O Benefício de Cristo

O Benefício de Cristo, ou seu título completo no original “Trattato Ultilissimo Del Beneficio Di Geisu Christo Crocifisso”, foi um dos livros de devoção espiritual de grande circulação na Europa do século XVI, além de umas das primeiras obras teológicas da Reforma italiana.

Uma obra anônima que refletia os anseios da Reforma italiana que, entre 1541 e 1548, teve impressas cerca de 40.000 a 80.000 cópias, das quais muito poucas restam, visto que a maioria foi queimada. Depois de alguns anos, o livro foi traduzido para o inglês, francês, croata e castelhano. Foi queimado em Nápoles em 1544, colocado no índice de livros proibidos em 1549 e finalmente proibido pelo nome no Concílio de Trento. Acreditava-se que a obra estivesse completamente perdida até que uma cópia foi redescoberta na Inglaterra no século XIX no St John’s College, Cambridge.

A autoria foi erroneamente atribuída a Aonio Paleario (1503-1570), um mártir da Reforma na Itália. Contudo, registros Inquisição abertos no final do século XIX apotam que um certo Don Benedetto, seja o provável autor.

Em 1567, ao ser torturado, o humanista Pietro Carnesecchi (1508-1567) indicou o possível autor. Carnesecchi disse que o livro foi escrito por um obscuro monge beneditino, Benedetto Fontanini, também conhecido como Benedetto da Mantova (1495-1556). Depois de escrevê-lo, Benedetto passou-o para o poeta Marcantonio Flaminio (1498-1550) para uma revisão literária. Depois de revelar esses nomes, Carnesecchi foi executado.

Benedetto viveu em mosteiros em Mântua e Veneza. Foi o responsável por um mosteiro na Sicília e outro perto de Ferrara. Teria sido influenciado pelo reformador espanhol Juan de Valdes (1498?-1541) e Peter Martyr Vermigli (1499-1562).

Em 1549, foi interrogado sob acusações de heresia, mas foi liberado. Morreu por volta de 1556.

A obra foi fortemente influenciada pelas “Institutas” de João Calvino de 1539e uma teologia agostiniana. Salienta a dependência absoluta do homem em Cristo para a salvação.

SUMÁRIO

CAPÍTULO I. Do pecado original e da miséria do homem.
CAPÍTULO II. Que a lei foi dada por Deus com a intenção de que pudéssemos primeiro conhecer nosso pecado; e então, desconfiando de sermos justificados por nossas próprias obras, podemos correr para a misericórdia de Deus e a justiça da fé.
CAPÍTULO III. Que o perdão dos nossos pecados, nossa justificação e toda a nossa salvação dependem de Cristo.
CAPÍTULO IV. Dos efeitos da fé viva e da unidade ou acordo da alma com Cristo.
CAPÍTULO V. Como o homem cristão se veste ou se veste com Cristo.
CAPÍTULO VI. Certos remédios contra a incredulidade ou descrença.

Matias Flácio

Matias Flácio ou Matthias Flacius Illyricus (1520-1575) foi um teólogo, reformador e biblista nascido em Albona, Croácia.

Flácio estudou na Universidade de Wittenberg, onde se tornou um colaborador próximo de Martin Luther e Philipp Melanchthon. Mais tarde, ele se tornou professor de teologia na Universidade de Jena.

Publicou a Centúrias de Magdeburg, uma obra monumental da história da igreja que cobre os primeiros treze séculos do cristianismo. Nesta obra, Flacius e seus colegas procuraram contrariar a visão católica romana da história e defender a Reforma Protestante.

Flácio desenvolveu a doutrina luterana do pecado original. Para ele, o pecado original não é apenas uma tendência ao pecado, mas uma completa corrupção da natureza humana que torna todas as ações humanas pecaminosas. Essa visão foi controversa até mesmo entre outros teólogos protestantes, mas teve um impacto profundo no desenvolvimento da teologia calvinista da depravação total. Entre os luteranos, seus adeptos ficaram conhecidos como flacianos. Centrados em Magdeburg e Jena, moveram uma controvérsia contra os filipistas, os seguidores de Melanchton. Eventualmente, foi um partido perdedor, visto que a Fórmula de Concórdia rejeitou sua visão de depravação total.

