Cinco Megillot

Os Cinco Pergaminhos, também conhecidos como Megillot, são uma coleção de cinco livros da Bíblia hebraica que são tradicionalmente lidos durante os festivais judaicos ao longo do ano. Esses pergaminhos, com suas respectivas ocasiões tradicionais de leitura, incluem o Cântico dos Cânticos (Sábado da Páscoa), Rute (Festa das Semanas), Lamentações (Nove de Av), Eclesiastes (Sucote) e Ester (Purim). Embora cada um desses pergaminhos tenha seus próprios temas e mensagens exclusivos, todos eles têm conexões importantes com temas e experiências femininas.

O Cântico dos Cânticos, por exemplo, é um poema de amor que celebra as alegrias e prazeres do amor romântico. É único na Bíblia por suas descrições francas e sensuais de amor e desejo físico, e por retratar uma amante que ativamente busca sua contraparte masculina. O poema desafia os papéis subordinacionistas de gênero e celebra a agência e o desejo das mulheres. Na história da recepção, seu sentido sexual foi diminuído e passou-se a ser lido como uma alegoria das bodas com Israel ou com a Igreja.

O livro de Rute conta a história de uma mulher moabita que migra para Judá e se torna ancestral do rei Davi. A narrativa celebra a lealdade, coragem e desenvoltura das mulheres. Opõe-se a um exclusivismo de etnia e nacionalidade. A fidelidade de Rute para com sua sogra, Noemi, e sua determinação de prover o sustento de ambos por meio de trabalho árduo e perseverança são exemplos de força e resiliência femininas.

O livro de Lamentações fala sobre as experiências dos que sofreram perda e luto. A queda de Jerusalém e do Reino de Judá é referida como filha de Sião (Lm 2:11-15). Os poemas expressam a dor e a angústia de um povo que perdeu suas casas, suas famílias e seu senso de identidade. O conjunto de poemas expressam o luto e a lamentação daqueles que sofreram violência, opressão e injustiça.

O Livro de Eclesiastes discorre sobre o significado e o propósito da vida. Questiona o senso-comum vigente acerca de poder e sucesso na época associada como anseios masculinos. Ao contrário, incentiva a encontrar alegria e contentamento em prazeres e relacionamentos simples, em vez de riqueza material ou status social.

Por fim, o livro de Ester conta a história de uma judia que se torna rainha da Pérsia e usa sua posição para salvar seu povo de uma trama genocida. A bravura, inteligência e desenvoltura de Esther são celebradas como liderança e heroísmo.

Livro de Ester

O Livro de Ester é um romance da diáspora. Com astúcia e coragem, a moça Ester salva o povo judeu de um genocídio.

Canonicidade e Testemunhas Textuais
A canonicidade de Ester gerou debates históricos entre as comunidades religiosas, mas é agora amplamente aceita tanto por judeus como por cristãos.

O Livro de Ester, embora não mencionado no Novo Testamento, em Filo ou em Qumran, possui uma rica história textual. Sua mais antiga menção vem de Flávio Josefo, o qual sumarizou a história de Ester em suas Antiguidades Judaicas (11.184-296), demonstrando seu conhecimento e relevância no período. Já por volta de 135 d.C., Aquila elaborou uma tradução grega da Bíblia Hebraica, da qual um fragmento de sua versão de Ester sobreviveu em Ester Rabá 2:7, evidenciando que considerava Ester como Escritura. Os manuscritos mais antigos que possuímos incluem o Códice de Leningrado 19A, o Códice Vaticano e o manuscrito 319 da Septuaginta. A Vetus Latina, uma antiga tradução latina, também contém uma versão de Ester, datada de 330-350 d.C. As testemunhas textuais posteriores revelam uma abundância de manuscritos hebraicos, visto ser um dos livros mais copiados das Escrituras. As versões gregas, notadamente a LXX e o Texto Alfa (AT), apresentam seções adicionais ausentes no Texto Massorético.

Autoria e Data
A autoria de Ester permanece indefinida, envolta em anonimato. Alguns especulam o envolvimento de figuras como Mardoqueu, Esdras ou Neemias, mas as evidências são escassas. A narrativa do livro provavelmente situa-se entre 464-400 aC, sendo ambientado no período persa alinhado com o reinado de Xerxes (486-465 aC), embora Artaxerxes I ou Artexerxes II também sejam indicados como potenciais identidades para o rei Assuero.

