James William McClendon

James William McClendon Jr. (1924-2000) foi um teólogo batista americano, com contribuições à teologia sistemática, ética e filosofia da religião.

McClendon foi professor de teologia no Seminário Teológico Fuller, na Universidade de Notre Dame e no Seminário Bíblico Menonita. A perspectiva teológica de McClendon foi influenciada por sua herança batista e anabatista.

Foi o autor de várias obras, incluindo “Ética: Teologia Sistemática, Volume 1”, “Doutrina: Teologia Sistemática, Volume 2” e “Testemunha: Teologia Sistemática, Volume 3”. O trabalho combinava ênfases na narrativa, comunidade e tradição no desenvolvimento da teologia cristã. Procurou integrar a teologia com preocupações sociais e éticas.

McClendon Jr. teve um diálogo significativo com a teologia anabatista, tanto na teologia narrativa quanto em seu envolvimento com a tradição menonita. Ele foi inspirado pelos princípios anabatistas do discipulado, comunidade e não-violência, e procurou incorporar esses temas em sua própria teologia. McClendon defendia a reflexão teológica dentro do contexto de uma comunidade específica, que ressoou com a eclesiologia anabatista. Colaborou com teólogos anabatistas como John Howard Yoder, e seu trabalho influenciou o desenvolvimento da teologia neo-anabatista nos Estados Unidos.

Gegenerb

O conceito anabatista de Gegenerb ou contra-herança, desenvolvido por Pilgram Marpeck, enfatiza que os seres humanos têm acesso à bondade essencial por meio da redenção e a promessa da redenção é o que constitui a contra-herança. Gn 3 não é lido como maldição à humanidade, mas como promessa de redenção em Cristo. Isso significa que a redenção e o amor cristão nutridos por meio do discipulado são as manifestações dessa contra-herança.

Marpeck acreditava que os humanos não perderam sua bondade essencial quando Deus expulsou Adão e Eva do Éden. A perspectiva de Marpeck discordou da visão agostiniana do pecado original e da natureza humana, que se concentrava fortemente na depravação humana.

Tal como Adão e Eva fizeram escolhas e discerniram entre o bem e o mal, o poder e a inevitabilidade do pecado na humanidade ganham poder somente quando a pessoa chega ao tempo do conhecimento, ou seja, a uma relativa idade adulta.

Os anabatistas creem na liberdade da vontade (livre arbítrio) e no renascimento espiritual do indivíduo. Com a ajuda da graça divina, os seres humanos podem vencer suas tendências ao mal e obedecer aos mandamentos divinos. Esta liberdade da vontade é essencial para o discipulado ou Nachfolge, doutrina central do anabatismo.

O sacrifício de Cristo foi suficiente e eficaz para toda a humanidade. Por essa razão, crianças recebem a promessa de Cristo e não vão para o inferno. Já os adultos, sabendo distinguir entre o bem e o mal, sofrem da inclinação ou tendência para o mal (Neigung ou Neiglichkeit), ou ainda tentação.

O novo nascimento espiritual envolve a transformação do homem “natural” em um homem “espiritual” que agora pode ver seu novo caminho e sentir o poder, recebido por meio de uma experiência espiritual, para resistir ao mal, ao pecado, à desobediência a Deus, ao orgulho e ao egoísmo, que anteriormente poderia ter dominado seu personagem. No entanto, essa força recém-adquirida não é uma garantia completa contra possíveis retrocessos, e a vida continua sendo uma luta contínua entre as duas naturezas do homem.

A existência humana é um embate entre o mundo do mal e o reino de Deus. A obediência a Cristo e a escolha pelo bem é uma escolha adulta e voluntária. Para o anabatista, o exercício da escolha humana de rejeitar o mal tem um clímax no batismo voluntário do crente, pois o batismo marca a escolha de crucificar o pecado e experimentar a vida ressurreta em Cristo (Rm 6).

Igreja dos Irmãos

O nome “Igreja dos Irmãos” ou “Igreja da Irmandade” é aplicado a diversos grupos cristãos, a maior parte deles sem relação entre si.

