Mal olhado

Mau olhado, em hebraico עין הרע Ayin hara, e seus termos correlatos βασκανία, vaskania, ophtalmos poneros, oculus malus, fascinatio, invidia é a crença de que uma pessoa ou ser sobrenatural pode enfeitiçar ou prejudicar um indivíduo apenas olhando para ele, muitas vezes independentemente de dolo.

Essa crença comum a várias culturas e presente no mundo do Mediterrâneo, é aludida em Dt 15:7-9; 28:54-57; pv 23:6-8; 28:22; Mt 6:22-23; 20:-15; Mc 7:22; Lc 11:33-36; Gl 3:1.

Antropologia teológica

A Antropologia Teológica é um ramo da teologia sistemática que lida com temas relacionados à humanidade e sua constituição diante das coisas divinas.

A antropologia, em termos teológicos, é o ramo da teologia sistemática que explora a natureza, o propósito e a condição da humanidade em relação a Deus. Examina a compreensão teológica da humanidade como criada por Deus, caída no pecado e redimida por meio de Jesus Cristo.

O estudo da antropologia teológica emprega vários métodos e abordagens. Ele se envolve na exegese bíblica, examinando passagens que revelam percepções sobre a natureza e o propósito da humanidade. Também se baseia em tradições e ensinamentos teológicos, explorando as percepções dos teólogos ao longo da história. Além disso, incorpora a reflexão filosófica para abordar questões relacionadas à identidade humana, ao propósito e à relação entre corpo e alma.

Tópicos principais:

  • Criação e Imago Dei: investiga a doutrina da criação, afirmando que os seres humanos são criados exclusivamente por Deus à Sua imagem (imago Dei). Explora as implicações de ser feito à imagem de Deus, incluindo a dignidade humana, a responsabilidade moral e a capacidade de relacionamento com Deus e com os outros.
  • Hamartiologia: Este tópico explora os efeitos do pecado atual e original (dos pais primevos Adão e Eva) na natureza e na existência humana. Aborda conceitos de pecado original, pecado universal, pecado ancestral, inclinação para o mal, alienação de Deus e distorção das faculdades humanas.
  • Natureza Humana: examina a natureza da humanidade, incluindo a relação entre corpo e alma, o significado do gênero, os aspectos morais e racionais dos seres humanos e a tensão entre a liberdade humana e a soberania divina.
  • Redenção e Restauração: enfoca a obra redentora de Jesus Cristo e seu impacto na humanidade. Explora a doutrina da salvação, considerando temas como justificação, santificação e glorificação. Também aborda o processo de transformação espiritual e a esperança da futura ressurreição e restauração.
  • Implicações éticas: explora as responsabilidades e obrigações morais dos seres humanos à luz de seu relacionamento com Deus e com os outros. Aborda temas como justiça social, direitos humanos, ética e as implicações éticas da imago Dei nas relações humanas e estruturas sociais.
  • Esperança Escatológica: O estudo da antropologia teológica inclui a esperança de cumprimento escatológico para a humanidade. Considera o destino final do ser humano, a ressurreição do corpo e a esperança da vida eterna na comunhão com Deus.

Como subdisciplina, essa abordagem discute tópicos como:

  • Constituição ontológica do ser humano;
  • Imortalidade e atitude diante do mundo vindouro;
  • Estado intermediário;
  • A ressurreição e corporalidade;
  • A inerente bondade, maldade ou um misto dos dois;
  • O pecado original, o hybris, a expiação e redenção;
  • Livre-arbítrio e determinismo;
  • A origem do sofrimento e o propósito do mal;
  • O significado da vida ou o propósito da existência.

Constituiçao ontológica do ser humano

Diversas posturas biológicas, psicológicas, antropológicas e teológicas discutem como é constituído o ser humano:

  • Monismo imaterial ou idealismo: há somente uma realidade espiritual e o ser humano integra-a. Proposta por George Berkeley.
  • Monismo material ou fisicalismo: o ser humano é mais um animal, ainda que culturalmente complexo, com a emergência da consciência como variável de processos biológicos sem haver uma alma ou espírito imaterial. Proposta por Uriel Acosta, Marx, Nietzsche, Darwin, Spencer, Freud, L. Baker e Kevin Corcoran.
  • Monismo e teísmo naturalista: pressupõe a existência integrada do ser humano, com um componente (alma ou espírito) emergente da composição biológica. O divino age na história e na natureza de modo imanente, portanto, sem necessidades sobrenaturais de constituir a existência. A novidade dessa abordagem é a combinação de exegese bíblica com informações da antropologia e da neurociência. Seus expoentes são Henry Wheeler Robinson, Aubrey Johnson, N.T. Wright, Nancey Murphy (fisicalismo não reducível) e Joel Green, os últimos ambos ligados ao Seminário Fuller.
  • Emergentismo: sustenta que as almas são pessoais e individuais com propriedades ontologicamente distintas e irredutíveis e capacidades geradas por processos físicos e biológicos de seus corpos. Defendida por A. Peacocke, P. Clayton e T. O’Connor.
  • Monismo psicofísico: almas e corpos (pessoalidade e organismo) são aspectos correlativos de seres humanos. O seres humanos são eventos primordiais que não são nem puramente materiais nem imateriais, mas geram ambos. Postura de John Polkinghorne, Wolfhart Pannenberg e David Griffin.
  • Dualismo corpo-mente: o ser humano possui um corpo material e uma alma racional radicalmente separadas. A humanidade, em sua essência, reside na alma (a substância pensante), enquanto o corpo é sua substância extensa e substituível por recomposição (vide o Navio de Teseu). Proposta por Platão, Agostinho de Hipona, Descartes e Nicolas Malebranche.
  • Realismo hilomorfista: há somente uma substância inseparável para o ser o humano vivente, porém sob dois princípios intrínsecos: a matéria primária é potencial mas assume forma substancial atual. Para a tradição aristotélico-tomista, no geral, esses são os significados para os termos corpo e alma. O aspecto imaterial do ser humano depende do material para adquirir o conhecimento e viver nesse mundo. Proposta por Aristóteles, Duns Scotus, Avicebron e Tomás de Aquino.
  • Trialismo, tripartite ou tricotomia: distinção entre três fundamentos do ser humano: corpo, alma e espírito. Enquanto o ser humano compartilha a matéria e a vida com os animais, a consciência seria um terceiro elemento único. Por vezes, o termo alma refere-se à vida e espírito à consciência, mas há pensadores que usam esses termos de modo invertido. É uma concepção eminentemente cristã, derivada de uma leitura literal de Paulo que disse: “E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e todo o vosso espírito, e alma, e corpo, sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo“. 1 Tessalonicenses 5:23. Proposta por autores iniciais da patrística como Irineu, Melito de Sardes, Justino Mártir, Orígenes bem como por pensadores germânicos como Lutero, Kierkegaard, teólogos reformados e luteranos do século XIX.
  • Transcendentalismo ou fenomenologia: postula um espírito universal compartilhado por cada ser humano em particular. O aspecto subjetivo do ser humano o separa radicalmente dos objetos. Proposta por Immanuel Kant, Ralph Waldo Emerson e Edmund Husserl.
  • Existencialismo: a existência precede a essência. O ser humano existe no mundo e com suas escolhas se define como ser ou essência. Proposta por Heidegger, Sartre e Gabriel Marcel.
  • Estruturalismo e antropologia simbólica: a realidade humana reside em plano simbólico, boa parte inconsciente. O sentido do ser humano é relacional, principalmente moldado mediante as estruturas sociais, relações de poder e teias de símbolos. Proposta por Cassirer, Jung, Lévi-Strauss, Geertz e Michel Foucault.

Nos textos bíblicos há um conjunto de perspectivas sobre a ontologia do ser humano. O consenso entre biblistas era que antes do Exílio, os antigos hebreus eram monistas, mas depois tiveram influências dualistas persas e gregas. No Novo Testamento haveria concepções dicotomistas e tricotomistas. No entanto, pesquisas recentes revelam um cenário mais complexo, como por exemplo a Inscrição de Katumuwa indicando a crença em existência autônoma da alma separada do corpo entre povos semitas.

BIBLIOGRAFIA

Alves, Leonardo. Fundamentos da Antropologia Filosófica. Ensaios e Notas, 2019.

Cooper, John W. Body, Soul, and Life Everlasting: Biblical Anthropology
and the Monism–Dualism Debate. Grand Rapids: Eerdmans, 1989.

Steiner, Richard C. The nefesh in Israel and kindred spirits in the ancient Near East, with an appendix on the Katumuwa inscription. Ancient Near East Monographs 11. Atlanta: Society of Biblical Literature, 2015.

Erev Rav

Erev Rav era um grupo de povos diversos que se juntaram às tribos de Israel no Êxodo.

