Eclética

Eclética, Eclecte, Eklektē (Ἐκλεκτῇ) ou a Senhora Eleita refere-se à destinatária da Segunda Epístola de João.

Durante séculos, a identidade dessa figura foi debatida entre uma interpretação metafórica, que a via como uma personificação de uma igreja local, e uma interpretação literal, que a identificava como uma mulher cristã específica.

Estudos recentes de Lincoln H. Blumell sugerem que a omissão de duas letras repetidas em manuscritos antigos transformou o nome próprio Ecletica em um adjetivo comum. Enquanto as edições contemporâneas do Novo Testamento imprimem o texto como eklektē kyria (“à senhora eleita”), evidências em papiros e manuscritos como o Codex Sinaiticus e o Codex Alexandrinus indicam que a leitura original seria Eklektē tē kyria (“à senhora Eclecte”). No Codex Sinaiticus, por exemplo, a nota final da carta identifica-a como a “Segunda de João para Eclecte”, reforçando a tese de uma destinatária individual e não de uma metáfora eclesiástica.

A análise onomástica confirma que Ecletica era um nome feminino comum no período greco-romano, aparecendo em inscrições de nomes e sendo mais comum do que outros nomes de mulheres mencionados no Novo Testamento. Historicamente, Clemente de Alexandria já afirmava que a carta fora escrita a uma “mulher babilônica chamada Eclecte”, embora ele interpretasse o nome também como um símbolo da eleição da igreja.

A restauração do endereço original da carta para “à senhora Ecletica” alinha-se perfeitamente com a estrutura de 3 João, endereçada a Gaio, e com os padrões de correspondência pessoal da Antiguidade.

Essa identificação resgata uma figura de liderança feminina no cristianismo primitivo. Ecletica provavelmente era uma influente líder de uma igreja doméstica, responsável por hospedar a comunidade e protegê-la de falsos profetas, conforme o tema central da epístola. A estrutura da carta a ela endereçada espelha a Terceira Epístola de João, enviada a Gaio, o que reforça o caráter pessoal e histórico do documento em vez de uma ficção literária.

BIBLIOGRAFIA

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Princípio dia-ano

O Princípio Dia-Ano é uma chave hermenêutica utilizada na interpretação de profecias bíblicas, especialmente dentro da escola historicista, que postula que um “dia” em um contexto profético-simbólico representa um ano solar literal. A fórmula central é: 1 dia profético = 1 ano literal. Essa ferramenta transforma cronologias apocalípticas em vastos períodos históricos, permitindo que os intérpretes mapeiem a história da igreja e do mundo ao longo de séculos ou milênios.

A base para este princípio é extraída de algumas passagens nas quais uma correspondência dia-ano aparace como recurso retórico:

  • Números 14:34: Após os espias explorarem a terra de Canaã por 40 dias, Deus sentencia a geração incrédula de Israel a vaguear no deserto, afirmando: “Segundo o número dos dias em que espiastes a terra, quarenta dias, cada dia representando um ano, levareis sobre vós as vossas iniquidades, quarenta anos”.
  • Ezequiel 4:5-6: Deus instrui o profeta a realizar um ato simbólico, deitando-se sobre seu lado por um número de dias correspondente aos anos da iniquidade de Israel e Judá: “Eu te dei os anos da sua iniquidade, segundo o número dos dias… um dia para cada ano”.
  • “Um dia como mil anos” em 2 Pedro 3:8 e Salmos 90:4, indicam que a percepção de tempo de Deus seria diferente da humana. Para Deus, que é eterno, mil anos são como um dia, e um dia é como mil anos, sugerindo uma perspectiva divina sobre a paciência, as promessas e o tempo.

Esses textos são vistos como o precedente divino que autoriza a aplicação do princípio a outras profecias simbólicas, como as encontradas em Daniel e Apocalipse. Suas aplicações mais notáveis incluem:

  • As 70 Semanas (Daniel 9:24-27): A profecia de “setenta semanas” é quase universalmente entendida como semanas de anos. As 70 semanas (490 dias) são interpretadas como 490 anos, começando com o decreto para restaurar Jerusalém e culminando com precisão no ministério, morte e ressurreição de Cristo.
  • Os 1260 Dias (Daniel 7; Apocalipse 11-13): Este período, também descrito como “42 meses” ou “um tempo, tempos e metade de um tempo”, é calculado como 1260 anos. Os historicistas protestantes classicamente identificaram este período com a supremacia papal, datando-o, por exemplo, de 538 d.C. (Decreto de Justiniano) a 1798 d.C. (prisão do Papa Pio VI por Napoleão).
  • Os 2300 Dias (Daniel 8:14): Interpretados como 2300 anos, esta profecia foi a base do movimento Millerita, que calculou o retorno de Cristo para 1844. Após o “Grande Desapontamento”, os Adventistas do Sétimo Dia reinterpretaram o evento, não como a segunda vinda, mas como o início do juízo investigativo no santuário celestial, mantendo o princípio dia-ano como pilar de sua escatologia.