  1. Unidade dos Irmãos ou Igreja dos Irmãos Morávios: originários do movimento hussita no final da Idade Média.
  2. Irmãos Hutteritas: um grupo anabatista que compartilha os bens.
  3. Irmãos Suíços: denominação adotado pelos anabatistas suíços e do sul da Alemanha até a separação entre amish e mennonitas em 1693.
  4. Irmãos Mennonitas: um movimento de renovação entre mennonitas russos na década de 1860.
  5. Irmãos de Schwarzenau: grupos pietistas que traçam suas origens no ministério de Alexander Mack. Também chamados de Dunkers.
  6. Igreja dos Irmãos (Church of the Brethren): ramo dos Dunkers com sede em Elgin, Illinois, Estados Unidos.
  7. River Brethren (Irmãos do Rio) ou Brethren in Christ: grupo anabatista-pietista formada na década de 1770 entre mennonitas outros pietistas de língua alemã nas margens do rio Susquehanna, na Pennsilvânia.
  8. Irmãos Evangélicos Unidos: ramo originário dos River Brethren.
  9. Movimento dos Irmãos: também conhecidos como Casa de Oração, Irmãos Cristãos, Darbistas, Irmãos de Plymouth, Assembleia de Irmãos, Igreja Cristã Evangélica, Igreja dos Irmãos, dentre outros. É um movimento primitivista com origens nas ilhas britânicas na década de 1820.

Anabatismo e pentecostalismo

As relações entre os diversos movimentos pentecostais e anabatistas são recorrentes. Ambos movimentos são formas populares de cristianismo, sustentam bases radicais, valorizam a vida comunitária, a ação direta do Espírito Santo e uma leitura direta das Escrituras.

Houve manifestações carismáticas nos eventos que deram origem aos anabatistas. Em 1525 um avivamento ocorreu em Zollikon e St. Gall, Suíça, com manifestações ecstáticas, profecias e falar em línguas, com várias pessoas sendo batizadas nas águas. A jovem Margret Hottinger em Zollikon pregava, proclamava o perdão dos pecados, citava a Bíblia e falava em línguas. Logo, o movimento foi perseguido.

Os chamados “Espirituais” ou “Pneumáticos” foram um ramo dos primórdios dos anabatistas que valorizavam manifestações do Espírito Santo e sua guia. No entanto, os anabatistas não desenvolveram uma teologia para explicar essas manifestações. Com o tempo, o movimento anabatista acomodou-se em expressões mais comedidas.

Nos anos 1860 houve um avivamento entre os mennonitas da Rússia, com algumas vertentes aderindo a manifestações carismáticas. Desse movimento surgiu a Igreja dos Irmãos Mennonitas.

Uma influência anabatista na origem do pentecostalismo aparece quando William Seymour foi morar em Indianápolis, onde frequentava a “Evening Light Saints”. Esse grupo anabatista de santidade, também chamado de Igrejas de Deus (Anderson) iniciada por Daniel S. Warner, possuía princípios igualitários e primitivistas, além de uma eclesiologia anti-organizacional.

Na região de Chicago, Daniel C. O. Opperman, oriundo de uma família dos Irmãos Alemães Dunkers, foi pioneiro do avivamento pentecostal.

Em 1908 um avivamento pentecostal ocorreu entre os mennonitas e Irmãos em Cristo Mennonitas em Ontário, Canadá. O canadense Solomon Eby, um dos fundadores da denominação dos Irmãos Mennonitas em Cristo (Igreja Missionária) era um mennonita influenciado pelo pietismo e pelo movimento de Santidade. Junto de outros crentes de extração anabatista, Eby deriu ao pentecostalismo em 1912, sendo ativo na Assembleia Pentecostal de Waterloo, Ontário. De forma independente, um segmento americano da Igreja Missionária formou a Pentecostal Brethren in Christ, a qual depois se fundiu com a Pilgrim Holiness Church em 1924. Vários dos crentes de origem mennonita estiveram entre os organizadores da Pentecostal Assemblies of Canada em 1919.

Nos anos 1920 aconteceu um avivamento entre os menonitas da Califórnia depois de contatos com Aimee Semple McPherson. A ocasião gerou várias controvérsias, com muitos deixando suas congregações para juntar-se às igrejas pentecostais.

Nos anos 1950 houve um avivamento pentecostal entre os jovens da igreja menonita, liderado por Gerald Derstine, pastor da Strawberry Lake Mennonite Church em Ogema, Minnesota. Nos anos 1970 apareceu a influência do movimento carismático na Igreja Menonita.

