Transubstanciação

Transubstanciação, do latim transubstantiatio e equivalente ao grego μετουσίωσις metousiosis, é a perspectiva da Igreja Católica Romana que na eucaristia (Santa Ceia do Senhor) há a mudança de toda a substância do pão na substância do Corpo de Cristo e de toda a substância do vinho na substância do Sangue de Cristo. Contudo, as características exteriores do pão e do vinho permanecem inalteradas.

Como bases bíblicas para tal perspectiva são citados João 6:32-58; Mateus 26:26; Lucas 22:17-23; e 1 Coríntios 11:24-25.

Essa doutrina foi afirmada no Quarto Concílio de Latrão em 1215. Entretanto, durante a Reforma foi criticada. As alternativas protestantes. A crítica se deu principalmente porque fomentava a adoração eucarística como idolatria e um “ressacrifício” contínuo de Jesus Cristo. Os reformadores apontaram que Jesus morreu “uma vez por todas” e não precisa ser sacrificado novamente (Hebreus 10:10; 1 Pedro 3:18). Em razão disso, em 1551, o Concílio de Trento declarou que a doutrina da transubstanciação é um dogma de fé católico romano.

BIBLIOGRAFIA

Igreja Católica Apostólica Romana. Catecismo. Secção 1376.

Real presença

A real presença de Cristo na Eucaristia é conjunto de doutrinas de que Jesus Cristo está presente na Santa Ceia (eucaristia), não apenas simbolicamente ou metaforicamente, mas de uma forma verdadeira, real e substancial.

Sob o gênero de real presença, há as seguintes perspectivas doutrinárias:

  • Mistério: é a posição dos ortodoxos gregos e orientais, pela qual a relação entre os elementos do pão e do vinho e a presença de Cristo é real, porém não definida racionalmente. É uma posição objetiva.
  • Transubstanciação: a posição do catolicismo romano, no qual o pão e o vinho são literalmente transformados no corpo e sangue de Cristo. É uma posição objetiva.
  • Consubstanciação: doutrina proposta pelos lolardos na qual o corpo e sangue de Cristo estariam paralelamente presentes nos elementos da Ceia. É uma posição objetiva.
  • União Sacramental: doutrina adotada pelos luteranos no qual Cristo está presente em, sob e com a forma dos elementos eucarísticos. É uma posição objetiva.
  • Presença sacramental: Cristo está presente no pão e no vinho como uma comunhão de seu corpo e sangue daqueles participam da vida e morte de Cristo. É uma posição subjetiva.
  • Presença espiritual: é a postura dos reformados conforme articulada por Calvino, no qual a realidade do corpo e do sangue de Cristo não ocorre corporalmente (fisicamente) nos elementos, mas o Espírito une-os verdadeiramente com Cristo. É uma posição objetiva.
  • Recepcionismo: posição anglicana e de alguns reformados de que a realidade da presença de Cristo é contingente à fé do comungante. É uma posição subjetiva.
  • Transignificação: posição compatibilista com o simbolismo. Nos elementos estão realmente presente Cristo em forma simbólica. Na memória dos fiéis Cristo está presente de maneira real. Esta posição é subjetiva e objetiva.

Esses posicionamentos de presença real constrastam com os entendimentos zwinglianos de simbolismo e memorialismo.

Recepcionismo e presença mística

Recepcionismo é uma perspectiva doutrinária sobre a natureza do pão e do vinho na Santa Ceia na tradição anglicana e metodista.

O recepcionismo postula que o pão e o vinho permanecem inalterados durante a oração de consagração, mas que o crente por fé recebe o corpo e o sangue de Cristo na comunhão.

A presença mística é um entendimento derivado, encontrado entre metodistas, movimento de santidade (Holiness) e alguns reformados. Semelhante à postura luterana de que Cristo está presente “em, com e sob” o pão e no vinho, há uma visão integradora subjetiva (a lembrança da obra de Cristo por parte do comungante) e objetiva (comunicação eficaz por graça do Deus triuno).

