Leitura futurista

A leitura futurista do Livro do Apocalipse interpreta a maior parte de suas profecias — geralmente dos capítulos 4 a 22 — como uma linha do tempo sequencial de eventos que ainda serão cumpridos em um período específico e futuro da história, imediatamente anterior à segunda vinda de Cristo. Para os futuristas, o Apocalipse é primordialmente uma previsão profética do fim do mundo, e seus símbolos são frequentemente entendidos como códigos que descrevem indivíduos, acontecimentos e tecnologias que emergirão na geração final.

Princípios fundamentais e calendário profético

O futurismo, especialmente em sua forma dispensacionalista, postula uma grande “parêntese” na profecia entre o período da igreja (capítulos 2–3) e os eventos futuros. Essa era da igreja culmina com o arrebatamento, um evento singular e dramático que remove os crentes da Terra antes do início da Grande Tribulação.

Os eventos de Apocalipse 4–19 se desdobram então como um período de catástrofe e ira divina com duração de sete anos, dividido em duas metades de três anos e meio. A primeira metade abrange os juízos dos selos e das trombetas; a segunda, conhecida como “Grande Tribulação”, é marcada pela intensificação dos juízos das taças e pelo reinado do Anticristo.

Figuras centrais e simbologia

Durante a Tribulação, figuras específicas se manifestam para cumprir papéis proféticos. O Anticristo (a besta que sobe do mar) é um líder político global carismático que firma e depois quebra uma aliança com Israel, exigindo adoração mundial. O Falso Profeta (a besta que sobe da terra) é um líder religioso que o apoia e impõe a adoração ao Anticristo.

As duas testemunhas (Apocalipse 11) são dois indivíduos proféticos, por vezes identificados como Elias e Moisés, que profetizam em Jerusalém por 1.260 dias. O número 144.000 (Apocalipse 7) é interpretado exatamente como 12.000 judeus de cada uma das doze tribos de Israel, selados para servir como evangelistas durante a Tribulação.

A grande prostituta (Babilônia) é vista como um futuro sistema religioso e/ou político global, frequentemente identificado com um Império Romano reavivado ou com uma religião mundial em aliança com o Anticristo. A marca da besta (666) é entendida como um sinal físico — às vezes especulado como sendo um microchip ou identificação biométrica — essencial para o comércio durante o reinado do Anticristo.

Após o retorno de Cristo na batalha do Armagedom (Apocalipse 19), Satanás é preso, e Cristo estabelece um reino terrestre e político em Jerusalém, com duração de mil anos (Apocalipse 20:4–6), conhecido como o Milênio. Os santos que atravessaram a Tribulação reinarão com Cristo nesse mundo restaurado.

O futurismo vê o Milênio como um reino futuro e terreno, em contraste com as visões amilenista e idealista. Ao final dos mil anos, Satanás é solto para uma rebelião final, que é rapidamente esmagada. Segue-se o juízo final diante do grande trono branco (Apocalipse 20:11–15) e a criação dos novos céus e nova terra.

Críticas e considerações

O futurismo ganhou popularidade por oferecer um senso de urgência e uma narrativa cronológica aparentemente clara do fim dos tempos. Contudo, críticos argumentam que ele negligencia o contexto original do século I e a perseguição romana enfrentada pelos primeiros leitores do livro.

Além disso, embora afirme aplicar uma hermenêutica literal à profecia, essa aplicação é vista como seletiva — tomando alguns elementos como literais (como os mil anos) e outros como simbólicos, sem explicar quais critérios para considerar algo simbólico ou “literal”. Suas interpretações também tendem a ser especulativas, baseadas na identificação de eventos e figuras contemporâneas, o que historicamente levou a previsões que não se concretizaram. O sistema é dependente do dispensacionalismo, uma teologia sistematizada no século XIX. Contudo, pré-milenistas históricos também tendem a adotar uma abordagem futuristas sem utilizar esquemas dispensacionalistas.

Em síntese, a leitura futurista entende o Apocalipse como um roteiro detalhado, revelado por Deus, para o ato final da história humana — com foco no tempo futuro da tribulação e no domínio visível de Cristo sobre a Terra.

BIBLIOGRAFIA

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Grafofagia e Bibliofagia

A grafofagia (comer a escrita) e a bibliofagia (comer o livro) são práticas cultuais encontradas em diversas culturas.

O ritual da Sotah, a “mulher que se desviou”, Números 5:11-31, contém elementos dessas práticas. A “lei do ciúme” (torat haq-qena’ot) foi concebida para resolver a suspeita de adultério de uma mulher por parte de seu marido, na ausência de testemunhas. A suspeita do homem, impulsionada por um “espírito de ciúmes” (ruach qena’ot), é o ponto de partida do processo, que leva a mulher ao tabernáculo para uma ordália.