Durante o regime soviético, mennonitas, batistas e pentecostais foram forçados a se unirem na União dos Cristãos de Fé Evangélica. Dessa experiência, vários mennonitas adotaram práticas pentecostais.

No Brasil surgiram a Igreja dos Irmãos Mennonitas Renovada e a Igreja Anabatista Pentecostal, essa última sem ligações históricas diretas com os mennonitas.

Em tempos recentes, em 2013 pentecostais, carismáticos e mennonitas se uniram para formar a Mennonitischen Freikirche Österreich (MFÖ), a Igreja Livre Mennonita da Áustria.

BIBLIOGRAFIA

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Anabatismo

O anabatismo é um movimento e sistema teológico originário da Reforma Radical no século XVI, fundamentado em uma vida de discipulado voluntário na Igreja como Corpo de Cristo.

Levando os princípios reformadores de retorno obediente às Escrituras, os anabatistas apareceram em vários lugares entre os anos 1520 e 1560. Depois de malfadadas experiências polítcas, guerras e perseguições, floresceram as vertentes pacifistas como os mennonitas na Holanda, os hutteritas na Áustria e os Schwenkenfelders na Europa Central. Mais tarde houve outros desdobramentos como os Amish, os Collegiantes, os Dunkers, os Irmãos Mennonitas, dentre outros.

Em comum com os batistas, os anabatistas observam o batismo consciente do crente em idade adulta, mas diferem em nuances teológicas. Enquanto os batistas emergiram de um ambiente puritano em uma matriz anglicana, os anabatistas retiveram as influências zwinglianas e erasmianas.

Perseguidos, os anabatistas encontraram refúgios em áreas fronteiriças, quer na Rússia, quer nas Américas.

HISTÓRIA

O anabatismo teve início em 1525, quando Conrad Grebel, discípulo de Huldrych Zwingli, rebatizou George Blaurock, que, por sua vez, batizou outros em Zurique. Esse ato de rebatismo, rejeitando a legitimidade do batismo infantil, simbolizou a ruptura do movimento com o cristianismo tradicional. Outras figuras de destaque, como Felix Manz e Balthasar Hubmaier, aderiram à causa. Manz foi o primeiro mártir protestante executado por outros protestantes, sendo afogado no Rio Limmat, em Zurique, em 1527.

Balthasar Hubmaier, um ex-teólogo católico, liderou o movimento na Alemanha e na Morávia. Ele enfatizou o livre-arbítrio em oposição à predestinação e defendeu o batismo de adultos por efusão em vez de imersão. Hubmaier foi executado na fogueira em Viena, em 1528, e sua esposa foi afogada pouco depois.

Os anabatistas defendiam princípios teológicos que os distinguiam tanto de católicos quanto de reformadores magisteriais. Entre eles estava a prática do batismo de crentes, reservado exclusivamente a adultos que pudessem professar conscientemente sua fé em Cristo. Também insistiam na separação entre igreja e estado, argumentando que a igreja deveria ser independente do controle governamental. Muitos adotaram uma postura de não violência, recusando-se a portar armas ou participar de guerras. Além disso, enfatizavam a vivência comunitária da fé, praticando a responsabilidade mútua e buscando seguir os ensinamentos de Cristo no cotidiano. Para os anabatistas, as Escrituras eram a autoridade final, interpretadas com foco especial no Novo Testamento.

O movimento enfrentou severa perseguição de autoridades católicas e protestantes. Um episódio particularmente controverso foi a Rebelião de Münster (1534–1535), na qual um grupo liderado por Jan Matthyszoon e John of Leyden estabeleceu uma teocracia comunal em Münster, na Alemanha. Práticas como a poligamia e a resistência armada comprometeram a reputação do anabatismo, embora a maioria dos anabatistas rejeitasse tais extremismos.

A perseguição foi brutal e generalizada: milhares de anabatistas foram executados por afogamento, queima na fogueira ou outros métodos. Apenas na Suíça, mais de 5.000 foram mortos em uma década.