Além de suas contribuições teológicas, Flácio também foi um estudioso das línguas clássicas e publicou vários trabalhos sobre gramática e filologia. Lançou bases para a hermenêutica como disciplina acadêmica com princípios fundamentados.

Oswald Glaidt

Oswald Glaidt (1490-1546) foi um reformador e mártir anabatista suíço.

Glaidt era sabatarista e que acreditava na importância de viver uma vida simples e pacífica. Ele rejeitou o uso da violência e acreditava na separação entre igreja e estado. Foi seguidor de Hubmeer, depois de Hans Hut. Por volta de 1530 publicou um panfleto na Silésia sobre a guarda do sábado.

Foi executado por afogamento em Viena.

Andreas Osiander

Osiander é o sobrenome de uma família de reformadores e teólogos do século XVI.

  1. Andreas Osiander (1498-1552) foi um reformador e teólogo luterano alemão que defendeu uma doutrina justificação pela fé distinta. Segundo Osiander a justificação seria a retidão essencial da divindade de Cristo que passa habitar no pecador. Foi o responsável pela Reforma em Nuremberg e influeciou a adoção da Reforma na Prússia.

Frequentou a universidade de Ingolstadt, mas não se formou e foi ordenado padre em Nuremberg. Na cidade, tornou-se hebraísta. Em 1522, recém-nomeado pároco da igreja de St. Lorenz em Nuremberg e aderiu ao luteranismo. Durante a Primeira Dieta de Nuremberg (1522), conheceu Alberto da Prússia, Grão-Mestre dos Cavaleiros Teutônicos, e ajudou convertê-lo ao luteranismo. Liderou a adoção da Reforma pela cidade de Nuremberg em 1525, quando também se casou. Alberto da Prússia o nomeou professor da recém-fundada Universidade de Königsberg, onde viveria até sua morte.

Como biblista, produziu uma edição revista e anotada da Vulgata (1522). Era defensor de uma harmonização extrema das passagens duplicadas nas Escrituras. Para ele, por exemplo, a filha de Jairo teria sido ressuscitada duas vezes.

A publicação dos debates De Lege et Evangelio e De Justificatione (1550) resultaram na controvérsia osianderiana, a qual uma parte dos protestantes aderiram a sua perspectiva de justificação até pelas próximas duas décadas.

Com base no conhecimento filológico do hebraico e do grego, Osiander acreditava que a justificação não era simplesmente uma questão de justiça imputada, mas que o crente estava realmente unido a Cristo e feito justo nEle. Essa perspectiva foi criticada por muitos de seus contemporâneos, mas influenciaram teólogos posteriores, como John Wesley, Karl Barth e Tuomo Mannermaa.

2. Lukas Osiander (1534–1604), filho de Andreas, pastor luterano em Württemberg, editor de um comentário da Bíblia de Lutero (a “Bíblia Osiander”), publicou um dos mais influentes hinários luteranos.

3. Andreas Osiander, o Jovem (1562–1617)

4. Lukas Osiander, o Jovem (1571–1638)

Martin Bucer

Martin Bucer (1491-1551) foi um reformador alemão, liderou a Reforma em Estrasburgo e intermediou as várias vertentes protestantes nos esforços para promover a unidade entre os protestantes. Ele enfatizou a importância da igreja local e a autoridade da Bíblia.

A teologia de Bucer centrou-se na ideia de dupla justificação ou duplex iustitia. Bucer acreditava que a posição correta de uma pessoa diante de Deus tinha dois aspectos: formal e material. O aspecto formal era baseado nos méritos de Cristo e declarado pela justiça de Deus, enquanto o aspecto material era a renovação interior de uma pessoa através da regeneração e santificação.

A doutrina da dupla justificação de Bucer enfatizou a importância tanto do perdão dos pecados quanto da renovação interior, e enfatizou a exibição da retidão na vida dos crentes. Ele interpretou Romanos 8:4a como “pode ser realizado por nós”, o que estava de acordo com as visões de justificação de Agostinho e Aquino. Bucer acreditava que a justificação somente pela fé declarava os cristãos como justos e os capacitava a se tornarem justos. Sua doutrina da justificação era o guarda-chuva sob o qual sua soteriologia funcionava, enfatizando a importância tanto da fé quanto das obras na vida cristã.

