Zebedeu

Zebedeu é mencionado no Novo Testamento como o pai de Tiago e João, dois dos discípulos mais próximos de Jesus. Ele era pescador e vivia na Galileia, possivelmente em Betsaida ou Cafarnaum, conforme indicado nos evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas. Sua profissão de pescador, com barcos e empregados, sugere que ele tinha uma posição econômica considerável para a época, conforme relatado em Marcos 1:20 e Lucas 5:4.

Zebedeu era casado com Salomé, que é mencionada nos evangelhos como uma das mulheres que seguiam Jesus, estando presente em momentos importantes, como a crucificação (Mateus 27:56; Marcos 15:40). Juntos, eles tiveram dois filhos, Tiago e João, que mais tarde se tornaram discípulos de Jesus.

O chamado de Tiago e João para seguir Jesus é registrado em Mateus 4:21-22. Ambos estavam em um barco, consertando as redes, quando Jesus os chamou. A disposição imediata dos filhos em deixar o barco e seguir o mestre sugere que Zebedeu possivelmente apoiava essa decisão, embora ele não tenha sido diretamente mencionado como parte da cena.

A presença de Zebedeu na narrativa evangélica também indica que ele possuía certa influência social. Um exemplo disso é a menção de que João, seu filho, era conhecido do sumo sacerdote, conforme o evangelho de João 18:16, o que pode ser atribuído à posição social de Zebedeu na comunidade.

Abandono de Jesus na cruz

Abandono de Jesus na cruz é o termo dado ao relato de desespero registrado nos evangelhos de Mateus e Marcos. Os versículos em questão, Mateus 27:46 e Marcos 15:34, registram o clamor comovente de Jesus (“E, perto da hora nona, exclamou Jesus em alta voz, dizendo: Eli, Eli, lemá sabactâni, isto é, Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?” “E, à hora nona, Jesus exclamou com grande voz, dizendo: Eloí, Eloí, lemá sabactâni? Isso, traduzido, é: Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”)Este clamor gerou discussões e interpretações teológicas ao longo dos séculos.

Este lamento não é uma expressão direta, mas uma citação do início do Salmo 22. A expressão poética,atribuída a Davi, em salmo que, no seu conjunto, transmite uma profunda confiança em Deus e uma certeza de que a assistência e a vitória divinas estão asseguradas. Portanto, interpretar o grito de Jesus como um sinal de abandono literal é desafiado pelo tema abrangente da confiança encontrado no Salmo 22.

O silêncio de Jesus na cruz em relação a muitos dos seus próprios sofrimentos contrasta com a sua articulação da sede (João 19:28) e o subsequente uso do Salmo 22. Ao fazê-lo, Jesus invoca o salmo para vindicar que os sofrimentos e as indignidades profetizados pelos profetas cumprem-se precisamente nele, o verdadeiro Messias.

Os Evangelhos Sinópticos apresentam variações no retrato dos momentos finais de Jesus. Mateus e Marcos enfatizam um grito de aparente desespero, em uma versão aramaica seguida de tradução, enquanto Lucas registra uma declaração mais serena: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito” (Lucas 23:46). João retrata a morte de Jesus com um ar de calma. Estas diferenças nos relatos dos Evangelhos levantam questões sobre a exatidão histórica e as implicações teológicas das últimas palavras de Jesus.

Tersorium

Tersorium ou xylospongium seria uma vara com uma esponja utilizada para limpeza. Seria a antecessora de escovas de limpeza e vassoras.

Uma menção por Sêneca (Epistulae morales 8. 70.20) associa o tersorium a limpeza do corpo após defecar. Segundo Sêneca, um gladiador germânico cometeu suicídio em um anfiteatro enfiando uma esponja em sua garganta após defecar entre gregos e romanos. Apesar disso, não há explicação explícita de seu uso. É inferido que seria para limpar as nádegas, embora tal interpretação seja disputada (Wiplinger 2012).

Alguns intérpretes associaram o termo com Marcos 15:36; Lucas 23:36; João 19:28-30 quando deram vinagre a Jesus crucificado. Embora seja uma interpretação possível, não há dados que corroborem tal identificação.

