Gersonides

Gersonides (1288-1344) foi um filósofo, astrônomo, matemático e comentarista bíblico judeu da Idade Média, também conhecido como Levi ben Gershon ou Ralbag, acrônimo de seu nome hebraico, Rabbi Levi ben Gershon. Ele se destacou por buscar reconciliar a filosofia aristotélica com a tradição religiosa judaica.

Nascido em Bagnols-sur-Cèze, na França, Gersonides viveu em um período de efervescência intelectual no pensamento judaico. Proveniente de uma família de estudiosos, recebeu uma educação em lei judaica, filosofia e ciências.

Sua obra filosófica foi influenciada por Aristóteles, interpretado por Averróis (Ibn Rushd). Em seu trabalho principal, Milhamot HaShem (As Guerras do Senhor), explorou questões de metafísica, cosmologia, psicologia, profecia e providência divina. Gersonides defendia o papel da razão na compreensão do mundo e das verdades religiosas, argumentando que razão e revelação poderiam ser conciliadas por meio de análise cuidadosa.

Na astronomia, fez contribuições significativas, incluindo a invenção do bastão de Jacó, um instrumento de navegação, além de escrever comentários sobre o Almagesto de Ptolomeu, questionando algumas de suas teorias. Na matemática, destacou-se particularmente no campo da trigonometria.

Em termos religiosos, Gersonides propôs ideias inovadoras que geraram debates entre pensadores judeus. Argumentou pela eternidade do universo, desafiando a narrativa tradicional da criação. Para ele, a profecia era uma combinação de intelecto humano e inspiração divina, e a imortalidade da alma restringia-se à parte intelectual. Em relação ao conhecimento divino, ele sugeriu que Deus conhece os universais, mas não os eventos individuais.

Sua abordagem independente e crítica influenciou profundamente pensadores judeus posteriores, incluindo Espinosa. Gersonides é lembrado como um elo entre fé e razão, demonstrando a possibilidade de diálogo entre filosofia e religião, e deixando um legado que continua a ser estudado e debatido.

Gemistos Plethon

Georgios Gemistos Plethon (c. 1355–1450/1454), comumente conhecido como Gemistos Plethon, foi um filósofo e erudito grego durante o final da era bizantina. Nascido em Constantinopla, mais tarde se estabeleceu em Mistras, no Peloponeso, onde se tornou uma figura chave na revitalização do pensamento grego e do neoplatonismo na Europa Ocidental.

Plethon foi educado em Constantinopla e Adrianópolis. Lá, desenvolveu uma admiração por Platão, adotando o nome “Plethon”, que significa “o pleno” em referência à filosofia platônica. Sua carreira inicial incluiu papéis como professor e funcionário público, onde atuou como juiz e conselheiro dos imperadores bizantinos.

Plethon reintroduziu o pensamento platônico na Europa Ocidental, particularmente durante o Concílio de Florença (1438–1439). Lá, ele apresentou seu tratado Sobre as Diferenças Entre Aristóteles e Platão, que revitalizou o interesse pela filosofia platônica após séculos de domínio aristotélico. Em sua obra, Plethon argumenta que Platão via Deus como o criador do universo a partir de substâncias inteligíveis, mas não necessariamente do nada, enquanto Aristóteles via Deus como o motor imóvel, uma parte do universo e não como um criador. Seus ensinamentos influenciaram figuras notáveis como Cosimo de’ Medici, levando à fundação da Academia Platônica de Florença, que se tornou um centro do humanismo renascentista.

A obra filosófica mais significativa de Plethon é o Livro das Leis, que delineia uma visão para uma sociedade utópica baseada em princípios helênicos antigos e incorpora elementos de várias tradições filosóficas, incluindo estoicismo e zoroastrismo. Plethon acreditava que o universo era eterno, mas que foi criado em um ponto além do tempo, posicionando Deus como um soberano supremo e criador separado do universo pelo qual é responsável. Suas ideias sobre governança refletiam sua crença em um renascimento do Império Bizantino centrado na cultura helênica, afirmando que “somos helenos por raça e cultura”.

