João Ferreira de Almeida

João Ferreira Annes d’Almeida ou João Ferreira de Almeida (1628 -1691) foi um ministro pregador da Igreja Reformada nas Índias Orientais Holandesas e tradutor da Bíblia ao português.

VIDA

Originário de Torre de Tavares, Várzea de Tavares, concelho de Mangualde, Portugal, não sabe muitos detalhes sobre o início de sua vida. Ao longo da vida ganhou diversos graus de proficiência do latim, grego, italiano, espanhol, francês e holandês.

Em 1642, aos quatorze anos de idade, João Ferreira de Almeida estava na Ásia e converteu-se ao protestantismo ao ler um panfleto em espanhol. No ano anterior, forças holandesas tinham conquistado várias colônias portuguesas na Ásia.

Em 1645 traduziu Novo Testamento para o português a partir do latim da versão de Teodoro de Beza, consultando versões em castelhano, francês e italiano. Essa tradução circulou manuscrita e nunca foi impressa.

Em 1654 fez uma nova tradução do Novo Testamento, solicitada pela Igreja Reformada no Ceilão. Em 1676, já em Jacarta, terminou sua terceira revisão.

É posto no ministério de consolador ou visitador (referido com o título de “padre”) da Igreja Reformada. Exerceu seu ministério em Malaca, no Sul da Índia, em Ceilão e em Batávia, atual Jacarta.

Em 1681 saiu a primeira edição impressa do Novo Testamento. Foi revisada pelo holandês-brasileiro Bartholomeus Heynen e o holandês Joannes de Vooght. É possível um terceiro revisor anônimo, um judeu convertido. No entanto, veio com vários erros editoriais. As autoridades holandesas decretaram seu recolhimento. Almeida anotou uma revisão em um exemplar, hoje guardado na Biblioteca Nacional em Lisboa. Ainda há nessa mesma biblioteca outro exemplar dessa edição. Já na Biblioteca Real de Haia e a British Library guardam outros dois exemplares sobreviventes.

A segunda edição do Novo Testamento em português, revista pouco antes da morte de Almeida, veio a ser publicada postumamente em 1693. Teria sido revista por Jacobus op den Akker e Theodorus Zas, ambos ministros formados em teologia em Utrecht.

A Society for Promoting Christian Knowledge, de Londres, financiou a terceira edição do Novo Testamento de Almeida, em 1711, publicada em Amsterdam.

Ao morrer, Almeida tinha traduzido o Antigo Testamento até o livro de Ezequiel 48:21. Em 1694, Jacobus op den Akker, que era pastor da Igreja Reformada Holandesa, retomou o trabalho e terminou o Antigo Testamento.

O Antigo Testamento foi publicado em Tranquebar de forma seriada: iniciou em 1719 (Pentateuco), 1732 (Profetas Menores), 1738 (Livros Históricos), 1740 (Salmos), 1744 (Jó a Eclesiastes), 1751 (Profeta Maiores, com tradução de Daniel pelo missionário Christóvão Theodosio Walther) e 1757 (Pentateuco). Paralelamente, foi publicada em dois volumes na Batávia, entre 1748 (Gn-Ester) e 1753 (Sal-Malaquias).

Em 1712 a missão luterana de Tranquebar reimprimiu a edição de 1681. A primeira edição revista substancialmente do Novo Testamento, feita em Tranquebar, apareceu em 1760 (quatro evangelhos) e 1765 (resto do Novo Testamento). A primeira edição da Bíblia completa, apenas em 1819 pela gráfica de R.E. A. Taylor em Londres, sob encomenda da Sociedade Bíblica Britânica e Estrangeira.

