Nouvelle théologie

A Nouvelle Théologie (francês para “Nova Teologia”) foi um movimento dentro da teologia católica romana que surgiu em meados do século XX.

Também chamado de teologia de “Ressourcement”, procurou reexaminar e reinterpretar os ensinamentos católicos tradicionais à luz dos desenvolvimentos filosóficos e teológicos modernos. Contudo, também defendeu uma renovação da teologia católica por meio de um retorno às suas fontes. Remontando aos Padres da Igreja e aos primeiros teólogos medievais, estes teólogos chegaram a uma ‘ontologia sacramental’, uma maneira sacramental de ver a realidade, com a qual rejeitavam a estrita divisão entre Deus e homem, ‘sobrenatural’ e ‘natureza ordinária ‘.

Como uma reação ao tomismo dominante no ensino católico, o movimento foi particularmente ativo nos anos anteriores e posteriores ao Concílio Vaticano II (1962-1965).

Uma das principais características da Nouvelle Théologie era sua ênfase no retorno às fontes da teologia cristã, particularmente os escritos dos primeiros Padres da Igreja. Os teólogos associados a esse movimento buscaram se envolver com a tradição patrística, explorando a riqueza do pensamento cristão primitivo e colocando-o em diálogo com questões teológicas contemporâneas.

Alguns dos principais pensadores associados à Nouvelle Théologie incluem:

  1. Henri de Lubac (1896-1991): foi uma das principais figuras do movimento. Suas obras, como “Catolicismo: Cristo e o Destino Comum do Homem” e “O Mistério do Sobrenatural”, enfatizavam a relação entre natureza e graça e a importância do sobrenatural na vida cristã.
  2. Jean Daniélou (1905-1974): concentrou-se na Igreja primitiva e na teologia patrística. Suas obras exploraram os sacramentos, a cristologia e a teologia da história.
  3. Yves Congar (1904-1995): enfatizou a importância do ecumenismo e o papel dos leigos na Igreja. Seus escritos ajudaram a moldar a compreensão da Igreja e sua missão no mundo moderno.
  4. Marie-Dominique Chenu (1895-1990): um dominicano, defendeu uma renovação da teologia por meio de um envolvimento mais profundo com a filosofia e a cultura. Enfatizou o contexto histórico do desenvolvimento teológico e a importância da justiça social.
  5. Joseph Ratzinger ou papa Bento XVI: também é contado entre os membros do movimento devido seu escopo, métodos e objetos de pesquisa.

A Nouvelle Théologie diferia de outras teologias católicas romanas de várias maneiras:

  1. Retorno às fontes: O movimento enfatizou um retorno às fontes patrísticas da teologia cristã, buscando inspiração nos primeiros escritos cristãos, em vez de confiar apenas na escolástica medieval.
  2. Abordagem existencial e personalista: A Nouvelle Théologie enfatizou as dimensões existencial e pessoal da fé, reconhecendo a importância da experiência humana e do encontro com Deus na reflexão teológica.
  3. Diálogo com a Modernidade: O movimento buscou se engajar com as correntes filosóficas e teológicas modernas, como o existencialismo, a fenomenologia e os métodos histórico-críticos, a fim de enfrentar os desafios contemporâneos e dialogar com o mundo moderno.
  4. Ênfase no mistério e na graça: A Nouvelle Théologie enfatizou o mistério de Deus e a importância da graça na vida da Igreja e dos crentes individuais. Procurou recuperar um sentido do sobrenatural na teologia católica.

É importante notar que a Nouvelle Théologie não foi um movimento unificado e homogêneo, e seus pensadores sustentaram diversas perspectivas e enfatizaram diferentes aspectos da renovação teológica. No entanto, eles compartilharam um compromisso comum de revigorar a teologia católica por meio de um novo compromisso com as fontes da fé e um diálogo com o mundo contemporâneo.

Teologia relacional

A teologia relacional é um movimento teológico e filosófico que enfatiza o conhecimento oriundo da relação com Deus mediante o encontro com a revelação.

A teologia relacional tende a ser próxima, porém distinta do teísmo aberto. Porém, alguns temas comuns a vulnerabilidade e abertura de Deus em ser voluntariamente afetado pelo que acontece na criação, particularmente em relação à humanidade. Ademais, ambas abordagens rejeitam concepções derivadas da filosofia grega, especialmente Platão e Aristóteles, para falar sobre Deus em termos a priori.

Os proponentes da teologia relacional rejeitam muitos pressupostos da noção teísta clássica de um Deus perfeito (no sentido de não ser capaz de mudar), impassível e imutável, bem como no conhecimento proposicional de Deus. Ao invés disso, concentra-se nas interações de dar e receber que caracterizam toda a existência, bem como no conhecimento posterior quando se conhece Deus revelado.

