Melito de Sardes

Melito de Sardes ou Militão de Sardes (?-180 d.C.) foi o bispo de Sardes na Anatólia e escritor patrístico da era dos apologistas.

Sua obra foi quase toda perdida, mas é citado por Jerônimo (via Tertuliano), Polícrates de Éfeso (citado por Eusébio) Clememente de Alexandria, Orígenes e Eusbébio.

Fora os fragmentos, duas obras duas foram redescobertas. Educado na retórica, é possível que teve educação estoica, escreveu uma Apologia do Cristianismo para Marco Aurélio. Judeu de nascimento e parte da comunidade judaico-cristã, envolveu-se na discussão da data da Páscoa em seu Peri Pascha, na qual defendia que deveria ser celebrada a 14 de Nisan (Quartodecimanismo), com base qeu a Antiga Aliança teria sido cumprida em Cristo. Aparentemente seguia uma cronologia joanina e associa Cristo com a tipologia de cordeiro pascal.

Na Apologia a Marco Aurélio, Melito descreve o Cristianismo como uma filosofia que se originou entre os bárbaros, mas floriu sob o Império Romano. Pede ao imperador que repense as acusações contra os cristãos. Reclama da perseguição, com os cristãos abertamente roubados e saqueados por aqueles que se aproveitam das ordenanças imperiais.

A cristologia de Melito enfatiza que Cristo é ao mesmo tempo Deus e um homem perfeito.

Fez a primeira investigação registrada acerca do cânon, sua composição e ordem dos livros, viajando às igrejas antigas. Esteve na biblioteca cristã de Cesaria Marítima. Seu cânon do Antigo Testamento é similar ao cânon hebraico, mas sem Ester e talvez inclua o Livro da Sabedoria. O termo cânon ou cânone para referir-se aos livros aceitos pela Igreja é de sua lavra.

BIBLIOGRAFIA

Cohick, Lynn H. The Peri Pascha Attributed to Melito of Sardis. Providence: Brown Judaic Studies, 2000.

Ágape

Ágape, também conhecida como “festa do amor” era uma refeição em comum nas primeiras igrejas cristãs. A ágape aparece 1 Coríntios 11:17-22 e Judas 12, possivelmente é aludida em Atos 2:46–47.

Paulo corrige a igreja em Corinto contra as discriminações socioeconômicas na refeição da ágape. Condena que alguns festejassem enquanto outros passavam fome (1 Coríntios 11:17-22). O apóstolo instrui que tais distinções anulam o propósito da refeição, o qual seria trazer unidade. Após essa correção, Paulo passa a falar da Santa Ceia (1 Coríntios 11:23-26). Esse trecho e testemunhos posteriores indicam que as igrejas primitivas seguiam o modelo da da última ceia, incluindo tanto uma refeição de comunhão e a celebração da Santa Ceia.

Também servia para a atender as necessidades alimentares dos mais pobres (Tertuliano, Apologia 39).

Afresco de uma ágape. Tumba de Víbia. Catacumbas de Domitília, Roma.

BIBLIOGRAFIA

Alikin, Valeriy A. The Earliest History of the Christian Gathering: Origin, Development and Content of the Christian Gathering in the First to Third Centuries. Leiden: Brill, 2010.

Finger, Reta Halteman. Of Widows and Meals: Communal Meals in the Book of Acts. Grand Rapids: Eerdmans, 2007.

Stutzman, Paul Fike. Recovering the Love Feast: Broadening Our Eucharistic Celebrations. Eugene, Oreg.: Wipf and Stock, 2011.

Recepcionismo e presença mística

Recepcionismo é uma perspectiva doutrinária sobre a natureza do pão e do vinho na Santa Ceia na tradição anglicana e metodista.

O recepcionismo postula que o pão e o vinho permanecem inalterados durante a oração de consagração, mas que o crente por fé recebe o corpo e o sangue de Cristo na comunhão.

A presença mística é um entendimento derivado, encontrado entre metodistas, movimento de santidade (Holiness) e alguns reformados. Semelhante à postura luterana de que Cristo está presente “em, com e sob” o pão e no vinho, há uma visão integradora subjetiva (a lembrança da obra de Cristo por parte do comungante) e objetiva (comunicação eficaz por graça do Deus triuno).

RECEPCIONISMO NA TRADIÇÃO ANGLICANA

O recepcionismo era a teologia eucarística predominante nos dois primeiros séculos do Anglicanismo, visível nos 39 Artigos de Religião:

ARTIGO XXVIII – DA CEIA DO SENHOR

A Ceia do Senhor não só é um sinal de mútuo amor que os cristãos devem ter uns para com os outros; mas antes é um Sacramento da nossa Redenção pela morte de Cristo, de sorte que para os que devida e dignamente, e com fé o recebem, o Pão que partimos é uma participação do Corpo de Cristo; e de igual modo o Cálice de Bênção é uma participação do Sangue de Cristo.

