Momiers

Durante o Avivamento Continental na Suíça e França no século XIX, emergiu um movimento conhecido como Momiers. O termo, derivado da palavra francesa momerie, que significa “hipocrisia,” era um apelido pejorativo dado aos seus seguidores, embora eles o tenham adotado posteriormente. Essa designação refletia a crítica dos protestantes estabelecidos à fervorosa e estrita fé dos Momiers, que buscavam um retorno à ortodoxia.

Os momiers, liderados por figuras como César Malan e Henri Louis Empaytaz, rejeitavam o racionalismo que havia se infiltrado na Igreja Estatal de Genebra e no cantão de Vaud. Defendiam enfaticamente doutrinas evangélicas, como a divindade de Cristo, a Trindade e a pecaminosidade humana, que eram, na época, negligenciadas por muitos pastores. Suas reuniões tinham um fervor espiritual e uma busca por uma experiência religiosa mais profunda e pessoal.

Em Genebra, a Venerável Companhia dos Pastores (o presbitério local) proibiu, em 1817, a pregação das doutrinas centrais defendidas pelos Momiers, o que levou a uma ruptura. Malan, Empaytaz e outros, incluindo o metodista britânico Henry Drummond, separaram-se da Igreja estatal para formar suas próprias congregações evangélicas independentes. Embora inicialmente tolerados, sofreram a oposição da população e, em Vaud, as autoridades chegaram a proibir completamente suas assembleias em 1824, impondo penalidades aos líderes. No entanto, a perseguição, em vez de sufocar o movimento, o fortaleceu, resultando na formação de uma igreja independente, a Église libre, em 1848, que ganhou o direito de livre culto.

O movimento espalhou-se pelo sul da França. O escritor Stendhal descreve os momiers em seus Mémoires d’un touriste (1838) com uma mistura de curiosidade e crítica. Retrata um encontro fortuito em 11 de setembro de 1837, onde ele e seu companheiro de viagem partindo de Montpellier são surpreendidos por um grupo de momiers que lhes deram panfletos religiosos.

Segundo Stendhal, os momiers seriam os “janssenistas do protestantismo” com uma “reforma, mais severa e inteiramente nova”. Notou que a vaidade dos protestantes mais velhos fora ferida pela nova religião, que, para ele, discutia constantemente sobre a graça, o Espírito Santo e o mérito das obras. De acordo com o autor, os momiers acreditavam que as obras eram insignificantes e que a salvação vinha apenas pelos méritos de Jesus Cristo.

Stendhal se impressionou particularmente com a “aparência de igualdade entre os fiéis”, vendo nela o mesmo atrativo do cristianismo primitivo. Descreve como “damas bem-educadas” ouviam com respeito “um camponês miserável” que se dizia “inspirado” e que, antes de se tornar ministro, “subia em um barril para ser melhor ouvido”. Também mencionou a origem estrangeira (inglesa) do gruoo e que pregavam que “fora da religião momier não há salvação”.

Suas crenças e práticas eram distintivas. Valorizavam a “salvação pela graça” através dos méritos de Jesus Cristo, negando o valor das “obras” para a salvação, um tema de constante debate teológico na época. A ênfase na igualdade espiritual de todos os fiéis era central, atraindo, em particular, membros de classes sociais mais baixas, incluindo camponeses. Essa crença se manifestava em suas reuniões, onde qualquer membro, independentemente de sua posição social, podia se sentir “inspirado” a falar. Isso chocou a elite protestante, que via em suas reuniões a falta de formalidade e hierarquia.

A partir da década de 1840, o movimento momier foi influenciado pelo Movimento dos Irmãos (ou plymouthismo) inglês, liderado por John Nelson Darby, que viajou extensivamente pela França e Suíça. O encontro entre os dois movimentos resultou em divisões internas, especialmente sobre a estrutura eclesial. Enquanto os Momiers tradicionais davam um papel especial ao pastor, o Movimento dos Irmãos defendiam que qualquer membro podia conduzir o culto, seguindo sua “inspiração divina.” A influência de Darby levou a uma nova cisão, dando origem a comunidades conhecidas como darbistas, que se distinguiram por sua ênfase na independência de cada congregação e no sacerdócio universal dos crentes.

Referências

Aschbach, Joseph. Kirchen-Lexikon. Vol. 4. Frankfurt am Main: J. Baer, 1850.

Bost, Jean-Augustin. Défense des fidèles de l’Eglise de Genève. Paris: Librairie Évangélique, 1825.

Chenevière, Jacques. Quelques mots sur la Genève religieuse du baron de Goltz. Geneva: J. J. Paschoud, 1863.