A teologia relacional se desenvolveu como um iniciativas isoladas no final do século XX e tem diversas raízes. Teve influências do Wesleyanismo, da devoção moderna, do pietismo e das teologias ortodoxas orientais. Viria a ser uma teologia distinta no final do século XX, ao combinar a filosofia analítica com críticas às teologias do processo e pós-modernas. São encontrados praticamente em todas as grandes tradições e ramos da teologia. Autores associados incluem Hegel, Horace Bushnell, I. A. Dorner, Emil Brunner, Kazoh Kitamori, Martin Buber, Juergen Moltmann, Robert Jenson, José María Castillo, Sergei Bulgakov, Clark Pinnock, John Sanders, Greg Boyd, Hans Urs Balthasar, Keith Ward, William Hasker, Amos Yong e Nicholas Wolterstorff. Dois expoentes a abraçar a identidade do movimento de teologia relacional são Thomas Jay Oord e William Andrew Schwartz. Oord enfatiza o caráter aberto da teologia relacional, enquanto outros teólogos concedem diferentes graus de perfeições descritas em termos estáticos.

Os teólogos relacionais enfatizam a natureza relacional de Deus conforme descrita na Bíblia, particularmente nas interações entre Deus e a humanidade. Eles também enfatizam a importância do amor, dos relacionamentos e da inter-relação na ética cristã e na vida da Igreja.

Essa perspectiva incentiva uma abordagem cristã aos relacionamentos e promove interações amorosas e traços de caráter que promovam relacionamentos positivos.

A teologia relacional critica nos teísmos clássicos os conceitos legados pela filosofia grega de impassibilidade e imutabilidade divina. Tais categorias e atributos de asseidade e impassibilidade afirmam que Deus permanece inalterado pela criação e imutável. Em contrapartida, essa abordagem de teologia afirma que Deus é relacional. Pela encarnação Deus demonstrou ser aberto a ser afetado e ativamente envolvido com as criaturas.

No sistema de teologia relacional a crença em um Deus pessoal/relacional disposto a interagir com a criação resolve vários paradoxos. De acordo com os principais articuladores da teologia relacional, os teólogos Oord e Schwartz, essa abordagem resolve o problema do mal.

BIBLIOGRAFIA
Brüntrup, Godehard; Göcke, Benedikt Paul; Jaskolla, Ludwig. Panentheism and Panpsychism: Philosophy of Religion Meets Philosophy of Mind. Innsbruck Studies in Philosophy of Religion, vol. 2, Brill, 2020.

Montgomery, Brint; Oord,Thomas Jay; Winslow, Karen , eds. Relational theology: A contemporary introduction. Wipf and Stock Publishers, 2012.

VEJA TAMBÉM

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Teologia da Libertação

A teologia da libertação é um movimento teológico que se originou na América Latina no final do século XX.

O movimento procura trazer mudanças sociais, políticas e econômicas para os oprimidos e marginalizados por meio de uma reinterpretação da fé cristã e das Escrituras. Parte do pressuposto da opção preferencial de Deus pelos pobres e pede uma resposta profética às injustiças sistêmicas e à pobreza.

Autores católicos que foram fundamentais para o desenvolvimento da teologia da libertação incluem Gustavo Gutiérrez, Leonardo Boff e Jon Sobrino. Esses teólogos buscaram aplicar os princípios da fé católica ao contexto de pobreza, desigualdade e opressão política na América Latina. A obra seminal de Gutiérrez desafiou o entendimento tradicional da Igreja Católica como uma entidade principalmente espiritual e, em vez disso, defendeu seu papel na promoção da justiça e na libertação dos oprimidos.

Contribuidores protestantes à teologia da libertação incluiam Georges Casalis, Elsa Tamez, José Miguez Bonino, Rubem Alves, Richard Shaull, Jaime Wright, Justo Gonzalez, Dorothee Sölle, Cheryl Bridges Johns e Kjell Nordstokke.

A partir dos anos 1990 a teologia da libertação perdeu visibilidade, mas continua ativa. A intersecção do envolvimento de teólogos da libertação com outras causas (minorias, feminismo, ecologia, deficiência, dentre outros) levou também a uma dispersão do movimento. A teologia da libertação enfrentou críticas tanto da Igreja Católica quanto de facções políticas reacionárias. O Vaticano emitiu várias críticas ao movimento na década de 1980, chamando-o de marxista e acusando-o de ser mais politicamente partidário que teológico. A teologia da libertação perdeu terreno para outras teologias políticas, como o neointegralismo (ou tradicionalismo) católico, o dominionismo e neofundamentalismo protestantes. Apesar disso, a teologia da libertação continua como voz em busca justiça social e tem influenciado o discurso e a práxis teológica em todo o mundo.

BIBLIOGRAFIA

Castro, André. Uma breve história da Teologia da Libertação Protestante e suas implicações teológicas. Editora Recriar, 2022.

Ortunes, Leandro, Silvana Martinho, and Vera Chaia. “Lideranças políticas no Brasil: da Teologia da Libertação ao Neofundamentalismo.” Revista Brasileira de Ciência Política (2019): 195-232.

