Abstinência

Abstinência denota a renúncia voluntária à satisfação de desejos ou necessidades, geralmente com propósitos religiosos ou espirituais. Essa prática, presente em diversas culturas e religiões, manifesta-se nas Escrituras através de diferentes formas, como jejum, restrições alimentares e abstenção de relações sexuais.

O jejum, abstenção total ou parcial de alimentos por um período determinado, figura como prática recorrente no Antigo Testamento. Era observado em momentos de luto, arrependimento, busca por orientação divina ou preparação para encontros com Deus. Moisés, Elias e Jesus, por exemplo, jejuaram por quarenta dias em momentos cruciais de suas vidas. O jejum simbolizava humildade, dependência de Deus e purificação espiritual.

As leis dietéticas do Antigo Testamento, especificadas em Levítico 11 e Deuteronômio 14, estabeleciam restrições alimentares para o povo de Israel. A abstenção de certos alimentos, considerados impuros, visava separar o povo e consagrá-lo a Deus. Essas restrições tinham implicações rituais, higiênicas e simbólicas, representando a santidade e a pureza exigidas por Deus.

A abstinência sexual também encontra referências nas Escrituras, associada a propósitos específicos como consagração a Deus, preparação para batalhas ou períodos de luto. No Novo Testamento, Paulo recomenda a abstinência temporária para dedicação à oração em 1 Coríntios 7:5.

Os nazireus, descritos em Números 6, faziam votos temporários ou permanentes de abstinência de vinho e bebidas fermentadas, corte de cabelo e contato com mortos. Essa consagração os separava para serviço a Deus, concedendo-lhes status especial e santidade. Sansão, Samuel e João Batista são exemplos de nazireus dedicados a Deus desde o nascimento. O voto nazireu simbolizava entrega total e busca por pureza ritual.

Os recabitas, por outro lado, não faziam votos individuais, mas seguiam regras ancestrais de abstinência estabelecidas por Jonadabe, filho de Recabe. Conforme descrito em Jeremias 35, eles se abstinham de vinho, não construíam casas, não plantavam nem possuíam terras, vivendo em tendas como símbolo de nomadismo e dependência de Deus. Sua obediência às tradições e recusa aos prazeres mundanos serviam como testemunho contra a infidelidade e desobediência do povo de Judá.

Em Atos 15 a questão da abstinência se entrelaça entre fé, tradição e liberdade na Igreja primitiva. O capítulo narra a assembleia em Jerusalém, convocada para resolver a controvérsia sobre a necessidade da circuncisão para os gentios convertidos.

O debate centralizava-se na relação entre a lei mosaica e a salvação em Cristo. Alguns cristãos judeus insistiam na observância da lei, incluindo a circuncisão, como requisito para a salvação. Outros, liderados por Paulo e Barnabé, defendiam que a salvação vinha pela graça mediante a fé em Jesus, independentemente da observância da lei.

Após intensa discussão, Pedro tomou a palavra, relatando sua experiência com Cornélio, um gentio que recebeu o Espírito Santo sem ter sido circuncidado. Seu testemunho demonstrou que Deus estava agindo entre os gentios sem exigir a observância da lei mosaica.

Tiago, líder da igreja em Jerusalém, concordou com Pedro, citando profecias do Antigo Testamento que apontavam para a inclusão dos gentios no plano de Deus. Ele propôs que se evitasse impor fardos desnecessários aos gentios convertidos, exigindo apenas que se abstivessem de algumas práticas relacionadas à idolatria e imoralidade sexual, como o consumo de carne sacrificada a ídolos, o sangue e a prostituição.

A abstinência, em suas diversas formas, representava disciplina, autocontrole e busca por aproximação de Deus. Era um meio de expressar arrependimento, dedicação e submissão à vontade divina. E

Ablução

A ablução, ou o ato de lavar-se, possui um significado simbólico e ritual significativo na Bíblia, representando tanto a purificação física quanto a espiritual.