Avaliação crítica e função sociológica

Do ponto de vista exegético, o princípio é considerado uma imposição anacrônica sobre os textos. Os críticos argumentam que não há uma regra bíblica universal para sua aplicação, que ele é usado seletivamente (por que não aplicar aos “mil anos” do Apocalipse?) e que ignora o contexto de iminência e as preocupações históricas dos autores originais, para quem as profecias se referiam a eventos mais próximos. A interpretação frequentemente parece ser guiada pelo resultado desejado, ajustando a história para se encaixar em uma cronologia pré-estabelecida.

Gerhard Hasel observa que o princípio não é derivado indutivamente de um amplo estudo da literatura apocalíptica. Em vez disso, é deduzido de um punhado de textos-prova (Números 14:34; Ezequiel 4:5-6) e então aplicado a Daniel e Apocalipse. Esta é uma decisão teológica, não uma observação literária neutra. Os textos em Números e Ezequiel são relatos narrativos de atos simbólicos, não chaves dadas para interpretar símbolos de tempo apocalípticos.

Beale argumenta que os números no livro (incluindo os 1260 dias) são primariamente simbólicos e teológicos, não cronogramas matemáticos para a história. Para ele, os “1260 dias” ou “42 meses” simbolizam um período de perseguição e testemunho da igreja, um período que é espiritualmente significativo, mas não fixado em 1260 anos literais. Ele vê a aplicação do princípio dia-ano como uma literalização equivocada de um número que se destina a ser simbólico.

Apesar das críticas exegéticas, o princípio dia-ano demonstra uma função antropológica e sociológica. Funciona como um mecanismo de ordenação cosmológica, transformando a história, percebida como caótica e sem sentido, em um plano divino predeterminado e decifrável. Para grupos minoritários ou perseguidos, como os primeiros protestantes, ele ofereceu uma teodiceia, explicando seu sofrimento como uma fase profetizada com um início e, crucialmente, um fim.

Sociologicamente, o princípio é um motor para a formação de identidade e coesão de grupo. A adesão a uma cronologia profética específica (como a data de 1844 para os adventistas) cria uma fronteira clara entre o “nós” que possui o conhecimento revelado e o “eles” que permanece na ignorância. Ele também permite que a comunidade gerencie falhas proféticas, como visto no caso Millerita, onde a reinterpretação do evento, usando o mesmo princípio, permitiu a sobrevivência e reorganização do grupo. Assim, mais do que uma simples ferramenta exegética, o princípio dia-ano funciona como uma tecnologia sociorreligiosa para construir significado, identidade e resiliência em face da crise.

No geral, as ciências bíblicas rejeitam o princípio dia-ano. A crítica geral é que ele carece de uma base hermenêutica consistente. Os exemplos de Números e Ezequiel são considerados casos especiais e narrativos, não chaves universais para decodificar a literatura apocalíptica. A aplicação seletiva do princípio (usado para os 1260 dias, mas geralmente não para os 1000 anos) e sua dependência de uma leitura eurocêntrica da história o tornam insustentável do ponto de vista da análise literária.

VEJA TAMBÉM

Três e meio anos

Leitura historicista

A Leitura historicista da Bíblia é uma estratégica hermenêutica que interpreta a profecia, especialmente nos livros de Daniel e Apocalipse, como um mapa simbólico do curso contínuo da história, desde a época do profeta até o fim dos tempos. Diferente do preterismo, que vê a maioria das profecias cumpridas no século I, e do futurismo, que as projeta para um breve período futuro, o historicismo enxerga um cumprimento progressivo e sequencial ao longo das eras.

As fundações dessa abordagem foram lançadas nos primeiros séculos do cristianismo, quando teólogos como Hipólito de Roma e Jerônimo identificaram os quatro grandes impérios da profecia de Daniel (Babilônia, Medo-Pérsia, Grécia e Roma), estabelecendo a estrutura cronológica básica. Durante a Idade Média, com a fragmentação do Império Romano, intérpretes como Joaquim de Fiore e, mais tarde, pré-reformadores como John Wycliffe, começaram a identificar o poder papal como uma figura central nas profecias apocalípticas, como o “chifre pequeno” de Daniel ou o “homem do pecado”.