A palavra grega traduzida como “vinagre” na ARC é oxos, vinho ácido ou vinagre. A LXX usa o termo em Números 6:3 e Rute 2:14 como bebida com a qual o povo simples saciava sua sede. Tal perícope seria uma alusão ao Salmo 69:21.

BIBLIOGRAFIA

Gilbert Wiplinger: Der Gebrauch des Xylospongiums – eine neue Theorie zu den hygienischen Verhältnissen in römischen Latrinen. In: SPA . SANITAS PER AQUAM. Tagungsband des Internationalen Frontinus-Symposiums zur Technik – und Kulturgeschichte der antiken Thermen Aachen, 18. – 22. März 2009. Frontinus-Gesellschaft e.V. & Peeters, Leiden 2012

Aramaico

O aramaico ou o aramaeu não é um só idioma, mas um conjunto de dialetos e línguas semíticas do noroeste da atual Síria em diferentes fases históricas que emergiram provavelmente por volta do século XII a.C., com abundância de inscrições distintivamente em aramaico aparecendo a partir do século VIII a.C.

No século VIII vários prisoneiros arameus ou sírios foram transportados para a Assíria, iniciando a adoção de seus idiomas por seus senhores. O comércio e os imperialismos assírio e babilônico propagaram a língua entre os povos cativos, mas seu uso na administração pública persa disseminou-a desde o sul do Egito até o Afeganistão, com inscrições encontradas até em Sardes (na Anatólia). Depois do exílio babilônico, o aramaico gradativamente substituiu o hebraico como língua corrente dos israelitas (Ne 13:24).
 
No período helenista dividiram-se os dialetos aramaicos ocidentais e os dialetos orientais. Essa divisão persiste até hoje, não sendo mutuamente compreensíveis. Por um mais de um milênio foi a língua internacional do Oriente Médio, até ser suplantada pelo árabe.

Atualmente, mais de 1 milhão de pessoas possuem algum domínio do aramaico nas seguintes variantes:

  • O siríaco é falado em várias comunidades no nordeste da Síria, no Iraque, no Irã, na Geórgia, bem como língua litúrgica de várias igrejas cristãs. Sobrevive nas diáspora assírias, siríacas e caldeias especialmente nos Estados Unidos e mesmo no Brasil.
  • O judeu-aramaico serviu para a composição do Talmud e de textos litúrgicos, sendo falado ainda hoje por judeus curdos.
  • O mandaico é uma variante aramaica falada pelos mandeus, seguidores de João Batista nativos do Iraque.
  • O neo-aramaico ocidental é usado em três aldeias próximas a Damasco.

As línguas aramaicas são semelhantes mas não inteligíveis com o hebraico. (Cf. 2 Re 18:26; Is 36:11). As duas línguas seriam tão compreensíveis como o italiano para um falante do português.

A escrita aramaica, uma adaptação do alfabeto cananeu ou fenício, foi adotada por muitos outros povos, inclusive os judeus, sendo chamado de escrita quadrada ou assurith. A escrita aramaica ainda influenciaria as escritas siríacas, árabe, persa pahlavi, o mongol, as escritas da Índia e do sudeste asiático.

No período do Novo Testamento o aramaico estava tão enraizado na cultura israelita que comumente essa língua era chamada de língua dos hebreus ou de hebraico. Nesse sentido aparece em Jo 5:2; 19:13, 17, 20; 20:16; At 21:40; 22:2; 26:14; Ap 9:1. E mesmo fora da Bíblia, em autores como Flávio Josefo (Antiguidades Judaicas. 3.10.6 e Guerra dos Judeus 7. 2.1) refere ao aramaico intercambiavelmente como a língua dos judeus.

ARAMAICO E A BÍBLIA

Algumas palavras no Novo Testamento não são possíveis de distinguir se são aramaicas ou do hebraico tardio: Mamon, Bartolomeu, Barrabás, Boanerges, Getsemane, Gólgota.

