espiritual, este trabalho encoraja a destinatária a buscar uma vida de santidade.
- Libellus fidei (Breve Declaração de Fé): Este documento foi apresentado ao papa Zósimo em 417 como uma defesa de sua ortodoxia. O monge descreve suas crenças centrais sobre a Trindade e a natureza de Cristo, bem como suas visões sobre a graça e o livre-arbítrio.
- Sobre a Lei Divina (De divina lege): Um tratado sobre o cumprimento dos mandamentos de Deus.
- Sobre a Natureza (De natura): Esta obra, que só sobrevive em fragmentos citados por Agostinho em suas refutações, é uma fonte-chave para as visões de Pelágio sobre a natureza humana, que ele acreditava ter sido criada como boa por Deus.
- De libero arbitrio (Sobre o Livre-Arbítrio): Este tratado, escrito em resposta a críticas, também sobrevive principalmente em fragmentos citados nas obras de Agostinho, como Sobre a Graça de Cristo e Sobre os Atos de Pelágio.
- Outras cartas e fragmentos: Vários fragmentos de outras cartas e tratados curtos também foram preservados através das obras de seus oponentes ou em coleções posteriores.
BIBLIOGRAFIA
Bonner, Ali. The Myth of Pelagianism. Oxford, UK: Oxford University Press, 2018.
Bonner, Gerald. “Pelagius (fl. c.390–418), theologian.” In Oxford Dictionary of National Biography. Oxford: Oxford University Press, 2004. doi:10.1093/ref:odnb/21784.
Scheck, Thomas P. “Pelagius’s Interpretation of Romans.” In A Companion to St. Paul in the Middle Ages, edited by Steven Cartwright, 79–114. Leiden: Brill, 2012.
Teselle, Eugene. “The Background: Augustine and the Pelagian Controversy.” In Grace for Grace: The Debates after Augustine and Pelagius, edited by Alexander Y. Hwang, Brian J. Matz, and Augustine Casiday, 1–13. Washington, D.C.: Catholic University of America Press, 2014.

Uma consideração sobre “Pelágio”