A influência de Plethon se estendeu além da filosofia. Introduziu a geografia de Estrabão para estudiosos ocidentais, questionando as teorias geográficas de Ptolomeu e impactando o pensamento renascentista sobre a exploração global. Sua rejeição do cristianismo em favor do paganismo antigo gerou discussões sobre seu papel na formação da identidade grega e sua visão de um futuro onde as tradições clássicas poderiam prosperar novamente. Plethon argumentou que a concepção de Deus por Platão era mais consistente com a doutrina cristã do que a de Aristóteles. Apesar de enfrentar acusações de heresia por parte da Igreja Ortodoxa, o legado de Plethon como filósofo que uniu a ciência antiga ao pensamento renascentista perdura. Frequentemente é considerado tanto “o último heleno” quanto “o primeiro grego moderno”, numa transião na história intelectual europeia.

Pierre Charron

Pierre Charron (1541-1603) foi um teólogo e filósofo católico romano francês.

As obras filosóficas de Charron, influenciadas pelo ceticismo de Michel de Montaigne, centraram-se na separação entre ética e religião, promovendo um conceito fideísta de religião que enfatizava a fé sobre a razão. Suas principais obras, como “Les Trois Vérités” e “De la sagesse”, exploraram temas de ceticismo, a incognoscibilidade de Deus através da razão e o estabelecimento de uma moralidade independente do dogma religioso.

As ideias de Charron foram controversas. Foi visto como irreligioso, enquanto outros defenderam a sua posição filosófica. Lançou as bases para teorias éticas modernas que se baseiam no caráter natural e na moralidade fora das estruturas religiosas.

Enrique Dussel

Enrique Dussel (1934-2023) foi um filósofo argentino-mexicano em diálogo com a teologia da libertação.

Nascido em Mendoza, Argentina, Dussel refugiou-se no México em 1975, onde receberia cidadania mexicana. Dussel alcançou reconhecimento internacional por suas contribuições à Ética, à Filosofia Política e ao Pensamento Latino-Americano, particularmente como um dos fundadores da Filosofia da Libertação.

Graduou-se com um diploma de filosofia em 1957, estudos religiosos em 1965 e doutorado em filosofia e história em 1959 e 1967, respectivamente. Ocupou cargos acadêmicos no México, incluindo lecionar ética e filosofia política na UNAM e ser professor pesquisador na UAM Iztapalapa. Foi reitor interino da Universidade Autônoma da Cidade do México (UACM).

A filosofia de libertação de Dussel emergiu das periferias geopolíticas, culturais e económicas do Sul Global, com o objectivo de desafiar os sistemas fechados e o eurocentrismo, dando voz aos marginalizados.

Francisco Suarez

Francisco Suarez (1548-1617), muitas vezes referido como “Doutor Eximius”, foi um teólogo e filósofo jesuíta do final do Renascimento e do início do período barroco.

Suarez, expoenta da Escola de Salamanca, influenciou o desenvolvimento da segunda escolástica. A obra de Suárez marcou uma transição do pensamento escolástico renascentista para o barroco, um marco na filosofia católica.

Seu tratado sistemático de metafísica, intitulado “Disputationes Metaphysicae” (1597) construiu sobre os fundamentos lançados por Aristóteles e Tomás de Aquino. Suárez introduziu várias ideias distintas, incluindo a rejeição da distinção real entre essência e existência, a negação do princípio de individuação pela pura potencialidade da matéria e o conceito de que qualquer entidade é um princípio de individuação em si.

Em sua obra “De Legibus”, Suárez desenvolveu uma teoria volitiva do direito natural. Argumentou que a lei natural representa a Vontade de Deus, enquanto a lei humana reflete a vontade dos humanos. Segundo Suárez, essas duas esferas do direito devem ser harmonizadas para estabelecer a justiça. Assim, seus argumentos de defesa do direito natural alcança inclusive povos não cristãos, como era a questão sobre o direito dos indígenas americanos.

O fundamento da ética estaria na natureza humana, chegando ao ponto de propor que a ordem natural seria válida mesmo na hipotética ausência de Deus.

Apesar de fundamentar-se em Aquino e Aristóteles, pode-se dizer que Suárez fundou sua própria escola filosófica, o Suarismo ou Suarezianismo. Esta escola enfatizou princípios como a individuação pela própria entidade concreta dos seres, uma distinção rationis ratiocinatae entre a essência e a existência dos seres criados e a possibilidade de as substâncias espirituais serem numericamente distintas.

A obra metafísica de Francisco Suárez representou uma síntese do pensamento medieval, incorporando o tomismo, o escotismo e o nominalismo. O legado de Suárez inclui suas contribuições para a metafísica, a teoria do direito natural e a ética.