Teologia da Libertação

A teologia da libertação é um movimento teológico que se originou na América Latina no final do século XX.

O movimento procura trazer mudanças sociais, políticas e econômicas para os oprimidos e marginalizados por meio de uma reinterpretação da fé cristã e das Escrituras. Parte do pressuposto da opção preferencial de Deus pelos pobres e pede uma resposta profética às injustiças sistêmicas e à pobreza.

Autores católicos que foram fundamentais para o desenvolvimento da teologia da libertação incluem Gustavo Gutiérrez, Leonardo Boff e Jon Sobrino. Esses teólogos buscaram aplicar os princípios da fé católica ao contexto de pobreza, desigualdade e opressão política na América Latina. A obra seminal de Gutiérrez desafiou o entendimento tradicional da Igreja Católica como uma entidade principalmente espiritual e, em vez disso, defendeu seu papel na promoção da justiça e na libertação dos oprimidos.

Contribuidores protestantes à teologia da libertação incluiam Georges Casalis, Elsa Tamez, José Miguez Bonino, Rubem Alves, Richard Shaull, Jaime Wright, Justo Gonzalez, Dorothee Sölle, Cheryl Bridges Johns e Kjell Nordstokke.

A partir dos anos 1990 a teologia da libertação perdeu visibilidade, mas continua ativa. A intersecção do envolvimento de teólogos da libertação com outras causas (minorias, feminismo, ecologia, deficiência, dentre outros) levou também a uma dispersão do movimento. A teologia da libertação enfrentou críticas tanto da Igreja Católica quanto de facções políticas reacionárias. O Vaticano emitiu várias críticas ao movimento na década de 1980, chamando-o de marxista e acusando-o de ser mais politicamente partidário que teológico. A teologia da libertação perdeu terreno para outras teologias políticas, como o neointegralismo (ou tradicionalismo) católico, o dominionismo e neofundamentalismo protestantes. Apesar disso, a teologia da libertação continua como voz em busca justiça social e tem influenciado o discurso e a práxis teológica em todo o mundo.

BIBLIOGRAFIA

Castro, André. Uma breve história da Teologia da Libertação Protestante e suas implicações teológicas. Editora Recriar, 2022.

Ortunes, Leandro, Silvana Martinho, and Vera Chaia. “Lideranças políticas no Brasil: da Teologia da Libertação ao Neofundamentalismo.” Revista Brasileira de Ciência Política (2019): 195-232.

Padilla, C. René. “Liberation Theology is Remarkably Protestant.” Christianity Today 15: 12.

Sobrino, Jon. Jesus the Liberator: A Historical-Theological Reading of Jesus of Nazareth. Maryknoll, NY: Orbis, 2000.


Teologia do Processo

A Teologia do Processo concentra-se na relação dinâmica entre Deus e o mundo, em vez de atributos estáticos de Deus.

No teísmo do processo Deus está em um processo contínuo de auto-revelação através das interações entre Deus e o mundo. Na Teologia do Processo, Deus é visto como intimamente envolvido no mundo e sensível às necessidades e ações dos seres humanos e de todos os outros seres.

A Teologia do Processo foi desenvolvida por filósofos e teólogos no início do século XX, como Alfred North Whitehead e Charles Hartshorne. Esses filósofos tornam-se à teologia e buscaram fornecer uma compreensão mais dinâmica e contemporânea de Deus que pudesse abordar os desafios e complexidades da modernidade. Teve influências das obras de filósofos como Immanuel Kant e Henri Bergson, além de informações oriundas da física, biologia e outras ciências naturais.

Em contraste com o teísmo clássico, que enfatiza os atributos de Deus como inalteráveis e atemporais, a Teologia do Processo vê Deus como evoluindo e se adaptando à resposta do mundo em constante mudança.

Mais discutida entre círculos filosóficos que teológicos, teve como expoentes posteriores Daniel Day Williams, John B. Cobb, Eugene H. Peters. As concepções teístas neoclássicas, teísmo finito e o teísmo aberto tiveram algumas influências da teologia do processo.

BIBLIOGRAFIA

Alves, Leonardo Marcondes. “O Deus pós-moderno“. Ensaios e Notas, 2010. https://ensaiosenotas.com/2010/12/03/o-deus-pos-moderno/

Teologia de Mercersburg

Teologia de Mercersburg foi uma corrente teológica da Igreja Reformada Alemã, o equivalente reformado à tendência “High Church” do anglicanismo, com ênfases na restauração litúrgica e sacramental, bem como uma cristologia realista na Igreja.