Discrepâncias textuais
Os acréscimos gregos a Ester, especialmente nos capítulos 11-16, introduzem discrepâncias e expansões notáveis ausentes no Texto Massorético hebraico. Estas adições, embora ausentes nas tradições talmúdica, targúmica e siríaca, concentram-se em elementos religiosos, detalhes históricos e enfatizam a intervenção divina. Não foram encontrados versões de Ester entre os manuscritos do Mar Morto, mas há um putativo Apócrifo de Ester de Massada.

Debates sobre canonicidade
A canonicidade de Ester enfrentou escrutínio nos círculos judaicos, com a sua ausência nos Manuscritos do Mar Morto levantando questões. Embora a versão do Old Greek (a Septuaginta) conste esse livro, as opiniões variaram entre os rabinos. Os primeiros debates cristãos incluíram a observação de Jerônimo de que os acréscimos estavam ausentes nos textos hebraicos de sua época.

O livro de Ester aparece entre os Cinco Megillot dos Escritos na versão hebraica. Já nas versões gregas aparece no final dos livros históricos.

Historicidade

A historicidade de Ester, antes amplamente aceita, agora encontra questionamentos. Improbabilidades e contradições com fontes externas, como Heródoto, levantam dúvidas. No entanto, o livro se alinha com os costumes, a arquitetura e os nomes persas/iranianos, sugerindo um cenário histórico. A continuidade da tradição do purim é um elemento para reivindicar sua historicidade.

Gênero e Objetivo
O gênero de Ester abrange elementos de conto de sabedoria, conto de corte, história da diáspora, comédia e etiologia de festival. Seu propósito vai além da documentação histórica, visando dar legitimidade à festa de Purim, não instituída na Lei Mosaica, e incentivar a resistência à assimilação.

Teologia
Embora a presença de Deus permaneça oculta (é o único livro bíblico sem referência explícita sobre Deus), temas religiosos permeiam Ester. O jejum, as coincidências providenciais e a declaração de Mardoqueu sobre o papel de Ester sublinham a intervenção divina, mesmo no oculto. Os motivos teológicos destacam a interação entre a ação divina e a iniciativa humana.

Esboço estrutural

  1. Contexto Histórico e Apresentação dos Personagens (1:1-22)
    Apresentação do rei Assuero, seu vasto império e a rainha Vasti.
    Banquete real e a deposição da rainha Vasti por desobediência.
    Busca por uma nova rainha e a seleção de Ester.
    Mordecai, primo e tutor de Ester, e sua importância na trama.
  2. A Ascensão de Ester e a Conspiração de Hamã (2:1-18)
    Ester é levada para o harém real e se destaca entre as candidatas.
    Ester é coroada rainha, mas mantém sua identidade judia em segredo.
    Mordecai descobre uma conspiração contra o rei e a revela através de Ester.
    Hamã, um oficial de alta patente, é promovido e exige honra de todos.
  3. O Decreto de Extermínio e o Desespero dos Judeus (3:1-15)
    Hamã, enfurecido por Mordecai não se curvar diante dele, planeja destruir todos os judeus do império.
    Hamã lança sortes (Purim) para determinar a data do extermínio.
    O rei Assuero, sem saber do ódio de Hamã contra os judeus, assina o decreto.
    A notícia do decreto se espalha e causa grande desespero entre os judeus.
  4. A Coragem de Ester e a Reviravolta da História (4:1-17)
    Mordecai informa Ester sobre o decreto e a persuade a interceder pelo povo judeu.
    Ester, apesar do risco, decide revelar sua identidade judia ao rei.
    Ester organiza um banquete para o rei e Hamã, onde revela o plano de Hamã.
    O rei, furioso, ordena a execução de Hamã e eleva Mordecai a uma posição de destaque.
  5. A Salvação dos Judeus e a Festa de Purim (5:1-10:3)
    Ester intercede novamente pelo povo judeu, e o rei permite que eles se defendam.
    Os judeus se reúnem e derrotam seus inimigos, liderados por Mordecai.
    É instituída a festa de Purim para comemorar a salvação dos judeus.
    Mordecai se torna o segundo homem mais poderoso do reino, e Ester é honrada por sua coragem.