O sacerdote prepararia uma mistura de “água sagrada” em um vaso de barro e a combinaria com “pó do chão do Tabernáculo”. Em seguida, o sacerdote tomaria uma folha e escreve as maldições, ou o “juramento da maldição”, que definem as consequências físicas da culpa. A parte central do ritual consiste em “apagar” o texto na água amarga. A mulher, então, é obrigada a beber a mistura. Se for culpada, a maldição escrita e dissolvida se manifesta em seu corpo, causando o inchaço de seu ventre e a ruptura de sua coxa. Se for inocente, ela é justificada e recebe a bênção de “conceber semente”.

Outras alusões bíblicas ocorrem na comissão profética de Ezequiel (Ezequiel 2-3), e a visão apocalíptica de João na ilha de Patmos (Apocalipse 10). Em ambos, o ato implica na internalização da palavra divina como preparação e capacitação para comunicar a missão difícil e juízo divino.

Ezequiel consumiu um rolo de um livro, doce como o mel. Já João comeu um livrinho (um rolo) aberto, porém doce na boca, amargo no estômago.

O ato de dissolver e ingerir texto escrito com propósito ritualístico é amplamente atestado em outras culturas do Antigo Oriente Próximo, como no Egito Antigo. O ato de ingerir objetos ou substâncias sagradas, “hierofagia”, é um tropo comum em muitas culturas ao redor do mundo. Na medicina popular europeia, por exemplo, pequenos pedaços de papel com versículos bíblicos ou nomes de santos, conhecidos como Esszettel ou Schluckbildchen, eram ingeridos para curar doenças. A crença subjacente era que o próprio texto sagrado possuía uma agência material capaz de curar o corpo. Da mesma forma, os hieróglifos egípcios eram considerados “palavras divinas” (mdw ntrw), e as inscrições de criaturas perigosas eram deliberadamente “mutiladas” ou incompletas para neutralizar seu poder simbólico e evitar que a sua representação se tornasse uma realidade perigosa.

Federico Fliedner

Federico Fliedner Bertheau (1845 – 1901) foi um teólogo, pastor, missionário, filantropo, jornalista, editor, escritor e poeta protestante reformado, de origem alemã e naturalizado espanhol. Polímata e multifuncional, atuou para consolidar o protestantismo espanhil.

Filho do teólogo evangélico Theodor Fliedner, Federico foi pai de Jorge, Catalina e Juan Fliedner Brown, e avô de Elfriede Fliedner Klingender, sua família foi ativa em círculos protestantes avivados na Alemanha e Itália.

Nascido em Kaiserswerth, Düsseldorf, Fliedner foi educado no Gymnasium de Gütersloh. Seus estudos teológicos em Halle (1864-1866) e doutorado em Tubinga (1867) receberam influências dos teólogos August Tholuck e Johann Tobias Beck. Após uma breve experiência como professor rural em Hilden em 1868, serviu como enfermeiro na Guerra Prusso-Austríaca e fez uma viagem à Itália, onde teve contato com os valdenses.

Em março de 1869, com a promulgação da liberdade de culto na Espanha, Fliedner viajou para o país. No ano seguinte, foi ordenado pastor e enviado como missionário pela Igreja Evangélica da Alemanha, estabelecendo-se em Madrid em 9 de novembro de 1870. Ali, tornou-se capelão da legação alemã. Dedicou-se ao aprendizado do espanhol, completou o bacharelado na Espanha e estudou medicina na Universidad Central. Sua atuação religiosa começou na Igreja de Jesus, na rua Calatrava, Madrid, onde sucedeu Francisco de Paula Ruet como pastor em 1878. Em 1880, adquiriu e reconstruiu uma casa em ruínas em El Escorial, onde Filipe II havia se hospedado, transformando-a em um hospício para órfãos e uma escola, a “Casa de Paz”.

Sua dedicação à causa protestante o levou a viajar por diversas províncias, fundando escolas em cada congregação para elevar o nível cultural dos protestantes reformados espanhóis. Fliedner foi fundamental na formação da Igreja Cristã Espanhola (1872), precursora das atuais Igreja Evangélica Espanhola (IEE) e Igreja Espanhola Reformada Episcopal (IERE).

Em 1873, fundou a Librería Nacional y Extranjera, uma editora com amplo catálogo de obras literárias, livros didáticos e periódicos, incluindo El Amigo de la Infancia (1874-1939), lido por Miguel de Unamuno, e a Revista Cristiana (1880-1919), um influente periódico científico e religioso que alcançou 888 edições.