A Transubstanciação (ou mudança da substância do Pão e Vinho) na Ceia do Senhor, não se pode provar pela Escritura Sagrada; mas antes repugna às palavras terminantes da Escritura, subverte a natureza do Sacramento, e tem dado ocasião a muitas superstições. O Corpo de Cristo é dado, tomado, e comido na Ceia, somente dum modo celeste e espiritual. E o meio pelo qual o Corpo de Cristo é recebido e comido na Ceia é a Fé.

O Sacramento da Ceia do Senhor não foi pela ordenança de Cristo reservado, nem levado em procissão, nem elevado, nem adorado.

A postura anglicana combinou matrizes filósoficas do nominalismo e do realismo. Rejeitou os polos extremos de realismo (transubstanciação) e o nominalismo (memorialismo). Tido por vezes como uma hesitação em precisar seus termos teológicos, essa corrente doutrinária recebeu tal designação em 1867.

RECEPCIONISMO E PRESENÇA MÍSTICA NA TRADIÇÃO METODISTA

Na formulação dos 25 Artigos de Religião do Metodismo, John Wesley revisou os artigos de fé anglicanos, mas manteve esse entendimento, dentro da Ceia do Senhor como graça e meio de graça:

Artigo 18 — Da Ceia do Senhor
A ceia do Senhor não é apenas um sinal do amor que os cristãos devem ter uns pelos outros, mas é um sacramento da nossa redenção pela morte de Cristo; de modo que, para aqueles que corretamente, dignamente e com fé recebem o mesmo, o pão que partimos é uma participação do corpo de Cristo; e da mesma forma o cálice de bênção é uma participação do sangue de Cristo.

A transubstanciação, ou a mudança da substância do pão e do vinho na ceia de nosso Senhor, não pode ser provada pela Sagrada Escritura, mas é repugnante às palavras claras da Escritura, derruba a natureza de um sacramento e deu ocasião a muitas superstições .

O corpo de Cristo é dado, tomado e comido na ceia, somente de uma maneira celestial e espiritual. E o meio pelo qual o corpo de Cristo é recebido e comido na ceia é a fé. O Sacramento da Ceia do Senhor não foi reservado pela ordenança de Cristo, levado, exaltado ou adorado.

Gradativamente o metodismo americano e o movimento de santidade adotaram uma posição memorialista, ainda que entendimentos da ceia como mistério e recepcionismo persistam.

Diferente dos reformadores magistrais, o recepcionismo considera o lado do comungante tanto quanto dos elementos na Santa Ceia. Assim, o entendimento metodista evoluiu para uma união mística com Cristo na Ceia. Essa celebração remete à vida Cristo, mas não é primariamente uma lembrança ou memorial. Tampouco é transubstanciação, embora valorizem o pão e o vinho como meios tangíveis essenciais pelos quais Deus opera. A presença divina ocorre de forma temporal e relacional. Na Santa Ceia da igreja, o passado, presente e futuro do Cristo vivo se reúnem pelo poder do Espírito Santo para que possam receber e incorporar Jesus Cristo como a graça do salvador para o mundo inteiro.

PRESENÇA MÍSTICA NA TRADIÇÃO REFORMADA

Apesar da teoria da presença real de Calvino e o memorialismo de Zwínglio sejam predominantes, entre reformados alemães nos Estados Unidos há uma vertente que adere à presença mística. A chamada Teologia de Mercersburg chegou a esse entedimento reavaliando as posturas históricas da Igreja e aproximando-se da posição luterana.

RECEPCIONISMO NO MOVIMENTO PENTECOSTAL ITALIANO

A linguagem recepcionista aparece na formulação original dos pontos de doutrina aprovados em Niagara Falls, mas alterados em 1933. No entanto, faltam subsídios para afirmar quais as posturas teológicas de seus formuladores à epoca de sua redação.

VIII. Cremos que na santa ceia o corpo de Cristo é dado, recebido, comido em um modo celeste e espiritual. É que esse meio pelo qual é recebido e comido é a fé. Luc. 22:19; 1 Cor. 11:24.

VEJA TAMBÉM

Santa Ceia

Transubstanciação

Consubstanciação

Presença real

Memorialismo

BIBLIOGRAFIA

Douglas, Brian. A Companion to Anglican Eucharistic Theology. 2 V. Boston: Brill, 2012.

Nevin, John Williamson. The Mystical Presence: A Vindication of the Reformed or Calvinistic Doctrine of the Holy Eucharist. JB Lippincott, 1867.

United Methodist Church. This Holy Mystery: A United Methodist Understanding of Holy Communion. General Conference of The United Methodist Church, 2004.

Finitum est capax infiniti

A expressão latina “o finito portando a capacidade de conter o infinito” na teologia luterana resume a divindade e humanidade de Cristo na encarnação do Logos. Na união hipostática não significa que o finito tenha algum tipo de capacidade inerente de conter o infinito, mas sim que o Deus infinito foi capaz de se comunicar com o finito. Na encarnação houve a plenitude divina comunicando os atributos divinos (communicatio idiomatum) (Cl 2:9).