O PROCESSO DE TRADUÇÃO

Para o Antigo Testamento Almeida não traduziu diretamente do hebraico, mas de outras versões. Teria utilizado como base principal versão espanhola de de Cypriano de Valera de 1602 (a Biblia del Cántaro), a qual tinha sido a Bíblia del Oso (de Casiodoro de Reina) revisada com base na Bíblia de Ferrara e na versão de Pagnino. Outra fonte teria sido a Bíblia Diodati em italiano e a Olivetan em francês. Como controle, também empregou a versão holandesa Statenvertaling (1637), cujos autores reivindicaram ser a mais fiel tradução em línguas vernáculas da era da Reforma. Hoje é consenso que Almeida não se baseou na Vulgata (Fernandes 2021). É provável que tenha tido contato com a Bíblia Poliglota de Antuérpia (1572) de Benito Arias Montano e a versão latina de Sancte Pagnino.

A tradução do Novo Testamento começou a partir do espanhol. Consultou a versão latina de Teodoro de Beza, com auxílio de versões em espanhol, francês e italiano. Para a base grega, certamente a versão empregada foi o Textus Receptus de Jan Jansson, impresso em Amsterdam em 1639. (Cavalcante Filho, 2013). Teria também tido acesso a edições de Beza, Roberto e Henricus Stephanus, e Elzevier 1641.

Além da Bíblia também escreveu alguns panfletos: Diferença da Cristandade (1668); Duas Epístolas e Vinte Propostas (1672); um Apêndice à Diferença da Cristandade (1673); Diálogo Rústico e Pastoril (1680).

O biblista Herculano Alves chama Almeida de o autor de língua portuguesa que mais vendeu. No esteio de sua versão, várias revisões levam seu nome.

BIBLIOGRAFIA

Alves, Herculano. A Bíblia de João Ferreira Annes d’Almeida. Coimbra: Sociedade Bíblica de Portugal, Sociedade Bíblica do Brasil, Difusora Bíblica, 2006.

Cavalcante Filho, Jairo Paes. “O método de tradução de João Ferreira de Almeida: O caso do Evangelho de Mateus.” Mestrado em Ciências da Religião. Universidade Metodista de São Paulo, 2013.

Fernandes, Luis Henrique M. “Diferença da Cristandade: a controvérsia religiosa nas Índias Orientais holandesas e o significado histórico da primeira tradução da Bíblia em português (1642-1694)”. Tese de Doutorado em História Social, USP, 2016.

Fernandes, Luis Henrique Menezes. “As fontes textuais da Bíblia Almeida: Sistematização e esquadrinhamento do status quaestionis.” REVER: Revista de Estudos da Religião 21.2 (2021): 45-61.

Versões coptas

As versões coptas da Bíblia feitas no conjunto de dialetos egípcios pós-helenistas figuram, talvez, entre as primeiras a serem traduzidas.

A língua copta é derivada do egípcio antigo. Durante o período helenístico começou-se a utilizar o alfabeto unical grego, mais sete caracteres retirados do demótico egípcio. Como língua corrente, foi a língua majoritária do Egito até o final do primeiro milênio d.C., quando gradativamente foi suplantada pelo árabe. No século XVII deixou de ser falada no cotidiano, mas permaneceu como língua litúrgica dos cristãos coptas.

Tanto o Antigo e o Novo Testamento foram traduzidos para cinco dos dialetos do copta: boárico (norte), faiúmico, saídico (sul), acmímico e mesoquêmico (meio do Egito). Quase em sua totalidade foram utilizados papiros.

São testemunhas importantes para a história textual. O cânon é semelhante às outras grandes versões, mas a ordem dos livros diferem em alguns casos.

A ordem dos livros no cânon boárico são evangelhos (João, Mateus, Marcos, Lucas), epístolas paulinas (Hebreus entre 2 Tessalonicenses e 1 Timóteo), epístolas católicas, Atos e Apocalipse (embora o Apocalipse conste em relativamente poucos manuscritos).

As versões em saídico são evangelhos (João, Mateus, Marcos, Lucas), epístolas paulinas (Hebreus entre 2 Coríntios e Gálatas), epístolas católicas, Atos e Apocalipse.

Versões hebraicas do Novo Testamento

Apesar de raras, traduções do Novo Testamento para o hebraico surgiram por vários motivos. Originalmente feitas para fins privados, polêmicos ou servindo conversos, o Novo Testamento foi traduzido do grego, latim ou outras línguas para o hebraico.