Padilla, C. René. “Liberation Theology is Remarkably Protestant.” Christianity Today 15: 12.

Sobrino, Jon. Jesus the Liberator: A Historical-Theological Reading of Jesus of Nazareth. Maryknoll, NY: Orbis, 2000.


Fideo-simbolismo

O fideo-simbolismo foi um movimento teológico originário dentre evangélicos francófonos do século XIX que insistia na fé – na relação com Deus – e diminuía a importância da doutrina. No fideo-simbolismo conhecimento de Deus é algo além da capacidade das fórmulas e expressões humanas apreenderem.

Meio às querelas teológicas entre evangélicos “ortodoxos” e “liberais”, dois professores da Faculdade de Teologia Protestante de Paris: Eugène Ménégoz, da Igreja Luterana, e Auguste Sabatier, da Igreja Reformada elaboraram o fideo-simbolismo como uma terceira via.

Ménégoz argumentava o fideísmo, de que a salvação era uma questão de fé e não de credo. Desse modo, os credos resultavam da experiência e do pensamento circunscritos a um período histórico, permanecendo sempre abertos a críticas e revisões. Proposições doutrinárias não afetam a essência ou o cerne da fé cristã.

Auguste Sabatier propôs simbolismo crítico influenciado por Kant, conciliando fé, ciência, história, psicologia, um cristianismo ativo e liberdade de pensamento. Argumentava que o conhecimento teológico é de natureza simbólica, pois Deus permanece além de nossas idéias, nossas imagens e nossas proposiçõs. Por essa razão, a mente humana é receptiva a questões espirituais e inexprimíveis. Doutrina e dogmas são relativos à evolução da experiência religiosa básica nutrida pela Bíblia e fundamentada em Cristo.

Os crentes deveriam ser unidos pela fé, na relação do ser humano com Deus. Rejeitava a uma religião fundada em uma autoridade (quer a do clero, quer de dogmas — mesmo considerar o texto bíblico como fonte de autoriadde) em benefício de uma religião intelectualizada resultante na experiência espiritual.

Como movimento, ganhou adesão das classes média e alta protestantes francesas. Sendo um movimento mais intelectual, foi substituído por outras correntes de pensamento ao longo do século XX.

Calvinismo

Calvinismo é uma designação para diversos sistemas teológicos com alguma conexão com o pensamento do reformador do século XVI João Calvino.

Frequentemente o termo é utilizado de modo intercambiável com teologia reformada. Entretanto, o termo calvinismo quando empregado sem qualificações tende a se referir (1) à teologia de João Calvino, o que seria em sentido estrito calvinismo; (2) à teologia que reclama o legado de João Calvino conforme formulada pelo Sínodo de Dort ou Calvinismo de Cinco Pontos; (3) ao tipo sociológico proposto por Max Weber para o protestantismo de valores individuais e predestinacionista com base na tradição reformada; (4) ao novo movimento religioso com origem em países de língua inglesa a partir dos anos 1960 que reformula a tradição teológica reformada sob aspectos de subordinacionismo e salvação pelo Senhorio, além de ativa participação sociocultural e política também chamado de Novo Calvinismo.

Construída em uma teologia dos atributos divinos, o calvinismo enfatiza a soberania divina. Suas influências e matrizes são a filosofia estóica, o neoagostinianismo renascentista e a soteriologia forense (principalmente a reelaboração da teoria de satisfação de Anselmo como substituição penal por Calvino). Em seus desdobramentos internos levaram à formação do supra e infralapsarianismo, do amiraldismo, do arminianismo, a “New School Presbyterianism”, o fullerismo batista, Cocceianismo ou aliancismo, Neocalvinismo Kuyperiano e seu desdobramento na teologia reformacional, a teologia de Keswick, a Neo-Ortodoxia Barthiana, dentre outros. Além dessas variantes, diversas tradições nacionais (suíça, alemã, francesa, holandesa, húngara, escocesa, inglesa, galesa, americana, indonésia, coreana e sulafricana são as principais) apresentam ênfases e conceptualizações distintas.

BIBLIOGRAFIA

Allen, Michael; Swain, Scott R. eds. The Oxford Handbook of Reformed Theology. Oxford University Press, 2020.

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Holt, Mack P., ed. Adaptations of Calvinism in Reformation Europe: essays in honour of Brian G. Armstrong. Routledge, 2016.

Maxwell, Paul. The Trauma of Doctrine: New Calvinism, Religious Abuse, and the Experience of God. Minneapolis, Fortress Academic, 2021.

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Sinnema, Donald; Moser, Christian; Selderhuis, Herman. Acta et Documenta Synodi Nationalis Dordrechtanae. Série em dez volumes. Gottingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 2015-.

Vermurlen, Brad. Reformed Resurgence: The New Calvinist Movement and the Battle Over American Evangelicalism. Oxford University Press, 2020.