Concursus Dei

Concursus Dei ou concursus divinus significa ‘concorrência divina’, representa uma doutrina teológica e filosófica da interação simultânea de atividades divinas e humanas.

Este conceito serve para reconciliar a dicotomia percebida entre eventos atribuídos a atos da natureza ou dos seres humanos e aqueles atribuídos a atos de Deus. Assim, uma ocorrência pode ser considerada tanto como um ato da natureza ou da humanidade quanto como um ato de Deus. Consequentemente, as criaturas não são impulsionadas por Deus apenas em termos de sua origem (criação) e preservação na existência, mas também em suas operações causais.

O apoio ao conceito de concursus Dei é frequentemente citado em passagens bíblicas como Isaías 26:12 e 1 Coríntios 15:10.

Aplicado aos milagres, o concursus Dei sugere que quando um indivíduo experimenta a cura, o crédito deve ser atribuído a Deus. No entanto, os meios pelos quais a cura ocorre muitas vezes envolvem vários instrumentos humanos e tecnológicos empregados por Deus, tais como profissionais médicos, medicamentos, terapias, tecnologia e as orações. Embora Deus possa efetuar a cura diretamente, a doutrina afirma que seu método comum envolve a utilização desses meios. O objetivo final da cura ocorre simultaneamente com as intervenções humanas e tecnológicas, destacando a relação harmoniosa entre a agência divina e os esforços humanos,

No contexto da inspiração da Bíblia, o concursus Dei faz uma analogia com a encarnação. De acordo com esta doutrina, o Espírito Santo inspirou o texto bíblico ao mesmo tempo que permitiu a expressão simultânea da agência humana. Isto inclui o contexto cultural, a linguagem, o contexto histórico, as escolhas estilísticas e as convenções de gênero literário empregadas pelos autores humanos. Em essência, o concursus Dei afirma que a Bíblia é divinamente inspirada, mas reconhece a dimensão humana na sua composição, reconhecendo as influências culturais e linguísticas que moldaram o texto sagrado.

BIBLIOGRAFIA

Reichard, Joshua D. “Toward A Pentecostal Theology of Concursus.” Journal of Pentecostal Theology 22.1 (2013): 95-114.

Proposta Rogers-McKim

Rogers/McKim Proposal ou a Proposta Rogers-McKim é uma doutrina acerca da autoridade bíblica que a Bíblia detém autoridade em questões de fé e conduta, mas pode conter erros em detalhes históricos ou científicos.

Baseando-se na distinção de inspiração da Bíblia por sua função em contraste de sua forma, como proposta pelo teólogo reformado holandêns G.C. Berkouwer, em 1979, os teólogos reformados evangélicos Jack B. Rogers e Donald McKim se uniram para escrever The Authority and Interpretation of the Bible: An Historical Approach. Rogers, professor do Fuller Theological Seminary, e McKim, membro visitante do Westminster College, investigaram como os teólogos ao longo da história perceberam a autoridade das Escrituras.

No século XIX, a doutrina da inerrância surgiu como uma inovação norteamericana liagada a teólogos de Princeton como B.B. Warfiel. Nessa versão, afirmavam que a Bíblia é inteiramente isenta de erros em todas as suas afirmações de fé e ciência, mas somente nos autógrafos originais. Rogers e McKim exploraram as influências filosóficas de Platão em uma recepção idealizada das Escrituras por teólogos como Lutero, contrastando-as com aqueles mais influenciadas por Aristóteles, como Francisco Turretin, que tendiam a basear a sua doutrina na razão em vez da fé e na ontologia em vez da função.

Rogers argumentou que a forma literária das Escrituras não pode ter autoridade devido à sua infinita variabilidade. Salientaram como Agostinho influenciou na formação de como a tradição da igreja entendia as Escrituras, enfatizando os ensinamentos pretendidos pelo Espírito em detrimento da precisão histórica técnica. Em razão disso, Agostinho não via problemas em considerar os seis dias da criação como alegóricos.

Os autores demonstraram como a Escolástica Protestante e Princeton afastaram-seda Doutrina da Inspiração dos Reformadores, substituindo-a por uma visão mecânica da inspiração. Os reformadores, como Calvino, enfatizaram a fé em busca de entendimento ao abordar a Bíblia. Acreditavam na acomodação da Bíblia para revelar a verdade sem exigir precisão absoluta em cada detalhe factual. 

Calvino, assim como Agostinho, aceitou os erros técnicos como parte dos meios de comunicação humana, aumentando o poder de persuasão da mensagem. Ele não esperava que a Bíblia fornecesse informações tecnicamente precisas sobre linguagem, história ou ciência, enfatizando o seu propósito de estabelecer um relacionamento correto com Deus. 