Ulrich Zwingli

Ulrich Zwingli (1484-1531) foi um teólogo e reformador suíço, líder da Reforma de Zurique. Ele enfatizou a importância da Bíblia e rejeitou muitas das tradições da Igreja Católica.

Zwingli era um pároco de uma aldeia no cantão de Zurique quando passou a ler o Novo Testamento e chegou, de forma independente, às conclusões similares de Lutero.

Para Zwingli, o sacrifício e a morte de Cristo foram um evento, realizado totalmente no tempo, e são válidos e eficazes para sempre. Em consequência, o momento ou ato decisivo para restaurar a relação rompida entre Deus e os homens não reside na fé individual; ao contrário, a fé é uma espécie de reconhecimento e aceitação pessoal de uma reconciliação já realizada. Isso também tem consequências para a compreensão da Ceia do Senhor: é uma refeição simbólica para celebração de lembrança e gratidão do sacrifício de Cristo.

Nomeado pregador da mais prestigiosa igreja de Zurique, Zwingli implantou a Reforma na cidade, mas morreria quando enfrentou os exércitos católicos. Seu legado foi a vertente reformada da Reforma protestante.

Girolamo Savonarola

Girolamo Savonarola (1452-1498) foi um frade e pregador dominicano italiano que fez uma tentantiva de reformas radicais na Igreja e sociedade em Florença.

Savonarola acreditava que a Igreja havia se corrompido e que precisava retornar a uma forma mais austera e humilde de cristianismo. Pregou sermões inflamados contra os excessos e a decadência moral da época, pedindo que as pessoas se arrependessem e se afastassem do pecado. Criticou o governo da família governante Medici e seu estilo de vida luxuoso.

A influência de Savonarola em Florença cresceu e ele se tornou o líder de fato da cidade por um tempo. No entanto, suas opiniões intransigentes e métodos duros de impor suas reformas acabaram levando à sua queda. Então seria excomungado pelo Papa e, finalmente, queimado na fogueira por heresia.

Ludwig Haetzer

Ludwig Haetzer (1500-1529) foi um erudito, hinista, pioneiro anabatista suíço, além de um de seus primeiros teólogos.

Pouco se sabe de sua origem (por muito tempo especulou-se que era de origem valdense, mas sem provas). Estudou sem se graduar na Universidade de Basileia e dominava latim, grego e hebraico.

Provavelmente ordenado padre católico em Constança, foi capelão próximo a Zurique. Por volta de 1520-1523 teve contato com a Reforma e escreveu um panfleto contra as imagens nas igrejas.

Haetzer esteve nas disputas de Zurique em 1523. Foi um dos primeiros defensores de empregar a Bíblia como autoridade para dirimir disputas doutrinárias. Propagou as ideias de Karstadt e Zwingli sobre os sacramentos, ganhou oposição dos adeptos da posição luterana.

Passou o ano de 1525 envolto em vários debates, reconciliações e polêmicas. Socializou-se e envolveu-se com líderes anabatistas, embora sua posição no movimento não fosse muito clara. Sua esposa, Apolônia, era uma anabatista.

Publicou um prefácio do Livro de Baruque e defende sua canonicidade. No final de sua vida passa a considerar o testemunho do Espírito Santo no crente como superior à pregação ou ao texto bíblico.

Em novembro de 1528, as autoridades Augsburg exigiu que o conselho de Constança prendesse Haetzer. Foi acusado de imoralidade em termos vagos e foi condenado à morte. Foi executado no mesmo local que Jan Huss.

Hans Denck

Johannes (Hans) Denck (ca. 1500-1527) humanista e teólogo anabatista.

Denck era um jovem estudioso humanista oriundo de Habach, Bavária. Em 1517 matriculou-se na Universidade de Ingolstadt, da qual recebeu o grau de Bacharel em Artes. Mundou-se para Basileia, onde continou a estudar na universidade da cidade. Versado em latim, grego e hebraico, erudito, escreveu várias obras teológicas consolidando o pensamento anabatista. Aderiu ao anabatismo em 1525, mas morreu de peste em Basileia dois anos após sua conversão.