HISTÓRIA

O nome remete a uma pequena cidade na Pensilvânia onde havia um seminário reformado alemão e o Marshall College. O movimento foi particularmente ativo entre 1836 e 1860, mas sua origem remonta à vinda da Alemanha do teólogo Frederick Rauch (1806-1841). Em 1839 foi organizada a Sociedade para a Promoção da União Cristã, tendo como vice-presidente Rauch.

Outros docentes do seminário, John Williamson Nevin (1803-1886), Philip Schaff (1819-1893) e Emanuel Vogel Gerhart (1817-1904) foram os líderes do movimento, o qual ganhou destaque com a publicação de The Anxious Bench (1843), de Nevin, que atacou os métodos os avivalistas. No ano seguinte, Schaff deu uma palestra sobre os princípios do protestantismo e criticou o mentalismo — a adesão intelectual a uma suposta ortodoxia — esposada pelos puritanos e em sua época pelos princetonianos.

A escola de Mercersburg buscou na patrística e nos reformadores reafirmar uma ortodoxia que fosse evangélica e católica. Propunham uma adesão ao catecismo de Heidelberg sem as interpretações puritanas ou do calvinismo avivalista edwardiano. Por esse motivo, consideravam a expiação como realizada pela pessoa de Cristo e não limitada à sua morte. Assim, os cristãos estão unidos ontologicamente não apenas com Jesus, mas um com os outros — visivelmente na Igreja.

Schaff, um meticuloso historiador da Igreja, instia em analizar o desenvolvimento doutrinário dentro de seus contextos históricos. Para tal, escreveu várias obras de ampla recepção, inclusive sobre a história dos credos e confissões cristãs.

Charles Hodge e a chamada Escola de Princeton fizeram frente à teologia de Mercersburg. O uso de tipologias (“cristianismo petrino”, “cristianismo joanino” e “cristianismo paulino”) dentro de um arcaboço hegeliano e a contextualização histórica das doutrinas cristãs fizeram que Hodge e os princetonianos desconfiassem da teologia de Mercersburg como se fosse mais uma vertente do racionalismo alemão. Também consideravam essa escola muito aberta às diversas denominações sem se firmaram em absolutas proposições doutrinárias. Por fim, o sensos comum realista e uma visão positivista da teologia pelos princetonianos chocava-se com a contextualização histórica do dogma pelos teólogos de Mercersburg.

TEOLOGIA

A teologia de Mercersburg é sobretudo cristológica e, especificamente, encarnacional. Um sumário dela é apresentado por G. W. Richards:

Na encarnação, o Filho de Deus assumiu a caída humana natureza, santificando-a assim em união real, orgânica e eterna com Ele próprio. A natureza humana, criada n’Ele, é o meio e a forma da revelação de Deus, de sua vontade e de todos os atos de Cristo, que, seguindo uns aos outros segundo a lei da ordem natural do ser, constituem as objetivas realidades ou fundamento da salvação cristã. A glorificada humanidade de Cristo continua a ser o único meio de comunicação graciosa de Deus para a humanidade, e de toda aproximação real do homem a Deus, e comunhão com Ele.

Richards (1940, 48).

O relacionamento salvítico com Cristo ocorre pela identidade da pessoa com a igreja de Cristo. Essa posição constratava tanto com os avivalistas quanto com o conversionismo individualista americano que ensinavam que a obra de salvação seria para o indivíduo e não para a Igreja.

A obra expiatória seria mais na plenitude da vida de Cristo. Essa soteriologia encarnacional reformada alemã de Mercerburg contrastava com os modelos puritanos, edwardianos, avivalistas e princetonianos de uma expiação centrada somente na morte de Cristo.

Em Cristo todos os homens são regenerados e unidos como membros de seu corpo, o organismo espiritual, que é a Igreja. A Igreja estende por todas as épocas e inclui todos os povos. Por isso, nenhuma fórmula doutrinária ou estrutura organizacional pode ser final. Assim, a Igreja deve modificar seus ensinamentos de acordo com seu conhecimento progressivo da verdade.

Consideravam a Igreja como uma instituição divina em oposição a uma meramente humana associação de crentes. Também enfatizavam a realidade universal (a catolicidade) da Igreja em oposição à orientação sectária e denominacional.