Apesar da perseguição, o anabatismo sobreviveu e evoluiu. Os huteritas, liderados por Jacob Hutter, desenvolveram práticas de vida comunitária na Morávia, enquanto os menonitas, nomeados em homenagem a Menno Simons, enfatizaram a não violência e a vida simples. Esses grupos, junto com os amish e os irmãos, representam os ramos duradouros do anabatismo.

TEOLOGIA

A teologia anabatista não é sistematizada, antes é uma teologia vivida. Por sinal, poucas foram as teologias com organização sistematizadas sob perspectivas anabatistas.

O amor a Deus e o amor ao próximo são centrais na teologia anabatista e são vistos como inseparáveis do discipulado. Os anabatistas acreditam que amar a Deus significa seguir Jesus e obedecer aos seus mandamentos, o que inclui amar o próximo e buscar a justiça e a paz no mundo. Isso se reflete em sua ênfase na comunidade, serviço e pacifismo.

A teologia anabatista define o pecado como uma violação da vontade de Deus, levando a uma quebra de relacionamento entre humanos e Deus, e entre a própria humanidade. Os anabatistas enfatizam a necessidade de arrependimento pessoal, afastamento do pecado e restauração de relacionamentos por meio do perdão e da reconciliação.

A soteriologia anabatista centra-se na ideia de discipulado, que envolve seguir Jesus Cristo como um modo de vida. Para os anabatistas, a salvação não é simplesmente um evento único que ocorre no momento da conversão, mas um processo de transformação ao longo da vida à medida que a pessoa se torna mais semelhante a Cristo.

A obra redentora de Cristo foi o ato de graça que permite a reconciliação da humanidade com Deus e entre a própria humanidade. Por isso, seus ensinos tanto quanto sua morte são importantes para a salvação.

A salvação, para os anabatistas, não é apenas uma experiência individual, mas também envolve a transformação da sociedade. Os anabatistas enfatizam a importância de viver a fé de maneira prática, incluindo o compromisso com a pacificação, a justiça social e o atendimento às necessidades dos outros.

Para os anabatistas, a justificação é resultado de fé e obediência, ao invés de uma justiça imputada. Eles vêem a justificação como um processo contínuo de se acertar com Deus, ao invés de um evento único que ocorre no momento da conversão. Em vez disso, eles veem a justificação como um processo contínuo inseparável da santificação. A justificação é vista como resultado da fé em Jesus Cristo, levando a uma vida transformada caracterizada pela obediência à vontade de Deus.

Os anabatistas também enfatizam a importância da fé pessoal e da decisão de aceitar a Cristo, em vez de confiar na fé herdada ou na identidade cultural. Daí a importância do batismo consciente. Eles rejeitam a ideia de predestinação e enfatizam a necessidade de cada indivíduo responder ao chamado de Deus.

Os anabatistas veem o pecado como um problema generalizado que afeta todos os aspectos da vida humana, ao invés de apenas ações individuais. Portanto, eles enfatizam a necessidade de arrependimento contínuo e o compromisso de viver de acordo com os ensinamentos de Cristo.

Sendo a obra de salvação algo coletivo, valorizam a eclesiologia. A vida comunitária, especialmente considerando a igreja como uma irmandade, leva a considerar uma ética de amor, resolução não violenta de conflitos e abnegação. No entanto, em eclesiologia há uma polarização entre os anabatistas contemporâneos. De um polo, os Schwenkenfelders só consideram a Igreja invisível, negando a existência tangível de uma Igreja visível. No outro polo, muitos dos mennonitas da antiga ordem (old order) negam a existência de uma Igreja invisível, somente considerando a Igreja visível. Apesar disso, todos os anabatistas valorizam uma eclesiologia de Igreja Livre.

O historiador Harold Bender articulou a chamada “Visão Anabatista”, destacando o discipulado, a vida comunitária e o pacifismo. Bender via o anabatismo como um compromisso radical de seguir os ensinamentos de Jesus na vida cotidiana. John Howard Yoder expandiu essa visão, defendendo uma abordagem não coercitiva para engajamento social em sua obra The Politics of Jesus. Yoder enfatizou a vida de Jesus como modelo para a ética cristã. Já Scot McKnight, em uma perspectiva contemporânea, destacou a narrativa da vida de Jesus como central para a fé e prática cristãs, conectando os princípios anabatistas com os desafios modernos.

BIBLIOGRAFIA

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