Antilegomena, do grego ἀντιλεγόμενα, “falado contra” ou “controverso”, são escritos cuja autenticidade ou valor canônico foram contestado na história da Igreja.
Eusébio propôs uma classificação tríplice para os livros tidos como escrituras. Os homologoumenas seriam os livros aceitos por todos. Os apócrifos seriam os livros heréticos ou espúrios a serem rejeitados. Por fim, os antilegômenas seriam os livros disputados no cânon do Novo Testamento. Entre eles estavam Tiago, Judas, 2 Pedro, 2 João, 3 João, Apocalipse de João, Hebreus, Apocalipse de Pedro, Atos de Paulo, Pastor de Hermas, a Epístola de Barnabé e a Didaquê.
Similar classificação tripla de autoridade foi empregada pelos bispos Julino Africano e Teodoro de Mopsuéstia, demonstrando que era essa a noção de canonicidade tanto no oriente quanto no ocidente nos meados do primeiro milênio. Mais tarde, no cristianismo ocidental desenvolveu-se o conceito de cânon como algo “ou tudo ou nada” enquanto no cristianismo oriental a canonicidade passou a ser primordialmente funcional. Os livros homolougoumenas são aqueles utilizados em culto e dos quais se pode fundamentar doutrina, devoção e guia para a Igreja. Sem seguida, há uma categoria de livros para devoção privada, mas não para uso na Igreja ou com uso limitado, como é o caso do Apocalipse de João na Igreja Ortodoxa Russa.
No cristianismo siríaco a antilegômena compreende 2 Pedro, 2 e 3 João, Judas e Apocalipse, livros ausentes em muitos manuscritos da Peshitta. Gradativamente esses livros passaram a ter aceitação nas igrejas siríacas somente a partir da adoção de edições impressas.
Com a difusão da imprensa e a Reforma, a questão da canonicidade voltou. Por exemplo, a antilegômena luterana. No início da Reforma, biblistas como Erasmo, Lefèvre d’Étaples, Lutero, Carlstadt, Chemnitz, Flácio e Cardeal Cajetano discutiram a canonicidade de vários escritos.
Na antilegômena da Bíblia de Lutero foi impressa em anexo os livros de Hebreus, Tiago, Judas, 2 Pedro, 2 e 3 João, Apocalipse de João. Eventualmente, esses livros continuaram a fazer parte do cânone luterano, sendo citados como autoridade em teologia acadêmica, devocional e eclesiástica. No entanto, Martin Chemnitz insistia que a antilegômena não poderia ser empregada para avaliar doutrina, uma política seguida entre várias comunidades luteranas conservadoras, como fez até recentemente o Sínodo de Wisconsin.
Em estudos recentes antilegômena, por vezes, aparece para compreender os escritos paulinos disputados: 2 Tessalonicenses, Colossenses, Efésios e as Epístolas Pastorais — 1 e 2 Timóteo e Tito.
A antilegômena não deve ser interpretada como “falsa” ou “herética”. O conceito indica que houve desacordo na Igreja sobre se a textos mereciam ou não status canônico, bem como qual autoridade atribuir ao texto (uso litúrgico, doutrinário, devocional, histórico).
Antilegômena não se confunde com os conceitos de deuterocanônico, apócrifo ou cânon amplo.
BIBLIOGRAFIA
Birner, Benjamin J. “The Proper Distinction Between Antilegomena and Homologoumena: Its History and Application.” MDiv, Wisconsin Lutheran Seminary, 2019.
Bovon, François. “Beyond the Canonical and the Apocryphal Books, the Presence of a Third Category: The Books Useful for the Soul.” Harvard theological review 105.2 (2012): 125-137.
Hall, Isaac Hollister. “A Syriac Manuscript with the Antilegomena Epistles.” Journal of the Society of Biblical Literature and Exegesis 4.1/2 (1884): 37-49.
Lester, Hiram J. Relative clauses in the Pauline homologoumena and antilegomena. Yale University, 1973.
Uma consideração sobre “Antilegômena”