Yahwismo 

Yahwismo refere-se às práticas religiosas dos antigos israelitas e outros povos centradas em YHWH como Deus principal. No Yahwismo, o culto de YHWH ou Yahweh coexistia (sobretudo, de forma competitiva) com outros cultos. A Bíblia atesta a afirmação de YHWH como o único e verdadeiro Deus, que havia feito uma aliança com os israelitas, prometendo protegê-los enquanto demandava sua obediência e adoração.

Fora da Bíblia, Yhwh é relativamente escassamente documentado e não é necessariamente uma divindade especificamente israelita. Há atestações arqueológicas do culto de Yahweh tanto em ambientes pré e pós-exílicos:

  • O governador hitita de Hamate, na Síria, tem o nome teofórico Yahu-Bihdi, cujo nome foi escrito com o determinante divino DINGIR, no século VIII a.C.
  • Yahu nos nomes das tabuletas de Murashu, na Mesopotâmia; em Elefantina no Egito e na transjordânia.
  • Inscrições de Kuntillet ʿAjrud e Khirbet el-Qom no sul do Levante.
  • Menções intrabíblicas de YHWH associado com a região sul do Levante.

O surgimento do culto a Yahweh, conforme descrito em fontes extra-bíblicas, revela uma evolução complexa no contexto das religiões semíticas ocidentais. Yahweh ou YHWH, não seria inicialmente uma divindade exclusiva dos israelitas.

As hipóteses correntes são várias. Uma perspectiva é que a adoração de Yahweh teria evoluído a partir de uma mistura de elementos religiosos cananeus, combinando várias divindades como El com outros deuses cananeus para formar uma divindade suprema. A transição da monolatria para o monoteísmo em Israel é um processo debatido, com estudiosos como Mark S. Smith propondo uma mudança gradual pós-exílio, enquanto outros, como Nissim Amzallag, defendem um monoteísmo latente dentro da cultura cananeia. Outra perspectiva é a hipótese midianita, postulando que o culto de Yahweh teria origem na região de Edom e Midiã. Uma variante dessa perspectiva é a hipótese quenita. Os seminômades queneus teriam introduzido o culto de Yahweh na região do norte. O historiador da religião holandês, Cornelis P. Tiele em 1872 caracterizou Yahweh como sendo historicamente o Deus do deserto, que havia sido adorado pelos queneus. Tal teoria foi desenvolvida por Karl Budde na Alemanha e por Harold Henry Rowley na Inglaterra. Outra perspectiva localiza no Reino do Norte a emergência do culto exclusivo de Yahweh.

Os ciclos de Elias e Eliseu na Bíblia estão intimamente relacionados ao Yahwismo. Elias e Eliseu foram profetas que viveram durante o período da monarquia dividida em Israel, quando o reino do norte de Israel e o reino do sul de Judá eram entidades políticas separadas. Ambos eram ferrenhos defensores de Yahweh e de sua adoração exclusiva, e frequentemente entravam em conflito com os profetas de Baal, um culto competitivo.

Os ciclos de Elias e Eliseu retratam a luta entre as forças de Yahweh e as forças de Baal, com os profetas de Yahweh saindo vitoriosos no final. Os ciclos também enfatizam o poder de Yahweh para realizar milagres e intervir nos assuntos de seu povo, como visto no confronto de Elias com os profetas de Baal no Monte Carmelo e na cura da lepra de Naamã por Eliseu. Similar a outros profetas literários vinculados ao reino do norte em Israel (principalmente Amós e Oseias), esse ciclo atesta um conjunto de práticas religiosas e crenças aparentemente desconhecedora da Torá mosaica tal como a conhecemos atualmente.

No período pós-exílico o culto de Yahweh é atestado em Judá e Samaria, na Mesopotâmia, na Transjordânia e no Egito. Contudo, nem todos esses locais são associados com uma identidade judia. Eventualmente, desses cultos emergiram os judaísmos do Segundo Templo.

