666 e o Rei Salomão

A associação do número 666 com o Rei Salomão deriva de 1 Reis 10:14 (e uma passagem paralela em 2 Crônicas 9:13):

Ora, o peso do ouro que se trazia a Salomão cada ano era de seiscentos e sessenta e seis talentos de ouro. 

Essa menção específica de 666 talentos de ouro recebidos por Salomão anualmente gerou diversas interpretações, especialmente em relação ao “número da besta” em Apocalipse 13:18.

As principais associações e interpretações incluem:

  • Riqueza e Apostasia: o número 666 e Salomão seria um símbolo de sua crescente riqueza e subsequente afastamento de Deus. Após essa menção dos 666 talentos de ouro, as narrativas bíblicas descrevem Salomão violando as leis de Deus ao acumular muitos cavalos, carros, esposas estrangeiras e ouro (1 Reis 10:26; Deuteronômio 17:16-17). Essa desobediência e idolatria levaram à divisão do reino de Israel após sua morte. Nesse sentido, o número 666 poderia representar uma riqueza terrena excessiva que leva à apostasia e ao pecado.
  • Paralelo com a Besta: A apostasia de Salomão e as características da Besta em Apocalipse compartilhariam um paralelo. Assim como Salomão se desviou de Deus por causa de sua riqueza e alianças com nações estrangeiras, a Besta seria um poder terreno que se opõe a Deus e exige adoração. O número 666, nesse contexto, poderia simbolizar o auge do poder humano e da rebelião contra o divino.
  • Número da imperfeição humana: Outra interpretação mais geral do número 6 na numerologia bíblica seria a de imperfeição, pois é um número abaixo do 7, que frequentemente simboliza a perfeição divina. A repetição do 6 (666) poderia, então, intensificar essa ideia de falha e imperfeição inerente ao poder humano quando separado de Deus. A associação com Salomão reforçaria essa ideia, já que mesmo um rei sábio e abençoado por Deus sucumbiu à tentação da riqueza e do poder.
  • Coincidência histórica: A menção dos 666 talentos de ouro seria simplesmente um registro histórico da receita anual de Salomão e não possui necessariamente um significado simbólico profundo ou uma conexão direta com o número da Besta no Apocalipse. A semelhança numérica seria apenas uma coincidência.
  • Tipologia: Dentro de uma leitura tipológica da Bíblia, Salomão pode ser visto como um tipo ou prefiguração de figuras futuras, tanto positivas (Cristo) quanto negativas (o Anticristo). Nesse sentido, sua queda e a menção do número 666 associado à sua riqueza poderiam servir como um aviso sobre os perigos do poder e da apostasia para líderes futuros.

Joannes Stobaeus

Joannes Stobaeus (século V – desconhecido), um compilador e antologista bizantino, responsável preservação de muito da sabedoria clássica e cristã por meio de sua monumental obra, o “Anthologion” (Florilegium ou Excerpta ex libris). Este compêndio é uma coleção vasta de extratos de diversos filósofos e poetas gregos, incluindo autores cristãos. Tornou-se uma fonte valiosa para o pensamento da Antiguidade Tardia.

O “Anthologion” foi originalmente compilado para seu filho, Septimius, com o propósito de educá-lo sobre a filosofia e a moral. A obra é dividida em quatro livros, que cobrem temas como ética, política, física e teologia. Cada livro é subdividido em capítulos. Cada capítulo contém uma série de citações de diferentes autores, muitas vezes introduzidas por uma breve contextualização ou comentário de Stobaeus. A amplitude e a diversidade das fontes citadas tornam o “Anthologion” uma fonte importante para o estudo de autores antigos cujas obras originais se perderam. Sem Stobaeus, grande parte do pensamento de figuras como Eurípides, Menandro e os filósofos estoicos e platônicos seria desconhecida. A inclusão de autores cristãos no “Anthologion” é particularmente notável.

Embora Stobaeus fosse um compilador e não um pensador original, a organização e a curadoria de seu “Anthologion” demonstra uma erudição filológica digna de nota.

666

O número 666, seiscentos e sessenta e seis, ou número da besta, é uma cifra enigmática que aparece no livro do Apocalipse 13:18. A passagem diz: “Aqui há sabedoria. Aquele que tem entendimento calcule o número da besta, pois é número de homem; e o seu número é seiscentos e sessenta e seis.”. A identidade desse número tem sido objeto de intensa especulação e interpretação ao longo da história. É identificado como o “número da besta”, associando-o a uma figura ou poder terreno oposto a Deus.

A gramática da frase grega “ἀριθμὸς γὰρ ἀνθρώπου ἐστίν” (“pois é número de homem”) oferece duas interpretações principais. Uma leitura sugere que o número 666 é o número de um homem específico, enquanto outra interpretação propõe que “homem” (ἄνθρωπος – anthrópou) é genérico, significando que o número representa a humanidade em geral. A construção gramatical no grego apoia a leitura genérica, indicando que o número 666 seria simbólico da humanidade. Nesse sentido, a Besta, como a maior representação da humanidade sem Cristo e a melhor falsificação de um homem perfeito engendrada pela serpente antiga, ainda estaria aquém da perfeição, que seria simbolizada pelo número sete.

Ao longo dos séculos, inúmeras tentativas foram feitas para identificar o “homem” cujo número é 666. Uma leitura influente porém questionada, apoiada por evidências textuais e históricas, sugere que 666 codificaria o nome do imperador romano Nero (ou talvez Domiciano), cuja perseguição aos cristãos no século I d.C.. Essa interpretação se baseia na prática antiga da gematria, que atribuía valores numéricos às letras hebraicas e gregas, permitindo que nomes fossem expressos como números. Ao transliterar o nome “Neron César” em hebraico e aplicar a gematria, seria possível chegar ao valor 666.

Além disso, uma variante textual minoritária em alguns manuscritos antigos do Apocalipse apresenta o número como 616, que corresponde à gematria do nome “Nero César” em latim. No entanto, essa variante é considerada suspeita por muitos estudiosos, pois pode ter sido motivada pela tentativa de se alinhar mais precisamente com a gematria do nome de Nero.

  • Papiro P¹¹⁵: Um dos manuscritos que apresenta a leitura de 616.
  • Códice C (Codex Ephraemi Rescriptus): Outro testemunho textual que registra 616.
  • Alguns manuscritos conhecidos por Irineu: O Pai da Igreja Irineu, escrevendo no século II, estava ciente de manuscritos que traziam a leitura de 616.
  • Dois minúsculos manuscritos (5 e 11): Embora não mais existentes, esses manuscritos também continham a variante 616.

Outra associação histórica do número 666 é com o rei Salomão. Em 1 Reis 10:14, é registrado que o peso do ouro que Salomão recebia anualmente era de 666 talentos de ouro. Alguns intérpretes veem essa menção como um símbolo da riqueza terrena que levou à apostasia de Salomão, estabelecendo um paralelo com a natureza anticrística da Besta.

Outras interpretações propõem que o número represente um sistema político, econômico ou religioso específico, ou ainda simbolize a imperfeição máxima, uma vez que 6 é um número aquém do número perfeito 7. Variações textuais antigas do Apocalipse, como um papiro que apresenta o número 616, complicam ainda mais a questão, sugerindo que a interpretação original pode ter se referido a outra figura ou cálculo.

Apesar dessas associações históricas, o termo “Anticristo” em si não aparece no livro do Apocalipse, restringindo-se às epístolas de João para descrever aqueles que negam a natureza de Cristo. A partir do século IV, a figura do Anticristo passou a ser sinônimo dos poderes malignos descritos no Apocalipse, incluindo a Besta cujo número é 666.