A vida em Cristo seria somente possível com integral comunhão da Palavra e o sacramento, administrados sob a autoridade da Igreja. Por isso, rejeitavam a premissa de “a Bíblia mais o julgamento privado” do individualismo evangélico e do realismo do senso comum da Escola de Princeton, os quais colocavam a razão individual ao patamar de avaliador da verdade. Para a escola de Mercersburgo a história da Igreja bem como os ensinamentos e sacramentos por ela administrados deveriam guiar a compreensão da fé ensinada pelas Escrituras. Esses critérios resultam da obra de Cristo presente da Igreja pelo Espírito Santo.

LEGADO

A teologia de Mercersburg fez do idealismo alemão e do hegelianismo um dinamismo realista que considerava a harmonia do crente com a Igreja e com Cristo. Essa oposição romântica ao individualismo gerou reações tanto dos avivalistas quanto do senso comum realista de Princeton. Embora nunca numericamente relevante, o legado de Mercersburg sobrevive no ecumenismo, na paleo-ortodoxia e na revalorização litúrgica.

No começo do século XX, a teologia de Mercesburg foi substituída em círculos reformados teuto-americanos pela neo-ortodoxia. Ainda assim, subsiste em um legado denominacional na Igreja Metodista Unida e na Igreja Unida de Cristo. Institucionalmente, a Merscersburg Society publica The New Mercersburg Review e realiza eventos regulares sobre essa teologia. Em 2012, Wipf e Stock começou a publicar a The Mercersburg Theology Study Series.

Em comum com o pentecostalismo, a teologia Reformada de Mercersburg possui uma interpretação da Ceia do Senhor em tensão entre o memorialismo e alguma forma de presença real.

Dada a importância dada à história da Igreja, a historiografia e a produção literalmente enciclopédica de Schaff também são legados ainda duradouros.

BIBLIOGRAFIA

Gerhart, Emanuel Vogel. Institutes of the Christian Religion. Vol. 1. Funk & Wagnalls Company, 1894.

Nevin, John Williamson. The Mystical Presence: A Vindication of the Reformed or Calvinistic Doctrine of the Holy Eucharist. JB Lippincott, 1867.

Nevin, John Williamson. History and genius of the Heidelberg catechism. German Reformed Church, 1847.

Schaff, Philip. The Principle of Protestantism as Related to the Present State of the Church. “Publication Office” of the German Reformed Church, 1845.

Fontes secundárias

Barrett, Lee C. “The Distinctive World of Mercersburg Theology: Yearning for God or Relief From Sin?.” Theology today 71.4 (2015): 381-392.

Barrett, Lee C. “Hans Lassen Martensen and the Mercersburg Theology: The Reinforcement of Christocentric Speculation.” In Transatlantic Religion, pp. 168-190. Brill, 2021.

Borneman, Adam S. Church, Sacrament, and American Democracy: The Social and Political Dimensions of John Williamson Nevin’s Theology of Incarnation. Wipf and Stock Publishers, 2011.

Bradnick, David. “What Has Mercersburg to Do with Azusa?: A Pentecostal Consideration of Nevin and Schaff.” Pneuma 38, no. 4 (2016): 411-35.

DeBie, Linden J. Speculative Theology and Common-Sense Religion: Mercersburg and the Conservative Roots of American Religion. Vol. 92. Wipf and Stock Publishers, 2008.

DiPuccio, William. The Dynamic Realism of Mercersburg theology: The romantic pursuit of the ideal in the actual. Diss. Marquette University, 1994.

Evans, William B. A Companion to the Mercersburg Theology: Evangelical Catholicism in the Mid-nineteenth Century. Vol. 44. Wipf and Stock Publishers, 2019.

Littlejohn, W. Bradford. The Mercersburg Theology and the Quest for Reformed Catholicity. Wipf and Stock Publishers, 2009.

Maxwell, Jack M. Worship and Reformed Theology: The Liturgical Lessons of Mercersburg. Vol. 10. Wipf and Stock Publishers, 1976.

Nichols, James Hastings, ed. The Mercersburg Theology. Wipf and Stock Publishers, 2004.

Nichols, James Hastings. Romanticism in American Theology: Nevin and Schaff at Mercersburg. Wipf and Stock Publishers, 2007.

Richards, George W. “The Mercersburg Theology—Its Purpose and Principles.” Church history 20.3 (1951): 42-55.

Richards, George W. “A Forgotten Theology’. Church History, 9.1 (1940):37-50 . doi:10.2307/3160807 

Yrigoyen, Charles. “Emanuel V. Gerhart: Apologist for the Mercersburg Theology.” Journal of Presbyterian History (1962-1985) 57.4 (1979): 485-500.