Extra Calvinisticum

Extra Calvinisticum é a doutrina de que o Filho eterno mantém sua existência etiam extra carnem (também além da carne) durante seu ministério terreno e perpetuamente.

Embora associada a João Calvino, aparece na literatura patrística, como na cristologia de Agostinho. A doutrina contrasta com a cristologia luterana de que Jesus Cristo é onipresente não só em sua natureza divina, mas também em sua natureza humana, por causa da comunicação de propriedades (communicatio idiomatum) entre essas duas naturezas.

Ad intra e ad extra

Em seu tratado teológico De Trinitate, Agostinho de Hipona (354-430 DC) introduziu as frases latinas “ad intra” e “ad extra” para delinear a dinâmica interna e os compromissos externos da Trindade.

“Ad intra” investiga as relações intrínsecas entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo dentro da Divindade, capturando a essência atemporal e imutável do Deus triúno. Agostinho elucidou a geração do Filho pelo Pai e a processão do Espírito Santo tanto do Pai quanto do Filho, destacando o amor, a mutualidade e a unidade.

Por outro lado, “ad extra” direciona a atenção para as atividades da Trindade no domínio externo — criação, sustento e redenção. Agostinho destacou papéis distintos dentro do plano salvífico da Divindade: o Pai como fonte, o Filho como mediador e o Espírito Santo como doador de vida e graça.

Essa distinção ad intra-ad extra provou ser fundamental na articulação coerente da Trindade por Agostinho, equilibrando a unidade e a diversidade da natureza trina de Deus. Salvaguardou a afirmação da unidade das três pessoas em essência, igualdade e eternidade, ao mesmo tempo que reconheceu os seus papéis e relacionamentos distintos, tanto dentro da Divindade como em relação ao mundo.

Enraizado numa tradição teológica que remonta a Tertuliano, Agostinho defendeu a igualdade das pessoas divinas em substância, fundamentando a sua unidade na essência divina partilhada. Esta igualdade ad intra, argumentou Agostinho, constitui a base para a sua ação inseparável ad extra. As distinções reais entre as pessoas dentro da Divindade, de acordo com Agostinho, sustentam os seus compromissos diferenciados com o mundo externo.

Para Agostinho, a doutrina do Pai, do Filho e do Espírito Santo compartilhando uma substância elimina qualquer indício de desigualdade dentro da vida divina, excluindo todas as formas de subordinação. Distinções reais entre as pessoas, firmemente fundamentadas em relações subsistentes, moldam a compreensão de Agostinho das relações ad intra da Trindade e das suas ações consequentes ad extra. Este quadro teológico, rico na exploração da dinâmica interna e externa da Trindade, continua a ser uma pedra angular no discurso teológico cristão.

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Teorias sobre a Trindade

Donum Superadditum

Donum Superadditum é a doutrina escolástica de que graça foi superacrescentada a Adão. Seria um dom gratuito de Deus que vai além dos dons naturais que acompanham a natureza humana. Um exemplo desse dom sobrenatural é a graça divina salvítica.

O primeiro homem teria recebido tal graça além de seus poderes naturais, e cuja graça foi perdida pela Queda. Na teologia escolástica de Scotus Erigena w Boaventura, a justiça original (justitia originalis) foi adicionada aos poderes naturais do homem (pura naturalia) como um donum superadditum. Já para Tomás de Aquino o homem foi criado na posse da justiça original, mas ainda assim como uma graça acrescentada aos seus poderes naturais.

Sinterese

Sinterese, Sinteresia ou sintérese (συντήρησιν) é um termo teológico para descrever um aspecto da consciência de alguém pelo qual se pode julgar o certo do errado e decidir o que constitui uma boa conduta em oposição à sineidese.

Aparece no Comentário sobre Ezequiel de Jerônimo. A sinterese seria um dos poderes da alma e é descrita como a centelha da consciência (scintilla conscientiae). O conceito de Jerônimo foi debatido por Alberto Magno e Tomás de Aquino com bases aristotélicas. Boaventura a considerou como a inclinação natural da vontade para o bem moral.

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Yetzer ha-Ra’

Vestigia Trinitatis

Vestigia Trinitatis ou Vestigia Trinitata é um conceito teológico sobre vestígios da sinais discerníveis da Trindade em toda a criação.

O conceito foi desenvolvido por Agostinho, apesar de origens em Tertuliano. Agostinho costumava usar a mente humana como exemplo. Ao contrário das ilustrações, estes sinais são considerados impressões da Trindade formadas durante o ato da criação. A Vestigia Trinitatis foi uma analogia importante para o desenvolvimento do trinitarianismo psicológico.

O conceito evoluiu ao longo da Idade Média, com Boaventura enfatizando a distinção entre os vestígios e a semelhança e imagem da Trindade. No entanto, a noção teológica enfrentou escrutínio, nomeadamente por parte de Karl Barth. Barth contestou a ideia de duas raízes de conhecimento da Trindade – uma da natureza e outra da revelação – argumentando que somente a revelação é a fonte primária. Barth afirmou que os verdadeiros traços da Trindade são encontrados na auto-revelação de Deus, desafiando a ideia de uma disposição trinitária imanente nas realidades criadas à parte da revelação. Barth enfatizou que a verdadeira compreensão da Trindade surge do ato de Deus de se manifestar de maneira humana, sustentando que a revelação é a única raiz da doutrina da Trindade.

As discussões teológicas em torno de Vestigia Trinitatis investigam a tensão entre a revelação e a ordem criada, destacando o significado da linguagem e os desafios colocados pelas tentativas de derivar a Trindade apenas da natureza. O conceito reflete debates teológicos mais amplos sobre a natureza da auto-revelação de Deus e o papel da revelação na compreensão dos mistérios da Trindade.

BIBLIOGRAFIA

Agostinho. De Trinitate. XV.46, 431.

Cunningham, David S. “Interpretation: Toward a Rehabilitation of the Vestigia Tradition,” in Knowing the Triune God: The Work of the Spirit in the Practices of the Church, ed. James J. Buckley and David S. Yeago. Grand Rapids: Eerdmans, 2001.

Hart, David B. “The Mirror of the Infinite: Gregory of Nyssa on the Vestigia Trinitatis,” Modern Theology 18 (2002): 541‐61

Leithart, Peter J. Traces of the trinity: Signs of God in creation and human experience. Brazos Press, 2015.