A expressão latina “o finito portando a capacidade de conter o infinito” na teologia luterana resume a divindade e humanidade de Cristo na encarnação do Logos. Na união hipostática não significa que o finito tenha algum tipo de capacidade inerente de conter o infinito, mas sim que o Deus infinito foi capaz de se comunicar com o finito. Na encarnação houve a plenitude divina comunicando os atributos divinos (communicatio idiomatum) (Cl 2:9).
De modo contrário, o sistema teológico reformado declarou que “o finito não é capaz do infinito” (Finitum non est capax infiniti) negando a comunhão das naturezas divina e humana em Cristo. Com base na ontologia aristotélica, o sistema reformado sustenta que o corpo de Jesus deve ser “finito” para ser um verdadeiro corpo humano. Seria, portanto, incapaz de realmente possuir qualquer um dos infinitos atributos de Deus.
A fórmula latina originou-se nos debates luteranos-reformados sobre a Ceia do Senhor e depois sobre a cristologia. Em vários escritos Huldreich Zwingli (1484-1531) e Johannes Oecolampadius (1482-1531) acusavam Lutero de transferir qualidades divinas para a humanidade de Jesus para que Cristo pudesse ser em todos os lugares, incluindo a Ceia do Senhor. Para os reformados, a natureza humana de Cristo permanecia nos céus enquanto sua natureza divina seria onipresente. Em contrapartida, os luteranos insistiam que essa separação não ocorria, sendo a completa pessoa de Jesus Cristo ubíqua, inclusive nos sacramentos “na, dentro e sob” aspectos do pão e do cálice.
Para Lutero o Espírito Santo, a Palavra e a fé determinam se um objeto ou ação é espiritual ou não, não o objeto ou ação em si. Assim, na Ceia do Senhor pelo Espírito, pela Palavra e pela fé o corpo de Cristo seria espiritualmente recebido. Não ocorre a transubstanciação –a mudança em substância do pão e do vinho na substância do corpo e sangue de Jesus Cristo — mas o exercício da fé. Assim, o pão e o vinha não devem ser adorados.
As implicações da visão luterana de que o finito é um veículo do divino claramente moldaram a atitude em relação às artes e à liturgia. O medo de incorrer em idolatria foi superado pela convicção de que o mundo material poderia ser usado para expressar uma mensagem espiritual dos atos salvíticos. A estética, a arquitetura, a música luteranas refletem isso, especialmente em J. S. Bach e no barroco enquanto em nações reformadas na mesma época adotou-se uma austeridade estética e a vedação de se cantar hinos.
Outra consequência, a união mística com Jesus Cristo mediante a fé foi salientada por Johann Ardt, os pietistas e os morávios. Um efeito disso na comunhão dos cristãos é que ao exigir a fé como elemento para participação da Santa Ceia, abriu-se a mesa a todos que confessavam a Jesus Cristo, sem adicional adesão a proposições teológicas. Os metodistas também foram influenciados por essa concepção. Wesley escreveu no 18o Artigo de Religião “O corpo de Cristo é dado, recebido e comido na ceia, somente de modo espiritual. O meio pelo qual é recebido e comido o corpo de Cristo, na ceia, é a fé.”
Dimensões éticas, existenciais e mesmo ecólogias ramificam desse conceito. Por exemplo, Kierkegaard ponderava:
A Verdade Eterna passou a existir no Tempo; que Deus veio à existência, nasceu, cresceu, veio à existência exatamente como um ser humano individual, indistinguível de qualquer outro ser humano. Concluindo o pós-escrito não científico.
Kierkegaard
No pentecostalismo a capacidade de os corpos humanos tornarem-se templos para a morada do Espírito Santo, recebendo uma efusão do Espírito, é arguida nos termos de que o “finito é capaz do infinito”. Revestidos de poder, o crentes tornam-se recipientes da graça. Nas Mensagens publicadas por W. H. Durham, há esse tema. “Assim glorificai a Mim em vossos corpos mortais, nos quais, depois que Meu Espírito neles entrou, não são mais vossos, mas Me pertencem”. O batismo no Espírito Santo passa ser a realização (atualidade) da presença de Cristo (potência), como na Santa Ceia.
BIBLIOGRAFIA
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Kierkegaard, Soren. Afsluttende uvidenskabelig Efterskrift til de philosophiske Smuler. — Mimisk-pathetisk-dialektisk Sammenskrift, Existentielt Indlœg, af Johannes Climacus. Udgiven af S. Kierkegaard. Copenhaguen: 1846.
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