RECEPCIONISMO NA TRADIÇÃO ANGLICANA

O recepcionismo era a teologia eucarística predominante nos dois primeiros séculos do Anglicanismo, visível nos 39 Artigos de Religião:

ARTIGO XXVIII – DA CEIA DO SENHOR

A Ceia do Senhor não só é um sinal de mútuo amor que os cristãos devem ter uns para com os outros; mas antes é um Sacramento da nossa Redenção pela morte de Cristo, de sorte que para os que devida e dignamente, e com fé o recebem, o Pão que partimos é uma participação do Corpo de Cristo; e de igual modo o Cálice de Bênção é uma participação do Sangue de Cristo.

A Transubstanciação (ou mudança da substância do Pão e Vinho) na Ceia do Senhor, não se pode provar pela Escritura Sagrada; mas antes repugna às palavras terminantes da Escritura, subverte a natureza do Sacramento, e tem dado ocasião a muitas superstições. O Corpo de Cristo é dado, tomado, e comido na Ceia, somente dum modo celeste e espiritual. E o meio pelo qual o Corpo de Cristo é recebido e comido na Ceia é a Fé.

O Sacramento da Ceia do Senhor não foi pela ordenança de Cristo reservado, nem levado em procissão, nem elevado, nem adorado.

A postura anglicana combinou matrizes filósoficas do nominalismo e do realismo. Rejeitou os polos extremos de realismo (transubstanciação) e o nominalismo (memorialismo). Tido por vezes como uma hesitação em precisar seus termos teológicos, essa corrente doutrinária recebeu tal designação em 1867.

RECEPCIONISMO E PRESENÇA MÍSTICA NA TRADIÇÃO METODISTA

Na formulação dos 25 Artigos de Religião do Metodismo, John Wesley revisou os artigos de fé anglicanos, mas manteve esse entendimento, dentro da Ceia do Senhor como graça e meio de graça:

Artigo 18 — Da Ceia do Senhor
A ceia do Senhor não é apenas um sinal do amor que os cristãos devem ter uns pelos outros, mas é um sacramento da nossa redenção pela morte de Cristo; de modo que, para aqueles que corretamente, dignamente e com fé recebem o mesmo, o pão que partimos é uma participação do corpo de Cristo; e da mesma forma o cálice de bênção é uma participação do sangue de Cristo.

A transubstanciação, ou a mudança da substância do pão e do vinho na ceia de nosso Senhor, não pode ser provada pela Sagrada Escritura, mas é repugnante às palavras claras da Escritura, derruba a natureza de um sacramento e deu ocasião a muitas superstições .

O corpo de Cristo é dado, tomado e comido na ceia, somente de uma maneira celestial e espiritual. E o meio pelo qual o corpo de Cristo é recebido e comido na ceia é a fé. O Sacramento da Ceia do Senhor não foi reservado pela ordenança de Cristo, levado, exaltado ou adorado.

Gradativamente o metodismo americano e o movimento de santidade adotaram uma posição memorialista, ainda que entendimentos da ceia como mistério e recepcionismo persistam.

Diferente dos reformadores magistrais, o recepcionismo considera o lado do comungante tanto quanto dos elementos na Santa Ceia. Assim, o entendimento metodista evoluiu para uma união mística com Cristo na Ceia. Essa celebração remete à vida Cristo, mas não é primariamente uma lembrança ou memorial. Tampouco é transubstanciação, embora valorizem o pão e o vinho como meios tangíveis essenciais pelos quais Deus opera. A presença divina ocorre de forma temporal e relacional. Na Santa Ceia da igreja, o passado, presente e futuro do Cristo vivo se reúnem pelo poder do Espírito Santo para que possam receber e incorporar Jesus Cristo como a graça do salvador para o mundo inteiro.

PRESENÇA MÍSTICA NA TRADIÇÃO REFORMADA

Apesar da teoria da presença real de Calvino e o memorialismo de Zwínglio sejam predominantes, entre reformados alemães nos Estados Unidos há uma vertente que adere à presença mística. A chamada Teologia de Mercersburg chegou a esse entedimento reavaliando as posturas históricas da Igreja e aproximando-se da posição luterana.

RECEPCIONISMO NO MOVIMENTO PENTECOSTAL ITALIANO

A linguagem recepcionista aparece na formulação original dos pontos de doutrina aprovados em Niagara Falls, mas alterados em 1933. No entanto, faltam subsídios para afirmar quais as posturas teológicas de seus formuladores à epoca de sua redação.