Sua prolífica produção literária incluiu biografias de John Howard, Elizabeth Fry, David Livingstone e Lutero (1878), além de seus próprios pais, Theodor Fliedner de Kaiserswerth (1883) e Carolina Fliedner de Kaiserswerth (1883). Sua autobiografia, publicada postumamente em alemão (Aus Meinem Leben, 1901-1903) e posteriormente traduzida para o espanhol na Revista Cristiana, detalha sua vida e obra. Fliedner também iniciou a tradução para o espanhol do Novo Testamento, com notas do francês Ed. Faivre, trabalho que seria completado por um de seus netos a partir da Epístola aos Hebreus.

Casado com a escocesa Juana Brown, Fliedner teve uma família numerosa. Juntos, eles desenvolveram uma escola preparatória de bacharelado. Os bons resultados dessa iniciativa os motivaram a criar um centro privado de ensino secundário, o Colegio El Porvenir de Madrid, inaugurado em 31 de outubro de 1897, no Dia da Reforma. Anexada ao colégio, foi criada a Librería Calatrava, especializada em literatura protestante.

Fliedner também foi autor de um hinário protestante reformado em espanhol para a escola dominical.

Fragmentos de Hipólito de Roma sobre Isaías

Os fragmentos de Hipólito de Roma sobre Isaías registram fontes que expandem o texto de Isaías. Talvez fossem uma midrash ou uma versão de Isaías ora desconhecida.

O escritor patrístico e bispo romano Hipólito (c.170 – c.235) utilizando uma versão grega de Isaías, cita uma versão desconhecida de Isaías. Sua abordagem interpretativa remete a elementos de midrash, uma forma de exegese que busca aprofundar o significado dos textos bíblicos por meio de interpretações alegóricas, tipológicas e homiléticas.

O primeiro fragmento, sobre Isaías 38:8, relaciona o milagre do retrocesso da sombra no reinado de Ezequias com o milagre de Josué em Josué 10:12. Hipólito argumenta que, enquanto o dia de Josué se estendeu por vinte e quatro horas, o de Ezequias durou trinta e duas, devido ao retrocesso do sol e da lua. O fragmento enfatiza a ordem cósmica preservada, evitando uma colisão entre os corpos celestes, e conecta o evento à admiração de Merodaque-Baladã, rei da Babilônia, que, como os magos do oriente, reconheceu um sinal divino.

O segundo fragmento interpreta simbolicamente o Egito como o mundo, as obras das mãos como idolatria e o tremor como subversão. Hipólito vê o Senhor, o Verbo, sobre uma nuvem luminosa, representando a encarnação de Jesus Cristo, que veio para erradicar o erro.

O terceiro fragmento detalha o cálculo das trinta e duas horas do dia de Ezequias, reiterando o retrocesso do sol por dez graus após atingir a décima hora e a subsequente conclusão de seu curso normal. Esses fragmentos revelam a abordagem alegórica e tipológica de Hipólito, integrando eventos do Antigo Testamento à sua compreensão da teologia cristã e da ordem cósmica.

Ferro

O ferro (בַּרְזֶל, barzel, em hebraico; σίδηρος, sídēros, em grego) é um metal mencionado com frequência na Bíblia, representando força, durabilidade e, por vezes, opressão.

No Antigo Testamento, o ferro aparece já em Gênesis 4:22, com Tubalcaim sendo descrito como “forjador de todo instrumento cortante de cobre e de ferro (barzel)”. O livro de Deuteronômio descreve a terra prometida como um lugar “cujas pedras são ferro (barzel)” (Deuteronômio 8:9), indicando a disponibilidade do minério. O ferro era usado para fabricar armas (1 Samuel 17:7; Jó 20:24), ferramentas (Deuteronômio 27:5; 1 Reis 6:7), carros de guerra (Josué 17:16) e instrumentos de escrita (Jó 19:24; Jeremias 17:1). Devido à sua resistência, o ferro simboliza força e poder (Daniel 2:33, 40-41; 7:7), e, por vezes, opressão e dureza (Deuteronômio 4:20; 1 Reis 8:51 – “forno de ferro” como metáfora para o Egito).

No Novo Testamento, σίδηρος (sídēros) é usado principalmente em sentido metafórico. Em Apocalipse, o ferro aparece como material de armas e instrumentos de poder (Apocalipse 2:27; 9:9; 12:5; 18:12). Em 1 Timóteo 4:2, a expressão “cauterizada a própria consciência” pode ser interpretada como uma referência ao uso do ferro em brasa para marcar escravos ou criminosos.

Assim, o ferro, na Bíblia, representa tanto um avanço tecnológico e material quanto um símbolo de força, poder, e, em alguns casos, de opressão e julgamento.