Neutäufer

Originários dos avivamentos da Suíça e sul da Alemanha no século XIX, os Neutäufer buscam viver o cristianismo primitivo a partir de uma leitura simples da Bíblia e uma vida transformada pelo evangelho.

O movimento nunca teve uma designação uniforme. Foram chamados de Neutäufer (“novos batistas” em contraste com os menonitas), Fröhlichianer, Nazarénusok, Gemeinschaft Evangelisch Taufgesinnter, New Amish, Nazarener-Gemeinde, Apostolic Christian Church, Nazarenos, dentre outras nomenclaturas.

O fundador foi o suíço Samuel Heinrich Fröhlich (1803-1857). Fröhlich estudou teologia nas universidades de Zurique e Basel, mas não simpatizava com o racionalismo da teologia acadêmica da época. Participante do réveil suíço, em 1825 passou por uma experiência de conversão. Proibido pelas autoridades de pregar o avivamento, deixou a Igreja Reformada estatal.

Recebeu apoio da Sociedade Continental dos irmãos Haldane para continuar a evangelizar. Em fevereiro de 1832 Fröhlich foi batizado em Genebra por Ami Bost e iniciou a pregar em reuniões domésticas atraído novos convertidos. Passou também a pregar em congregações menonitas. Em 1834, por questão do modo de batismo, santa ceia e demanda por disciplina, vários menonitas organizaram congregações separadas sob orientação de Fröhlich. Incapaz de coordenar tão grande comunidade, Fröhlich pediu apoio aos batistas londrinos e entabulou planos com Johann Gerhard Oncken em 1846 para unirem-se com os batistas. No entanto, tal união não fruiu. Em 1844 Fröhlich foi expulso da Suíça e asilou-se em Estrasburgo onde morreu.

O movimento ganhou adeptos entre classes trabalhadoras urbanas e rurais na Europa Central. Das regiões de fala alemã, o movimento esparramou-se pelo território do antigo Império Austro-Húngaro. Formaram-se congregações de língua húngara, sérvia, eslovaca e alemã. A primeira igreja na América do Norte foi organizada em 1852 entre os Amish em Croghan, Nova York.

Mesmo o ostracismo e as perseguições fizeram o movimento florescer. Resultante de uma organização congregacionalista, complicada por fatores de língua e etnicidade, bem como diferentes arranjos legais a cada nação, o movimento nunca esteve sob uma só denominação. As principais denominações são:

  • Apostolic Christian Church of América -Igreja Cristã Apostólica da América– com uma centena de igrejas nos Estados Unidos e algumas no Canadá, México e Japão, com aproximadamente 11.500 membros. Remonta das primeiras igrejas fundadas no meado do século XIX.
  • Apostolic Christian Church (Nazarean) -Igreja Cristã Apostólica (Nazareana) – com cerca 50 congregações nos Estados Unidos, 14 congregações no Canadá , 16 congregações na Argentina, além de igrejas na Austrália, Hungria, Brasil (Igreja PAZ e Igreja Evangélica Nazareno, não confundir com a Igreja do Nazareno) e no México, além de trabalho missionário na Nova Guiné, Zâmbia, Israel e Paraguai. Formada por migrantes da Europa Central e Oriental que se estabeleceram nos Estados Unidos, manteve comunhão com as igrejas europeias. Moderadamente, adotou costumes comuns aos evangelicais. Um membro conhecido da denominação é o palestrante e autor Nick Vujicic.
  • Nazarene Christian Congregation – Congregação Nazarena Cristã – reúne membros com vínculos com a antiga Iugoslávia (onde possui mais igrejas), Austrália, Estados Unidos e Canadá.
  • Bund Evangelischer Täufergemeinden – União dos Evangélicos Neo-Batistas – Alemanha, Suíça, Áustria e França (Alsácia), com cerca de 2500 membros.
  • Nazarenos: grupos dispersos na Suécia, Hungria, Sérvia, Croácia, Romênia, Ucrânia e Eslováquia.
  • Há ainda congregações e redes menores de congregações independentes na Europa e Estados Unidos.

Junto dos menonitas russos e dos Bruderhof, os Neutäufer são exemplos de remanescentes anabatistas “plain” (aqueles que não adotaram costumes correntes dos evangélicos em geral) na Europa. Juntos do Movimento dos Irmãos (de Plymouth) constituem os herdeiros do réveil que mais retiveram práticas primitivistas.