VIII. Cremos que na santa ceia o corpo de Cristo é dado, recebido, comido em um modo celeste e espiritual. É que esse meio pelo qual é recebido e comido é a fé. Luc. 22:19; 1 Cor. 11:24.

VEJA TAMBÉM

Santa Ceia

Transubstanciação

Consubstanciação

Presença real

Memorialismo

BIBLIOGRAFIA

Douglas, Brian. A Companion to Anglican Eucharistic Theology. 2 V. Boston: Brill, 2012.

Nevin, John Williamson. The Mystical Presence: A Vindication of the Reformed or Calvinistic Doctrine of the Holy Eucharist. JB Lippincott, 1867.

United Methodist Church. This Holy Mystery: A United Methodist Understanding of Holy Communion. General Conference of The United Methodist Church, 2004.

União sacramental

A doutrina da união sacramental é a visão teológica luterana da presença real do corpo e sangue de Cristo na eucaristia. De acordo com essa perspectiva, na utilização do sacramento, o pão consagrado se une ao corpo de Cristo e o vinho consagrado se une ao seu sangue, por meio do poder de suas palavras. Essa união ocorre para todos os comungantes, crentes e não crentes, permitindo que todos comam e bebam do corpo e sangue de Cristo. Os luteranos mantém uma posição de “realidade objetiva, mas silêncio piedoso sobre detalhes técnicos”. Cristo está realmente presente em, com e sob os elementos do pão e do vinho.

É também chamada de ubiquitarianismo por enfatizar a onipresença da natureza de Jesus Cristo.

A união sacramental é comparada à união pessoal das duas naturezas em Jesus Cristo, mantendo a distinção entre o pão e vinho consagrados e o corpo e sangue de Cristo. Lutero fazia analogia do ferro quente. O calor e o metal juntavam-se em uma só realidade, mas cada um era algo distinto. A doutrina luterana afirma que, na Ceia do Senhor, o pão e o vinho consagrados são verdadeiramente o corpo e o sangue de Cristo, e mesmo aqueles que não creem participam da manducatio indignorum (comer dos indignos). A doutrina é baseada nas palavras de instituição de Jesus na Última Ceia, acreditando que, por meio de seu mandato, o pão se torna seu corpo e o vinho seu sangue em todas as celebrações da rucaristia.

Essa visão é distinta dos conceitos de transubstanciação, consubstanciação, impanação e real presença reformada.

Essa doutrina também se diferencia da visão reformada de presença real, que destaca a presença espiritual de Cristo na Ceia, sem uma união substancial com os elementos.

A visão luterana da eucaristia é distinta da transubstanciação, ensino católico romano de que pão e vinho se transformam no corpo e sangue de Cristo.

Embora alguns erroneamente a rotulem como consubstanciação, os luteranos, incluindo Lutero, discordam disso. Os luteranos rejeitam uma presença lado a lado e enfatizando a verdadeira presença de Cristo em, com e sob os elementos.

Fórmula de Concórdia, Epítome, VII, “A Santa Ceia de Cristo”: 15 6. Cremos, ensinamos e confessamos que com o pão e o vinho o corpo e o sangue de Cristo são recebidos não apenas espiritualmente, pela fé, mas também oralmente – porém, não de maneira cafarnaítica, mas por causa da união sacramental de maneira sobrenatural e celestial. As palavras de Cristo ensinam isso claramente quando nos orientam a tomar, comer e beber, tudo isso aconteceu no caso dos apóstolos, já que está escrito: “E todos beberam dele” (Marcos 14:23). Da mesma forma, São Paulo diz: “O pão que partimos não é uma participação no corpo de Cristo?” (1 Coríntios 10:16) — isto é, quem come deste pão come o corpo de Cristo. Este também tem sido o ensinamento unânime dos principais Padres da Igreja, como Crisóstomo, Cipriano, Leão I, Gregório, Ambrósio, Agostinho.

Santa Ceia

Santa Ceia é uma refeição comunal quando a Igreja compartilha o pão e o fruto da vide em recordação da obra expiatória de Cristo. Propriamente dito, é a única celebração regular da Igreja com ordenança bíblica. Os primeiros cristãos partiam o pão com frequência (At 2:46; 20:7) e todo o crente deve estar em comunhão com Deus e o próximo para vir tomar do cálice e do pão. Não participar dela, incorre na não comunhão com Cristo (Jo 6:53).