Diz em Êxodo 12:38 “E subiu também com eles uma mistura de gente, e ovelhas, e vacas, uma grande multidão de gado.” A versão ARC segue a Vulgata (vulgus promiscuum) e a Septuaginta (ἐπίμικτος) que dá uma ideia tanto de uma variedade de pessoas ou, como alguns intérpretes tardios, pessoas de origem étnicas mistas.

Seguindo esse termo da Septuaginta e Vulgata, em Números 11:4 diz que “E o vulgo, que estava no meio deles, veio a ter grande desejo; pelo que os filhos de Israel tornaram a chorar e disseram: Quem nos dará carne a comer?” Este termo “vulgo” traduz o hebraico אֲסְפְּסֻף, asafsuf, o qual só aparece nessa passagem. Algumas versões aparece como “plebe, populacho”, dando uma dimensão de classe.

O termo erev também aparece em Neemias 13:3, onde é usado para se referir a não judeus.

Uma tradição rabínica associou essa população com idolatria e imoralidade, alimentando preconceitos de segmentos de comunidades israelitas contra povos estrangeiros ou israelitas de origem mestiça.

BIBLIOGRAFIA

Brzezicka, Barbara. “The rabbles, the peoples and the crowds: a lexical study.” Praktyka Teoretyczna 36.2 (2020).

Greenwood, Daniel JH. “Partnership, Democracy, and Self-Rule in Jewish Law.” Touro L. Rev. 36 (2020): 959.

Inbari, Motti. Jewish radical ultra-orthodoxy confronts modernity, Zionism and women’s equality. Cambridge University Press, 2016.

Lee, Woo Min. “An Exilic and a Post-exilic Reading of ‘ērev rav in Exodus 12: 38: A Boundary-Making Marker for the Israelites and “Others”.” Canon&Culture 13.2 (2019): 109-137.

Magid, Shaul. “The Politics of (Un) Conversion: The” Mixed Multitude”(“‘Erev Rav”) as Conversos in Rabbi Hayyim Vital’s”‘Ets Ha-Da’at Tov”.” The Jewish Quarterly Review 95.4 (2005): 625-666.

George Saunders

George Saunders (1946-2020) foi um antropólogo conhecido por seus estudos psicológicos e etnográficos no norte da Itália.

Saunders também estudou a história da antropologia na Itália e o pentecostalismo italiano. O envolvimento de Saunders com os estudos europeus ficou evidente em seu envolvimento com a Society for the Anthropology of Europe, uma seção da American Anthropological Association que ele ajudou a fundar em 1986. Além de sua pesquisa na Itália, ele fez um trabalho com refugiados Hmong em Appleton, Wisconsin, e na Índia. Saunders foi professor de antropologia na Lawrence University por 26 anos, onde orientou e ensinou alunos. Ele foi premiado com o Young Teacher Award logo após chegar a Lawrence e passou a presidir seu departamento e foi nomeado para uma posição dotada como Henry Merritt Wriston Professor de Ciências Sociais.

Seus papéis e notas de campo foram guardados no Smithsonian National Anthropological Archives.

Em sua pesquisa etnográfica, Saunders fez trabalho de campo em duas congregações pentecostais na Toscana. Saunders explora por que algumas pessoas escolhem o cristianismo pentecostal em um contexto tão completamente dominado pelo catolicismo. O livro argumenta que o pentecostalismo constitui uma espécie de “contracultura” ou “antiestrutura” que reflete e contesta os valores centrais da cultura popular italiana. A epistemologia pentecostal é destacada, o que inclui a confiança em uma epistemologia distinta daquela das cosmovisões “científicas” e mais seculares contemporâneas. Os pentecostais “conhecem com o coração” e consideram a experiência emocional mais profunda e confiável do que o conhecimento da mente. A prática pentecostal torna a linguagem e a fala centrais para a experiência religiosa. O livro se conecta a vários gêneros e tipos de literatura, como a natureza da cultura e das contradições internas na cultura, literatura recente sobre o eu e a emoção na antropologia psicológica e trabalhos recentes sobre o Eu como uma construção cultural.

BIBLIOGRAFIA

Saunders, George. Il Linguaggio dello Spirito: Il Cuore e La Mente nel Protestantesimo Evangelico (The Language of the Spirit: Heart and Mind in Italian Evangelical Protestantism). George Saunders, trans by Adelina Talamonti into Italian. Pisa: Pacini Editore. 2010.