O aborto, entendido como a interrupção intencional de uma gravidez, não é tratado explicitamente na Bíblia como prática comum ou com legislações diretas. No entanto, princípios e passagens bíblicas frequentemente informam o debate teológico e ético sobre o tema.
Em Êxodo 21:22-25, uma lei aborda o caso de uma mulher grávida ferida durante uma briga. Se houver apenas um aborto espontâneo sem dano adicional, o culpado paga uma multa; se a mulher sofrer lesão grave ou morte, aplica-se a penalidade de “vida por vida”. A interpretação dessa passagem é amplamente debatida. Alguns argumentam que ela sugere uma distinção entre o valor da vida da mulher e do feto, enquanto outros enfatizam o impacto sobre a mulher e sua família.
O uso de ervas abortivas é possivelmente aludido indiretamente em Números 5:11-31. Esta passagem há um ritual de prova para determinar a fidelidade conjugal de uma mulher. Embora o texto não trate diretamente do aborto, a menção de substâncias que poderiam afetar a gravidez sugere o conhecimento de métodos para interromper gestações.
A questão da infusão da alma, ou o momento em que a alma entra no corpo, é relevante para o entendimento histórico e teológico do aborto. No judaísmo talmúdico, as opiniões variavam. Uma visão proeminente situava a infusão da alma 40 dias após a concepção, enquanto outras associavam o início da alma ao nascimento ou viam o processo como gradual. As discussões frequentemente priorizavam a vida e o bem-estar da mãe, permitindo o aborto em certas circunstâncias.
Na patrística a influência da filosofia grega, como as ideias de Platão e Aristóteles, moldou as opiniões sobre a infusão da alma. Tertuliano defendia que ocorria na concepção, enquanto Agostinho sugeria estágios posteriores, como 40 dias ou mais. Essas diferenças impactaram as posições da Igreja primitiva, variando entre a condenação absoluta do aborto e sua permissão em casos específicos, especialmente no início da gestação.
Na teologia escolástica medieval, Tomás de Aquino combinou filosofia aristotélica e teologia cristã, propondo uma infusão da alma em etapas: alma vegetativa na concepção, alma animal posteriormente, e alma racional após 40 dias para fetos masculinos e 80-90 dias para femininos. Essa visão de infusão da alma tardia influenciou o Direito Canônico da Igreja Católica, que historicamente diferenciava entre abortos precoces e tardios, com menor gravidade moral atribuída ao primeiro.