Os Neutäufer creem somente na Bíblia como fonte de autoridade. No geral, sua teologia é anabatista, mas com uma ênfase na conversão pessoal típica do pietismo e do réveil. A centralidade da fé em Jesus Cristo é manifesta na conversão. A conversão é vista como um processo de autoexame, arrependimento e restituição de erros pendentes até alcançar paz com Deus. Considerando o ser humano totalmente dependente da graça de Deus, creem que o pecado é perdoado somente pelo sangue de Jesus na conversão. Sendo então santificados, os pecados eventuais posteriores dependem do perdão alcançado pela intercessão de Jesus Cristo perante Deus Pai.

A crença de que os remidos formam uma comunidade santificada resulta em meticulosas normas de vida comunitária. A violação das normas comunitárias equivale à queda da fé. Membros tomam como responsabilidade a exortação mútua para auxiliar na caminhada na fé e na correção dos eventuais desvios.

As práticas e costumes denominacionais variam conforme os grupos, mas há um complexo corpo de normas tácitas amplamente conhecidas e praticadas a cada congregação. Há desde movimentos que são semelhantes a outros evangélicos, como as Igrejas PAZ no Brasil ou a Bund Evangelischer Täufergemeinden alemã, mas boa parte são tradicionalistas quanto a costumes e práticas de culto. No entanto, esses costumes não possuem tanta autoridade como entre outros grupos “plain” dos anabatistas (menonitas e Amish).

Cada congregação local é autônoma totalmente em matérias de gestão financeira, eleição dos ministros e disciplina dos membros. As decisões denominacionais são feitas por consenso, com participação de representantes de todas as igrejas. Alguns grupos possuem conselhos de ministros permanentes enquanto outros reúnem-se em assembleias gerais esporádicas. Homogeneidade comportamental é esperada em todas congregações dentro de uma denominação.

Tradicionalmente, os Neutäufer reúnem-se para cultos nos quais os hinos são somente cantados a capella. Crendo firmemente na guia do Espírito Santo no culto, as pregações não são preparadas antecipadamente (normalmente, a parte lida resulta de abrir a Bíblia aleatoriamente) e as orações são feitas espontamentes. Os cultos são presididos coletivamente por um grupo de anciãos que alternam nas pregações conforme sentirem movidos pelo Espírito Santo. Os anciãos e diáconos são eleitos pela congregação local e não frequentam seminários. Nos cultos, observam o assento separado por gênero e as mulheres usam véus. Alternam pregações, hinos e orações. No final, há a bênção apostólica e a saudação com o ósculo santo. Normalmente fazem dois cultos de formatos similares no domingo, um cedo e outro à tarde. Realizam um almoço comum, a ágape bíblica.

Somente adultos podem ser batizados. Antes, o convertido deve testemunhar seu arrependimento da vida de pecado e sua restituição dos erros em uma reunião privada com a igreja antes de descer às águas. Após o batismo há uma oração com a imposição das mãos simbolizando o selo do Espírito Santo.

Avessos às coisas do mundo, evitam o serviço militar (se convocados, servem em posição de não combatentes) e não concorrem a cargos públicos. Não admitem partidarismo ou instrumentalização política de suas igrejas. O casamento somente é permitido entre membros da denominação. Frequentar cultos de outras denominações é proibido. A influência de outras persuasões religiosas é rejeitada, embora privadamente os membros possam ler literatura de teologias diversas. Homens e mulheres observam modéstia nas vestimentas e no consumo, com os trajes femininos sendo saias e vestidos. Rejeitam fazer juramentos. Consideram como pecados que levam à morte matar alguém ou relacionamento sexual fora do casamento. Tais pecados levam à exclusão permanente das congregações locais, pois consideram que somente Deus pode perdoá-los. Embora aceitem a conversão de pessoas divorciadas ou com segundas núpcias, após o batismo não é mais permitido o divórcio ou novo casamento.

Combinando as tradições anabatistas, pietistas e do réveil, os Neutäufer mantém um caráter coletivo de vida cristã. A adesão e caminhada na vida cristã é pregada em tons contemplativos, piedosos e convidativos, mas sem apelos do salvacionismo individualista comum no evangelicalismo anglo-americano. Dessa forma, não há espaço para destaques personalistas de pregadores ou líderes. O culto e a vida fora da Igreja é orientada para juntos seguirem as instruções de Jesus Cristo.

BIBLIOGRAFIA

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