Anfilóquio de Icônio

Anfilóquio de Icônio: bispo e teólogo do século IV. Defendeu o credo Niceno e manteve oposição ao arianismo.

Anfilóquio era um jurista e pertencia às classes aristocráticas. Seria parente de Gregório de Nazianzo e amigo de Basílio de Cesareia. Foi bispo de Icônio na Galácia de 373 a 394 d.C. Sua obra, embora extensa, é conhecida hoje principalmente por fragmentos e poemas, tal como Iâmbicos para Seleuco, anteriormente atribuído a Gregório de Nazianzo.

Neste poema didático, Anfilóquio delineia um cânon bíblico que reflete o debate em curso na época. Reconhece o Antigo Testamento protocanônico, com a exceção de Ester, considerado antilegômena. No Novo Testamento, aceita 22 dos 27 livros, classificando 2 Pedro, 2 e 3 João, Judas e Apocalipse como antilegômena. A obra de Anfilóquio, portanto, oferece um vislumbre valioso da formação do cânon bíblico no século IV.

Antilegômena

Antilegomena, do grego ἀντιλεγόμενα, “falado contra” ou “controverso”, são escritos cuja autenticidade ou valor canônico foram contestado na história da Igreja.

Eusébio propôs uma classificação tríplice para os livros tidos como escrituras. Os homologoumenas seriam os livros aceitos por todos. Os apócrifos seriam os livros heréticos ou espúrios a serem rejeitados. Por fim, os antilegômenas seriam os livros disputados no cânon do Novo Testamento. Entre eles estavam Tiago, Judas, 2 Pedro, 2 João, 3 João, Apocalipse de João, Hebreus, Apocalipse de Pedro, Atos de Paulo, Pastor de Hermas, a Epístola de Barnabé e a Didaquê.

Similar classificação tripla de autoridade foi empregada pelos bispos Julino Africano e Teodoro de Mopsuéstia, demonstrando que era essa a noção de canonicidade tanto no oriente quanto no ocidente nos meados do primeiro milênio. Mais tarde, no cristianismo ocidental desenvolveu-se o conceito de cânon como algo “ou tudo ou nada” enquanto no cristianismo oriental a canonicidade passou a ser primordialmente funcional. Os livros homolougoumenas são aqueles utilizados em culto e dos quais se pode fundamentar doutrina, devoção e guia para a Igreja. Sem seguida, há uma categoria de livros para devoção privada, mas não para uso na Igreja ou com uso limitado, como é o caso do Apocalipse de João na Igreja Ortodoxa Russa.

No cristianismo siríaco a antilegômena compreende 2 Pedro, 2 e 3 João, Judas e Apocalipse, livros ausentes em muitos manuscritos da Peshitta. Gradativamente esses livros passaram a ter aceitação nas igrejas siríacas somente a partir da adoção de edições impressas.

Com a difusão da imprensa e a Reforma, a questão da canonicidade voltou. Por exemplo, a antilegômena luterana. No início da Reforma, biblistas como Erasmo, Lefèvre d’Étaples, Lutero, Carlstadt, Chemnitz, Flácio e Cardeal Cajetano discutiram a canonicidade de vários escritos.

Na antilegômena da Bíblia de Lutero foi impressa em anexo os livros de Hebreus, Tiago, Judas, 2 Pedro, 2 e 3 João, Apocalipse de João. Eventualmente, esses livros continuaram a fazer parte do cânone luterano, sendo citados como autoridade em teologia acadêmica, devocional e eclesiástica. No entanto, Martin Chemnitz insistia que a antilegômena não poderia ser empregada para avaliar doutrina, uma política seguida entre várias comunidades luteranas conservadoras, como fez até recentemente o Sínodo de Wisconsin.

Em estudos recentes antilegômena, por vezes, aparece para compreender os escritos paulinos disputados: 2 Tessalonicenses, Colossenses, Efésios e as Epístolas Pastorais — 1 e 2 Timóteo e Tito.

A antilegômena não deve ser interpretada como “falsa” ou “herética”. O conceito indica que houve desacordo na Igreja sobre se a textos mereciam ou não status canônico, bem como qual autoridade atribuir ao texto (uso litúrgico, doutrinário, devocional, histórico).

Antilegômena não se confunde com os conceitos de deuterocanônico, apócrifo ou cânon amplo.

BIBLIOGRAFIA

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