A Reforma Protestante do século XVI marcou o apogeu do historicismo clássico. Martinho Lutero, João Calvino e outros reformadores adotaram firmemente a visão de que o papado era o sistema do Anticristo predito nas Escrituras, tornando essa interpretação um pilar de sua polêmica contra a Igreja Romana. Nos séculos XVII e XVIII, eruditos como Joseph Mede e Sir Isaac Newton sistematizaram ainda mais o método, popularizando o princípio dia-ano, no qual um dia profético equivale a um ano literal. Esse princípio foi crucial para calcular longos períodos de tempo, como os 1260 dias proféticos, interpretados como 1260 anos de supremacia papal.

No século XIX, o historicismo gerou diversos movimentos. O Millerismo, liderado por William Miller, usou o princípio dia-ano na profecia das 2300 tardes e manhãs de Daniel 8:14 para calcular o retorno de Cristo para o ano de 1844. Após o “Grande Desapontamento”, uma vertente desse movimento deu origem ao Adventismo do Sétimo Dia, que reinterpretou a data de 1844 não como a segunda vinda, mas como o início de um juízo investigativo no santuário celestial. O adventismo permanece hoje como um dos principais proponentes do historicismo. Outras ramificações surgiram, como o Israelismo Britânico, que aplicava profecias sobre Israel às nações anglo-saxãs. No entanto, foi também no século XIX que o historicismo começou a ser desafiado pelo dispensacionalismo futurista de John Nelson Darby, que viria a dominar a tradição fundamentalista angloamericana no século XX, argumentando que a maioria das profecias aguarda um cumprimento como eventos no futuro.

Paralelamente a essa tradição acadêmica, existe o historicismo popular, uma abordagem reativa e descontextualizada que correlaciona eventos contemporâneos chocantes diretamente a versículos bíblicos isolados. Diferente do historicismo clássico, que busca um padrão contínuo na história, o historicismo popular é impulsionado pela mídia e pela busca de confirmação em tempos de crise. Exemplos incluem a aplicação de profecias sobre a queda da Babilônia aos ataques de 11 de setembro, a interpretação da bomba atômica como o cumprimento de passagens sobre os elementos se desfazendo com calor ardente, ou a associação da pandemia de COVID-19 e das vacinas com a “marca da besta” do Apocalipse. Essa abordagem sensacionalista funciona mais como uma tentativa de encontrar um roteiro divino para eventos caóticos do que como um método interpretativo sistemático.

BIBLIOGRAFIA

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Leitura futurista

A leitura futurista do Livro do Apocalipse interpreta a maior parte de suas profecias — geralmente dos capítulos 4 a 22 — como uma linha do tempo sequencial de eventos que ainda serão cumpridos em um período específico e futuro da história, imediatamente anterior à segunda vinda de Cristo. Para os futuristas, o Apocalipse é primordialmente uma previsão profética do fim do mundo, e seus símbolos são frequentemente entendidos como códigos que descrevem indivíduos, acontecimentos e tecnologias que emergirão na geração final.

Princípios fundamentais e calendário profético

O futurismo, especialmente em sua forma dispensacionalista, postula uma grande “parêntese” na profecia entre o período da igreja (capítulos 2–3) e os eventos futuros. Essa era da igreja culmina com o arrebatamento, um evento singular e dramático que remove os crentes da Terra antes do início da Grande Tribulação.

Os eventos de Apocalipse 4–19 se desdobram então como um período de catástrofe e ira divina com duração de sete anos, dividido em duas metades de três anos e meio. A primeira metade abrange os juízos dos selos e das trombetas; a segunda, conhecida como “Grande Tribulação”, é marcada pela intensificação dos juízos das taças e pelo reinado do Anticristo.

Figuras centrais e simbologia

Durante a Tribulação, figuras específicas se manifestam para cumprir papéis proféticos. O Anticristo (a besta que sobe do mar) é um líder político global carismático que firma e depois quebra uma aliança com Israel, exigindo adoração mundial. O Falso Profeta (a besta que sobe da terra) é um líder religioso que o apoia e impõe a adoração ao Anticristo.