Os calvinistas holandeses, como Kuyper e Bavinck, seguiram o método agostiniano, colocando a fé antes da compreensão. Eles se concentraram em como Deus se relaciona com a humanidade, em vez de provar a existência de Deus através da razão.

Os Princetonianos, entretanto, introduziram uma inerrância focada na forma e não na função. Rogers e McKim defenderam a infalibilidade da função da Bíblia em trazer Cristo e a salvação. Reconheceram a vulnerabilidade da Bíblia como documento histórico e literário, mas enfatizaram a sua verdade infalível, enraizada no Deus eterno.

Meio às controvérsias teológicas e políticas dos anos 1970, os inerrantistas deram resposta. John D. Woodbridge escreveu “Biblical Authority: A Critique of the Rogers/McKim Proposal”. Nesta revisão erudita, Woodbridge desafiou muitas das premissas de Rogers e McKim, como demonstrar que Agostinho também tinha uma consideração mais elevada pela expressão verbal da Palavra. No entanto, esta crítica de Woodbrige não foi suficiente para rejeitar as conclusões da Proposta Rogers/McKim. No geral, Woodbridge criticou Rogers e McKim pontualmente em suas premissas, mas sem desafiar suas conclusões. Apesar de Woodbridge ter acusado Rogers e McKim de serem excessivamente seletivos nas citações, ele próprio apresentou as fontes de maneira seletiva. A publicação da Proposta Rogers/McKim durante a batalha pelas Bíblias e a Declaração de Chicago sobre a Inerrância Bíblica refletiu controvérsias em curso.

Em resumo, a proposta de Rogers/McKim esclareceu os diversos pontos de vista acerca dos pais da igreja, os doutores da igreja medieval e os reformadores em relação às Escrituras. Demonstraram que apenas citar declarações que afirmam a veracidade das Escrituras não equivale a alinhar-se com a inerrância fundamentalista americana moderna. Adicionalmente, os autores demonstraram como a Escolástica Protestante e Princeton afastaram-seda Doutrina da Inspiração dos Reformadores, substituindo-a por uma visão mecânica da inspiração. Os reformadores, como Calvino, enfatizaram a fé em busca de entendimento ao abordar a Bíblia. Acreditavam na acomodação da Bíblia para revelar a verdade sem exigir precisão absoluta em cada detalhe factual. Polêmicas mais tarde levariam à Declaração de Chicago sobre a Inerrância Bíblica.

A proposta Rogers/McKim pode ser chamada de inerrância funcional, inerrância limitada ou como uma forma de infabilidade bíblica.


BIBLIOGRAFIA

Bloesch, Donald. Holy Scripture: Revelation, Inspiration and Interpretation. Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1994.

Rogers, Jack Bartlett., and Donald K. McKim. The Authority and Interpretation of the Bible: An Historical Approach. San Francisco: Harper & Row, 1979.

Johann Gerhard

Johann Gerhard (1582-1637) foi um teólogo alemão integrante da ortodoxia luterana na fase da Escolástica Protestante.

Gerhard foi Professor de Divindade em Jena (1616), sendo quatro vezes reitor lá. Escreveu copiosamente sobre teologia exegética, polêmica e dogmática. Sua Loci communes theologici (1610-1622) foi o maior texto dogmático luterano já produzido até hoje.

Gerhard discutiu sobre a bibliologia. Discorrendo sobre a sola scriptura, defendia que a leitura e meditação das Escrituras tinham um papel na salvação.
Tal posição foi contraposta por Hermann Rahtmann (1585-1628). Rahtmann era um ministro luterano em Danzig e teólogo sobre a relação entre a Escritura e o Espírito. Rahtmann atribuía ao Espírito o papela que Gerhard dava às Escrituras em relação à salvação. Rahtmann discernia entre as Escrituras e a Palavra de Deus. As Escrituras seriam um testemunho escrito da Palavra que Deus.

O Tractatus De Legitima Scripturae Sacrae Interpretatione (Steinmann, 1610) de Johann Gerhard formula intrincadamente a doutrina da Sagrada Escritura como o princípio da teologia dentro do contexto da ortodoxia luterana. Considerava as palavras divinas como os princípios primários. Salientou a fórmula a única regra e norma, e seu próprio intérprete, inspirando-se na definição aristotélica de conhecimento científico. A Escritura é o cânon ou a régua para a teologia. Segundo Gerhard, a Bíblia é a Palavra de Deus escrita pelos escribas bíblicos, sendo as palavras das Escrituras às do Espírito Santo.

Afirmava a independência da teologia. Similar à Segunda Confissão Helvética, Gerhard distingue entre Palavra revelada, pregada e escrita.