De modo contrário, o sistema teológico reformado declarou que “o finito não é capaz do infinito” (Finitum non est capax infiniti) negando a comunhão das naturezas divina e humana em Cristo. Com base na ontologia aristotélica, o sistema reformado sustenta que o corpo de Jesus deve ser “finito” para ser um verdadeiro corpo humano. Seria, portanto, incapaz de realmente possuir qualquer um dos infinitos atributos de Deus.

A fórmula latina originou-se nos debates luteranos-reformados sobre a Ceia do Senhor e depois sobre a cristologia. Em vários escritos Huldreich Zwingli (1484-1531) e Johannes Oecolampadius (1482-1531) acusavam Lutero de transferir qualidades divinas para a humanidade de Jesus para que Cristo pudesse ser em todos os lugares, incluindo a Ceia do Senhor. Para os reformados, a natureza humana de Cristo permanecia nos céus enquanto sua natureza divina seria onipresente. Em contrapartida, os luteranos insistiam que essa separação não ocorria, sendo a completa pessoa de Jesus Cristo ubíqua, inclusive nos sacramentos “na, dentro e sob” aspectos do pão e do cálice.

Para Lutero o Espírito Santo, a Palavra e a fé determinam se um objeto ou ação é espiritual ou não, não o objeto ou ação em si. Assim, na Ceia do Senhor pelo Espírito, pela Palavra e pela fé o corpo de Cristo seria espiritualmente recebido. Não ocorre a transubstanciação –a mudança em substância do pão e do vinho na substância do corpo e sangue de Jesus Cristo — mas o exercício da fé. Assim, o pão e o vinha não devem ser adorados.

As implicações da visão luterana de que o finito é um veículo do divino claramente moldaram a atitude em relação às artes e à liturgia. O medo de incorrer em idolatria foi superado pela convicção de que o mundo material poderia ser usado para expressar uma mensagem espiritual dos atos salvíticos. A estética, a arquitetura, a música luteranas refletem isso, especialmente em J. S. Bach e no barroco enquanto em nações reformadas na mesma época adotou-se uma austeridade estética e a vedação de se cantar hinos.

Outra consequência, a união mística com Jesus Cristo mediante a fé foi salientada por Johann Ardt, os pietistas e os morávios. Um efeito disso na comunhão dos cristãos é que ao exigir a fé como elemento para participação da Santa Ceia, abriu-se a mesa a todos que confessavam a Jesus Cristo, sem adicional adesão a proposições teológicas. Os metodistas também foram influenciados por essa concepção. Wesley escreveu no 18o Artigo de Religião “O corpo de Cristo é dado, recebido e comido na ceia, somente de modo espiritual. O meio pelo qual é recebido e comido o corpo de Cristo, na ceia, é a fé.”

Dimensões éticas, existenciais e mesmo ecólogias ramificam desse conceito. Por exemplo, Kierkegaard ponderava:

A Verdade Eterna passou a existir no Tempo; que Deus veio à existência, nasceu, cresceu, veio à existência exatamente como um ser humano individual, indistinguível de qualquer outro ser humano. Concluindo o pós-escrito não científico.

Kierkegaard

No pentecostalismo a capacidade de os corpos humanos tornarem-se templos para a morada do Espírito Santo, recebendo uma efusão do Espírito, é arguida nos termos de que o “finito é capaz do infinito”. Revestidos de poder, o crentes tornam-se recipientes da graça. Nas Mensagens publicadas por W. H. Durham, há esse tema. “Assim glorificai a Mim em vossos corpos mortais, nos quais, depois que Meu Espírito neles entrou, não são mais vossos, mas Me pertencem”. O batismo no Espírito Santo passa ser a realização (atualidade) da presença de Cristo (potência), como na Santa Ceia.

BIBLIOGRAFIA

Cross, Terry. “Finitum Capax Infiniti,” palestra dada na reunião da Society for Pentecostal Studies, Duke University Divinity School. 15 de março de 2008.

Kierkegaard, Soren. Afsluttende uvidenskabelig Efterskrift til de philosophiske Smuler. — Mimisk-pathetisk-dialektisk Sammenskrift, Existentielt Indlœg, af Johannes Climacus. Udgiven af S. Kierkegaard. Copenhaguen: 1846.

Hendel, Kurt K. “Finitum Capax Infiniti: Luther’s radical incarnational Perspective.” Currents in Theology and Mission 35, n. 6 (2008): 420-33.

Macchia, Frank D. “Finitum Capax Infiniti: A Pentecostal Distinctive?” Pneuma: The Journal of the Society for Pentecostal Studies 29, n. 2 (2007): 185–87.

Santa Ceia

Santa Ceia é uma refeição comunal quando a Igreja compartilha o pão e o fruto da vide em recordação da obra expiatória de Cristo. Propriamente dito, é a única celebração regular da Igreja com ordenança bíblica. Os primeiros cristãos partiam o pão com frequência (At 2:46; 20:7) e todo o crente deve estar em comunhão com Deus e o próximo para vir tomar do cálice e do pão. Não participar dela, incorre na não comunhão com Cristo (Jo 6:53).