No Antigo Testamento, a ablução está ligada às práticas sacerdotais e rituais de purificação. Os sacerdotes, por exemplo, eram obrigados a lavar as mãos e os pés antes de se aproximarem do altar para oferecer sacrifícios (Êxodo 30:17-21), simbolizando a necessidade de pureza e santidade ao se apresentar diante de Deus. Além disso, havia as abluções levíticas, rituais específicos exigiam lavagens para purificação após o parto, a menstruação, o contato com cadáveres ou determinadas doenças (Levítico 11-15). Essas práticas reforçavam a separação entre o sagrado e o profano na vida do povo de Israel. A ablução também era empregada como metáfora pelos profetas, representando o arrependimento e o afastamento do pecado, como exemplificado em Isaías 1:16 e no Salmo 51:2.

No período do Segundo Templo, a ablução assume um papel central na figura do batismo e em outros eventos simbólicos. João Batista, precursor de Jesus, utilizava o ritual de lavagem como sinal de arrependimento, preparando o caminho para a chegada do Messias (Mateus 3:1-6). O batismo cristão, embora distinto das práticas de ablução ritual, carrega simbolismos de purificação do pecado e renovação espiritual em Cristo. Outro momento significativo é o episódio em que Jesus lava os pés dos discípulos (João 13:1-17), um gesto de humildade e serviço que também transmite a ideia de purificação espiritual e preparação para a comunhão com Ele.

O Novo Testamento também enfatiza a purificação interior como essencial, destacando que a limpeza espiritual ocorre por meio da fé em Jesus Cristo. Textos como Hebreus 10:22 e 1 João 1:7-9 sublinham a importância de ser purificado do pecado pelo sacrifício e pelo sangue de Cristo, em contraste com as práticas externas.

Animais puros e impuros

Os textos bíblicos de Levítico 11 e Deuteronômio 14 apresentam diretrizes detalhadas para classificar animais como “puros” (permitidos para consumo) ou “impuros” (proibidos). Essas classificações faziam parte da Lei Mosaica dada aos israelitas e possuíam significados tanto dietéticos quanto rituais.

No caso dos animais terrestres, eram considerados puros aqueles que possuíam cascos fendidos (completamente divididos) e que ruminavam, como bovinos, ovelhas, cabras, cervos e gazelas. Animais que não possuíam essas características eram classificados como impuros, como porcos, coelhos, camelos, cavalos, cães e gatos. Entre os animais aquáticos, os considerados puros precisavam ter nadadeiras e escamas, como a maioria dos peixes comuns, incluindo salmão, atum e bacalhau. Aqueles que não apresentavam essas características, como mariscos, enguias e bagres, eram considerados impuros.

Quanto às aves, a maioria era classificada como pura, exceto por aquelas descritas como aves de rapina ou carniceiras. Exemplos de aves puras incluíam galinhas, pombas e rolas, enquanto águias, abutres, falcões, corujas e corvos eram mencionados como impuros. Em relação aos insetos, apenas certos tipos de gafanhotos, grilos e esperanças eram considerados puros, com a característica específica de possuírem pernas articuladas acima dos pés que lhes permitiam saltar. A maior parte dos demais insetos era classificada como impura.

As razões para essas classificações não são explicitamente mencionadas nos textos bíblicos, mas várias teorias foram propostas. Uma delas sugere que as leis tinham o objetivo de promover higiene e saúde, proibindo o consumo de animais mais propensos a transmitir doenças ou parasitas. Outra hipótese aponta para um significado simbólico, associando os animais puros à pureza e proximidade com Deus, enquanto os impuros representariam impureza ou elementos a serem evitados. Também se propõe que as leis dietéticas tinham uma função de formação espiritual, ensinando obediência e autodisciplina aos israelitas, além de diferenciá-los como um povo santo.

No Novo Testamento, Jesus declara que todos os alimentos são puros (Marcos 7:19), e o apóstolo Pedro recebe uma visão que indica que as leis dietéticas não são mais obrigatórias (Atos 10:9-16). Apesar disso, alguns cristãos optam por seguir essas diretrizes por razões pessoais ou de saúde, mantendo as práticas associadas às classificações bíblicas originais.