CaracterísticaCiclo de Elias-EliseuYahwismo MosaicoYahwismo Davídico-SionistaYahwismo Pós-Exílico
Figuras CentraisElias, EliseuMoisés Reis Davídicos, SacerdotesEscribas, Sacerdotes
ÊnfaseProfecia, Milagres, Confronto com BaalAliança, Lei (Torá), Êxodo, LibertaçãoRealeza, Templo, Teologia de SiãoMonoteísmo, Estudo da Torá, Sinagoga
Local de CultoPouca ênfase no Templo; foco em encontros proféticosTabernáculo (santuário portátil)Templo de Jerusalém como santuário centralSinagoga
Local de CultoProfetasSacerdotes e levitasSacerdotes e levitasSacerdotes e levitas
Representação de YahwehDeus da tempestade, Poderoso, Intervém dramaticamenteLegislador, Libertador, Justo, MisericordiosoRei, Patrono, Fonte de bênção nacionalTranscendente, Universal, Juiz de todas as nações
Tratamento dos VulneráveisAmbíguo; mistura de compaixão e severidadeForte ênfase na justiça e proteção; provisões legais para grupos vulneráveisPotencial para negligência; crítica profética da injustiça socialMaior responsabilidade comunitária; interpretação escriba das leis que protegem os vulneráveis
Textos-chave1 Reis 17-2 Reis 13Êxodo, Levítico, Números, DeuteronômioSamuel, Reis, Salmos, CrônicasIsaías, Jeremias, Ezequiel, Profetas Menores, Reinterpretação da Torá

BIBLIOGRAFIA

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Hipótese midianita

A hipótese midianita também é conhecida como hipótese quenita propõe que as origens de Yahweh e do Yahwismo tenha sido no sul do Levante.

A teoria afirma que o Senhor originalmente era uma divindade midianita que foi assimilada pelos proto-israelitas. Várias passagens bíblicas apontam que Yahweh veio ao encontro de Israel no Sul (Dt 33:2; Jz 5:4-5; Sl 68:8-9,18; Hc 3:3,7,10; Zc 9:14).

A hipótese surgiu no século XIX entre eruditos alemães, mas sempre foi marginal. Contudo, o reexame de descobertas arqueológicas no início do século XXI levou à sua reconsideração por alguns biblistas.

BIBLIOGRAFIA

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Recabitas

Os recabitas eram um grupo de pessoas de um clã ou tribo dos queneus que habitavam em tendas e possuíam regras estritas quanto ao consumo de bebidas alcoólicas, mencionados principalmente em Jeremias 35.

Os recabitas um grupo de pessoas originárias da região de Midiã e associadas aos israelitas. Os recabitas mantiveram uma adesão estrita a um conjunto de regras dadas a eles por seu ancestral Jonadabe, contemporâneo do rei Jeú de Israel no século IX aC.

Os recabitas viviam em tendas e seguiam um estilo de vida nômade. No entanto, com a ameaça da invasão estrangeira, os recabitas buscaram refúgio em Jerusalém.

O profeta Jeremias usou os recabitas como exemplo de fidelidade e obediência a Deus, contrastando-os com os israelitas que se afastaram de Deus e se recusaram a ouvir suas advertências. Em Jeremias 35, Jeremias levou os recabitas ao Templo e ofereceu-lhes vinho, mas eles recusaram, citando o mandamento de seu ancestral Jonadabe de se abster de vinho e sua adesão a seus mandamentos como prova de sua fidelidade.

Em 1 Crônicas 2:55, os recabitas apacerem como escribas da tribo de Judá. No livro de Neemias diz um grupo deles ajudou a consertar o muro de Jerusalém (Neemias 3:14).

Existem várias lendas e tradições de historicidade questionável. Em uma tradição, diz-se que os recabitas foram recompensados por sua fidelidade ao serem autorizados a servir como porteiros no Templo de Jerusalém. Em outra tradição, dizem que eles se tornaram uma classe sacerdotal, servindo como assistentes dos levitas. Na tradição islâmica, os recabitas são conhecidos como Banu Harith e dizem ter sido seguidores do profeta Elias, tendo se estabelecidos em Khaybar. São mencionados em vários textos islâmicos, incluindo o Hadith, que relata uma história na qual o Maomé elogia os recabitas por sua piedade e adesão aos mandamentos de seus ancestrais.

Por volta de 312 a.C., Jerônimo de Cárdia, um general de Alexandre, o Grande, relata sobre um povo na região de Nabateia que não plantava, não construía casas e não bebia nada alcoólico. (Diodoro S. 19, 94)

O rabino Halafta (séculos I-II d.C) seria descendente dos recabitas. A apócrifa História dos Recabitas, desde a antiguidade tardia, detalha a jornada de um monge chamado Zósimo à “Terra dos Recabitas”. Em 1839, o missionário Joseph Wolff disse ter encontrado no Iêmen, perto de Sana’a , um homem que afirmava ser descendente de Jonadabe.

BIBLIOGRAFIA

Karel van der Toorn, “Ritual resistance and self-assertion: the Rechabites in Early Israelite religion”, Pluralism and identity: Studies in ritual behaviour, SHR 67, 1995.