Há cerca de 280 versículos com trechos escritos em aramaico tanto no Antigo quanto no Novo Testamento.

Trechos em aramaico no Antigo Testamento:

  • Na fala de Labão (Gn 31:47).
  • Na advertência de Jeremias (Jr 10:11).
  • Em porções do livro de Daniel (Dn 2:4-7:28).
  • Em porções do livro de Esdras (Ed 4:8-6:18; 7:12-26).

Trechos em aramaico no Novo Testamento

  • Talita cumi “menina, levanta-te!” (Mc 5:41)
  • Efatá “abre-a!.” (Mc 7:34)
  • Aba “Pai ou papai” (Mc 14:36; Gl 4:6; Rm 8:15)
  • Raca “tolo” (Mc 5:22)
  • Raboni “meu mestre” (Jo 20:16)
  • Eli Eli lema sabactani “Deus meu, Deus meu, não me desampare” (Mt 27:46; Mc 15:34)
  • Osanna “Oh, Salva-nos.” (Mc 11:9)
  • Maranata “Vem, Senhor!” (1 Co 16:22)
  • Tabita: “Gazela” (At 9:36)

O aramaico é a base de várias versões da Bíblia:

  • Targum: traduções do Antigo Testamento, produzidas quando o hebraico deixava de ser compreendido pelos judeus.
  • Diatessaron: uma harmonia dos evangelhos feita por Taciano no século II.
  • Vetus Syra: versão antiguíssima do Novo Testamento. Consiste nas Versão reconstruída dos Atos (Conybeare), Versão reconstruída das epístolas paulinas (Molitor), Versão do Siríaca do Sinai, Versão de Curton.
  • Peshitta: tradução da Bíblia completa iniciada no século II e se tornou a versão padrão para os cristãos do oriente.
  • Syro-Hexapla: uma versão feita em Alexandria no século VII com base na Hexapla de Orígenes.
  • Siríaca Filoxeniana é uma recensão encomendada por Filoxeno de Mabbug e completada em 508 por seu corepíscopo Policarpo.
  • Siríaca Harcleana uma recensão por Tomás de Harqel concluída em 616 dC em Enaton no Egito.
  • Lecionários Cristãos Palestianianos: trechos da Bíblia em aramaico ocidental para uso no culto na Idade Média.

O aramaico é importante para conhecer melhor o hebraico bíblico e o contexto histórico da Antiguidade. Vários documentos (Visão de Balaão, Documentos de Elefantina, Documento Driver) e escritos parabíblicos (pseudo-epígrafas, Manuscritos de Qumran) foram escritos nessa língua.

No século IX d.C. o gramático Judah ben Quraysh formulou a hipótese de que Terá, pai de Abraão, falasse aramaico e fosse a língua ancestral da qual emergiram o árabe e o hebraico. No século XIX houve quem pensasse que a língua dos patriarcas fosse o aramaico com base, entre outros, em Dt 26:5. No entanto, tais teorias são hoje desconsideradas. Outra teoria marginal que envolve o aramaico é a hipótese de que grande parte do Novo Testamento ou as falas de Jesus terian sido compostos originalmente em aramaico. Contudo, várias análises linguísticas e evidências externas confirmam que a forma canônica dos livros do Novo Testamento foi escrita em grego koiné.

Em 1845 o biblista rabino Abraham Geiger formulou a hipótese de que o aramaico seria a língua nativa da Palestina do período do 2º Templo e seria a primeira língua de Jesus. Todavia, as citações em aramaico nos evangelhos não são conclusivas para determinar qual seria a língua materna de Jesus. As amostras da língua no Novo Testamento poderiam ser as ocasiões excepcionais em que Jesus estava falando a língua de seus interlocutores, como nos trechos em aramaico no Antigo Testamento ou exemplos de diglossia. Hoje, evidências históricas, literárias e arqueológicas apontam para um cenário linguístico mais pluralístico, com o grego e o aramaico sendo as línguas primárias da população da Palestina, sem excluir os usos minoritários do latim e do hebraico.

SAIBA MAIS

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