Denck participou da rede de anabatistas da Suíça e do sul da Alemanha, junto de Balthasar Hubmaier e Hans Hut. Integrou a reunião de 1527 em Augsburg que ficou conhecida como o “Sínodo dos Mártires”.

TEOLOGIA

Um tema central de sua reflexão é como Deus, que é imutável e eterno, se revela em seu mundo criado, que é transitório e temporal.

A fonte da revelação é Cristo, o qual é a Palavra de Deus. As Escrituras são testemunhas da manisfestação da Palavra de Deus. Entretanto, a salvação não está vinculada às Escrituras. O Espírito conduz os crentes à unidade, enquanto a Letra (leitura formalista ou legalista sem o Espírito) tende a criar desacordo e divisão. Desenvolveu um teologia do Logos na qual a Palavra de Deus opera em dois níveis, como uma Palavra interna e uma Palavra externa. A Palavra interior é a Verdade última, pois é Amor, como Deus é Amor e essa Palavra encarnou em Cristo Jesus. As Escrituras seriam a Palavra externa, suprema a qualquer tesouro humano.

Denck foi um dos pioneiros no restauracionismo. Argumentava que a corrupção da Igreja começou após a morte dos apóstolos. Nessa época teria tido um desvio, com o foco novamente nas coisas externas e na autoridade humana, em vez da liderança espiritual dos crentes e da Igreja de Cristo.

Em sua soteriologia, Denck transferiu o sacramentalismo (reencenação do sacrifício de Cristo nos sacramentos) para a transformação interior. O sacrifício histórico de Cristo na carne não seria suficiente para a salvação. Também seria necessário uma crucificação e ressurreição interior dentro do indivíduo através do poder ativo do Espírito de Cristo. Desse modo, o batismo exterior com água não é necessário porque o sacramento é principalmente um batismo espiritual interior pelo Espírito Santo. Portanto, as águas batismais não possuíam caráter regenerador. Igualmente, a Santa Ceia do Senhor externa não seria necessária, pois o sacramento é principalmente uma alimentação interior e espiritual do corpo espiritual de Cristo, que é o “pão da vida”.

Como os anabatistas atuais, Denck compartilhou o compromisso com a não violência, a tolerância religiosa e a liberdade de consciência. Rejeitava os juramentos e a doutrina da predestinação.

“Como o amor n’Ele era perfeito e como o amor não odeia ou inveja ninguém, mas inclui a todos, ainda que todos fôssemos seus inimigos, certamente Ele não desejaria excluir ninguém. E se Ele tivesse excluído alguém, então o amor teria sido vesgo e um discriminador de pessoas. E isso, [Deus] não é!”

Denck. Se Deus é a causa do mal

BIBLIOGRAFIA

Denck, Hans; Bauman, Clarence. The Spiritual Legacy of Hans Denck : Interpretation and Translation of Key Texts. Leiden: Brill, 1991.

Giacomo Aconcio

Giacomo Aconcio ( c. 1520 – c. 1566) jurista, engenheiro e teólogo italiano.

Durante o papado de Paulo VI, a perseguição aos simpatizantes da Reforma na Itália intensificou. Aconcio refugiou-se em Basileia e depois Zurique, onde se juntou ao grupo de reformadores italianos capitaneado por Ochino. Na Inglaterra trabalhou para a rainha Elizabeth I e frequentava uma igreja Reformada holandesa. Contudo, foi acusado de anabatismo e arianismo por suas posições em defesa da liberdade de consciência diante do dogmatismo.

OBRAS

Dialogo di Silvio e Mutio (1558) críticas reformistas à igreja católica.

Summa de Christiana religione (1558) constitui uma das primeiras teologias sistemáticas sob perspectiva irênica, ou seja, apresentação de doutrinas comuns sem tomar posições que dividiam a cristandade.

Stratagemata Satanae (1565) apresenta uma proposta de tolerância religiosa. Desaprova a confissão forçada e a perseguição de hereges. Ganhou grande importância para a difusão da ideia de tolerância nos dois séculos seguintes.