As duas testemunhas (Apocalipse 11) são dois indivíduos proféticos, por vezes identificados como Elias e Moisés, que profetizam em Jerusalém por 1.260 dias. O número 144.000 (Apocalipse 7) é interpretado exatamente como 12.000 judeus de cada uma das doze tribos de Israel, selados para servir como evangelistas durante a Tribulação.

A grande prostituta (Babilônia) é vista como um futuro sistema religioso e/ou político global, frequentemente identificado com um Império Romano reavivado ou com uma religião mundial em aliança com o Anticristo. A marca da besta (666) é entendida como um sinal físico — às vezes especulado como sendo um microchip ou identificação biométrica — essencial para o comércio durante o reinado do Anticristo.

Após o retorno de Cristo na batalha do Armagedom (Apocalipse 19), Satanás é preso, e Cristo estabelece um reino terrestre e político em Jerusalém, com duração de mil anos (Apocalipse 20:4–6), conhecido como o Milênio. Os santos que atravessaram a Tribulação reinarão com Cristo nesse mundo restaurado.

O futurismo vê o Milênio como um reino futuro e terreno, em contraste com as visões amilenista e idealista. Ao final dos mil anos, Satanás é solto para uma rebelião final, que é rapidamente esmagada. Segue-se o juízo final diante do grande trono branco (Apocalipse 20:11–15) e a criação dos novos céus e nova terra.

Críticas e considerações

O futurismo ganhou popularidade por oferecer um senso de urgência e uma narrativa cronológica aparentemente clara do fim dos tempos. Contudo, críticos argumentam que ele negligencia o contexto original do século I e a perseguição romana enfrentada pelos primeiros leitores do livro.

Além disso, embora afirme aplicar uma hermenêutica literal à profecia, essa aplicação é vista como seletiva — tomando alguns elementos como literais (como os mil anos) e outros como simbólicos, sem explicar quais critérios para considerar algo simbólico ou “literal”. Suas interpretações também tendem a ser especulativas, baseadas na identificação de eventos e figuras contemporâneas, o que historicamente levou a previsões que não se concretizaram. O sistema é dependente do dispensacionalismo, uma teologia sistematizada no século XIX. Contudo, pré-milenistas históricos também tendem a adotar uma abordagem futuristas sem utilizar esquemas dispensacionalistas.

Em síntese, a leitura futurista entende o Apocalipse como um roteiro detalhado, revelado por Deus, para o ato final da história humana — com foco no tempo futuro da tribulação e no domínio visível de Cristo sobre a Terra.

BIBLIOGRAFIA

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Leitura idealista

A leitura idealista, também chamada leitura simbólica ou espiritual da profecia bíblica — especialmente do Livro do Apocalipse — interpreta as visões não como previsões de eventos históricos específicos ou futuros, mas como representações atemporais e simbólicas do conflito universal e espiritual entre Deus e Satanás, entre o bem e o mal, que se manifesta ao longo de toda a era da Igreja.

Para o idealista, a mensagem primária é teológica e pastoral, e não cronológica: os símbolos são “retratos” de realidades espirituais, e não “códigos” a serem decifrados.

Princípios fundamentais e simbologia

Partindo de uma análise textual e literária, o idealismo reconhece o caráter simbólico das profecias bíblicas, especialmente no livro de Apocalipse. Desse modo, o idealismo evita deliberadamente vincular as imagens específicas do Apocalipse — como a besta, Babilônia, as trombetas ou o milênio — a impérios particulares, indivíduos singulares (como um único anticristo) ou a um calendário detalhado do fim dos tempos. Rejeita, assim, os modelos preterista, historicista e futurista.

Em vez disso, o conflito central é arquetípico: o dragão (Satanás) é a fonte de todo o mal; as bestas simbolizam a totalidade do poder político hostil e da ideologia religiosa enganosa em todas as suas manifestações; e Babilônia representa todos os sistemas mundanos sedutores, corruptos e opostos a Deus, que desviam os fiéis e perseguem a Igreja.

O propósito do livro, segundo essa ótica, é pastoral e encorajador: oferecer consolo e exortação à perseverança aos crentes que sofrem no presente, assegurando-lhes que Deus é soberano e que Cristo já conquistou a vitória final.

O milênio (Apocalipse 20) é interpretado simbolicamente, quase sempre em uma perspectiva amilenista — como defendido por Agostinho —, representando o reinado presente de Cristo e das almas dos crentes falecidos no céu durante toda a era da Igreja. O “aprisionamento de Satanás” simboliza o cerceamento de seu poder para enganar as nações e impedir o avanço do Evangelho.