Traduções de Mateus. Há pelo menos 50 versões do Evangelho de Mateus para o hebraico. A maioria datam do Renascimento em diante.

Mateus de Du Tillet. Heb.MSS.132 da Biblioteca Nacional, em Paris. Contém reminiscências de uma antiga versão hebraica, talvez remontando da Antiguidade Tardia. O manuscrito foi obtido pelo bispo Jean du Tillet dos judeus italianos em uma visita a Roma em 1553, e publicado em 1555.

Sefer Nestor ha-Komer . “O Livro de Nestor, o Sacerdote”, século VII. Contém citações significativas de Mateus, aparentemente de um texto latino.

Toledot Yeshu. “Vida de Jesus”, século VII. Uma paráfrase polêmica.

Mateus de Shem Tov ben Isaac ben Shaprut. Feita em Aragão em 1385.

Mateus de Sebastian Münster, 1537, versão impressa do Evangelho de Mateus, dedicado ao rei Henrique VIII da Inglaterra.

Mateus de Ezekiel Rahabi, Friedrich Albert Christian e Leopold Immanuel Jacob van Dort , 1741-1756. Edição hoje perdida.

Travancore Hebrew New Testament of Rabbi Ezekiel. Um exemplar comprado por Claudius Buchanan em Cochim, Índia.

Mateus de Elias Soloweyczyk, 1869.

Epístolas aos Hebreus de Alfonso de Zamora (1526).

Bíblia dodecaglota de Hütter. O Novo Testamento completo publicado por Elias Hütter, em sua edição poliglota em doze idiomas. Feita em Nuremberg, em 1599, 1600, em dois volumes.

A partir do século XIX surgiram várias edições completas do Novo Testamento em hebraico, boa parte publicadas pelas sociedades bíblicas e traduzidas diretamente do grego.

Vulgata

A Vulgata é a versão da Bíblia latina, revisada ou traduzida do hebraico e do grego por Jerônimo, identificada pela sigla Vg.

Em 382, ​​o papa Dâmaso encomendou a Jerônimo que produzisse uma tradução latina aceitável da Bíblia a partir das várias traduções divergentes (a Vetus Latina ou Ítala).

Exímio latinista e estudioso bíblico, Jerônimo contou com a ajuda de mulheres eruditas como Marcela e Paula. Além disso, viajou, discutiu e aprendeu as línguas semíticas enquanto vivia no Levante, onde se estabeleceu em Belém. Sua versão dos Evangelhos foi entregue ao papa em 384. Usando a versão grega da Septuaginta do Antigo Testamento, ele produziu novas traduções latinas dos Salmos, o Livro de Jó e alguns outros livros. Entretanto, decidiu que a Septuaginta era insatisfatória e começou a traduzir todo o Antigo Testamento a partir uma versão hebraica hoje perdida. No Novo Testamento traduziu os evangelhos enquanto replicou os outors livros a partir da Ítala. Finalizou a Biblia toda por volta do ano 405.

Escreveria ainda anotações e introduções dos livros da Bíblia, a qual seria uma das primeiras edições a contar com um aparato filológico e exegético.

A vulgata levaria tempo para ter aceitação. O próprio antigo saltério latino revisado por Jerônimo continuou a ter maior aceitação. Na baixa idade média a Vulgata ganharia a preferência dos eruditos e no uso litúrgico ocidental.

No Renascimento e Reforma surgiram várias edições e reviões. A revisão Sixto-Clementina seria adotada como a versão oficial para a Igreja Católica a partir do Concílio de Trento. Em 1979 foi lançada uma nova revisão, a Nova Vulgata.

A vulgata é uma obra singular por vários motivos. Seria a primeira tradução feita praticamente por um único indivíduo, o qual era consciente dos problemas exegéticos e de teoria da tradução. Também seria a primeira versão feita em um só processo editorial a reunir todo o cânon que, mais tarde, seria juntado em um só volume de livro.