Os sete selos, trombetas e taças são vistos como quadros cíclicos e intensificadores dos juízos de Deus contra o pecado e o mal ao longo da história, revelando as consequências inevitáveis da rebelião humana.

Tradições interpretativas

A pedra angular dessa tradição foi lançada por Agostinho em A Cidade de Deus, ao interpretar o milênio como o período entre a primeira e a segunda vinda de Cristo.

No século XX, William Hendriksen popularizou o modelo com sua clássica apresentação da estrutura paralela de sete ciclos, e Anthony A. Hoekema ofereceu uma defesa sistemática rigorosa do amilenismo. Mais recentemente, eruditos como G. K. Beale e Vern S. Poythress refinaram a visão com o conceito de “progressão recapitulatória”, segundo o qual as visões repetem o mesmo período, mas avançam em intensidade e detalhe em direção à consumação final.

O idealismo, por sua ênfase na verdade teológica e por evitar a marcação de datas, é profundamente pastoral. No entanto, pode ser criticado por tornar o texto excessivamente generalizado e por suavizar o contexto histórico imediato da perseguição romana.

Leitura nuanceadas

O teólogo católico Scott Hahn introduz uma lente litúrgica no idealismo. Sua interpretação, altamente simbólica e alinhada com a recapitulação, vê as visões como realidades espirituais atemporais, e não como um mapa cronológico.

A diferença principal está em sua ênfase: para Hahn, o Apocalipse é antes de tudo uma revelação da liturgia celestial — o culto de adoração que ocorre no céu. O livro, portanto, não é um guia para o futuro, mas uma chave para compreender a Missa ou Eucaristia, que torna essa realidade celestial presente na Terra.

Essa abordagem concentra-se no presente espiritual da vitória de Cristo e na adoração da Igreja, utilizando o simbolismo para moldar a vida de fé e culto da comunidade, em vez de se orientar por uma agenda escatológica.

Já na tradição idealista ou espiritual entre pentecostais destacam-se Gordon Fee e Peter Althouse.

A abordagem de Gordon Fee representa uma síntese acadêmica sofisticada, frequentemente chamada de idealismo com premilenismo temático. Fee adota integralmente a base idealista e recapitulatória para cerca de 95% do Apocalipse (capítulos 1–19 e 21–22), insistindo que os selos, trombetas e taças são visões sobrepostas e simbólicas das lutas e juízos que se repetem durante a era da Igreja.

Sua nuance está no tratamento do milênio (Apocalipse 20.1–6). Fee rejeita tanto a leitura dispensacionalista quanto a visão amilenista pura de que o milênio seria apenas a era presente. Ele defende que, dentro da narrativa amplamente simbólica, o milênio constitui um evento futuro e literal, uma etapa transicional entre a parousia (retorno de Cristo) e o estado eterno.

O propósito desse milênio literal não é servir de centro para um calendário profético, mas oferecer a vindicação visível e definitiva dos mártires, respondendo à pergunta sobre o triunfo final da justiça no plano de Deus.

O erudito pentecostal Peter Althouse desenvolve um idealismo pneumatológico e teleológico (orientado para o propósito). Ele aceita a natureza simbólica das bestas e de Babilônia, mas utiliza o Pentecostes (Atos 2) como lente hermenêutica central, vendo-o como o evento inaugural dos “últimos dias”.

Para Althouse, o Apocalipse é uma representação dramática da atividade do Espírito Santo ao longo da era da Igreja, em constante e crescente atuação. Seu idealismo é teleológico porque as repetições — os ciclos de julgamento e salvação — não são meramente atemporais, mas descrevem o processo pelo qual o Espírito Santo progressivamente supera o mal e impulsiona a Igreja em sua missão, culminando na manifestação vitoriosa do Reino de Deus na Terra.

Nessa visão, o milênio é interpretado como símbolo da autoridade espiritual exercida pela Igreja, capacitada pelo Espírito Santo, um triunfo já manifestado, mas ainda não plenamente realizado. Essa leitura distingue-se da ênfase no reinado celestial de Agostinho e da estrita literalidade futura de Fee.

BIBLIOGRAFIA
Agostinho, Santo. A Cidade de Deus. (Obra fundamental para a interpretação simbólica do Milênio, desenvolvida no Livro XX). Várias edições.

Althouse, Peter. Spirit of the Last Days: Pentecostal Eschatology in Conversation with Jürgen Moltmann. Journal for the Study of the New Testament Supplement Series, 25. Londres: T&T Clark International, 2003.

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