Hagenbach, Karl R. Church History of the Eighteenth and Nineteenth Centuries. Vol. 2. Translated by J. F. Hurst. New York: Scribner, 1869.

Maillebouis, Christian. “Les Momiers.” Les Cahiers du Mézenc 5 (julho de 1993): 15-24.

Malan, César. Swiss Tracts. Vol. 1. N.p., n.d.

Mestral, Louis. Mission de l’Eglise libre. Lausanne: G. Bridel, 1848.

Schweizer, Alexander. Die kirchlichen Zerwürfnisse im Kanton Waadt. Zurich: D. Burkhard, 1846.

Stendhal. Mémoires d’un touriste. 2 vols. Paris: M. Lévy frères, 1854.

Von Goltz, Robert. Die reformierte Kirche Genfs im 19. Jahrhundert. Basel: C. F. Gelbcke, 1862.

G.B. Geschichte der sogenannten Momiers, einer in einigen schweizer-Cantonen auch ausbreitenden Secte. 2 parts. Basel, 1825.

Movimento dos Irmãos

Igreja dos Irmãos: também conhecidos como Casa de Oração, Salão Evangélicos, Irmãos Cristãos, Darbistas, Irmãos de Plymouth, Assembleia de Irmãos, Movimento dos Irmãos, dentre outros. É um movimento primitivista com origens nas ilhas britânicas na década de 1820.

Desde a Revolução Francesa, vários movimentos avivalistas e primitivas ocorreram nas Ilhas Britânicas. Por exemplo, 1807, quando, perto de Omagh, um grupo de jovens evangelistas presbiterianos foi encorajado por James Buchanan a compartilhar o pão e o vinho como os apóstolos. O grupo resolveu praticar apenas atos de adoração claramente ordenados e praticados pelas primeiras igrejas do Novo Testamento. Em oito anos, Buchanan, então cônsul britânico em Nova York, teve contato pessoal com vinte e dois grupos semelhantes que surgiram espontaneamente na Irlanda, Escócia, Inglaterra e América. Outros foram influenciados pelo ministério itinerante dos irmãos Haldane. Em comum, esses grupos tinham a Bíblia como sua única autoridade, se reuniam no primeiro dia da semana para a Ceia do Senhor, ensinavam uns aos outros a partir das Escrituras e tinham seus próprios anciãos, mas se recusavam a considerar seus líderes como clérigos.

O Movimento dos Irmãos surgiu no século XIX na Europa, inicialmente de forma descentralizada. Suas origens com características e identidades tal como hoje remontam a 1820, com a emergência de vários grupos de avivamento que, de maneira independente, compartilhavam características doutrinárias e práticas. Embora a assembleia de Dublim, em 1825, e a de Plymouth, em 1831, sejam frequentemente citadas como marcos fundadores, o movimento também se desenvolveu simultaneamente na Suíça e na Itália, onde a conversão do Conde Piero Guicciardini em 1836 foi um ponto de partida significativo.

O movimento foi impulsionado por uma insatisfação com as igrejas protestantes estabelecidas, percebidas como hierarquizadas e distanciadas das práticas do Novo Testamento. Entre os pioneiros, destacaram-se figuras como Anthony Norris Groves, George Müller e John Nelson Darby. Eles defendiam a autoridade exclusiva da Bíblia, o sacerdócio universal dos crentes, a rejeição de um clero formal e a celebração da Ceia do Senhor em cada domingo. O foco era na simplicidade e na busca por uma fé alinhada com as Escrituras, abandonando tradições de séculos em favor de um retorno às origens do cristianismo. Essa ênfase no biblicismo, no primitivismo e na escatologia millenarista conferiu-lhes uma identidade distinta.

O movimento enfrentou divisões internas, notadamente a de 1848, que resultou na separação entre os “Irmãos Abertos” e os “Irmãos Fechados”. A vertente aberta, à qual a maioria das “Assembleias dos Irmãos” contemporâneas pertence, adota uma postura mais cooperativa com outros grupos evangélicos. Em contraste, a ala fechada, associada às ideias de Darby, é mais exclusivista e se isola de outras denominações.

A história do Movimento dos Irmãos em Portugal teve início em 1854, com a chegada do engenheiro químico inglês Thomas Chegwin, que começou uma missão entre os trabalhadores de minas em Palhal. Mais tarde, em 1875, outro engenheiro britânico, George Colby Mackrow, chegou ao país. Em 1877, Mackrow convidou o missionário Richard Holden a vir para Portugal, e juntos eles abriram o primeiro templo da igreja, em Lisboa. Atualmente, a maioria das comunidades em Portugal está unida sob o registro legal de Comunhão de Igrejas de Irmãos em Portugal e publica o hinário “Hinos e Cânticos Espirituais”.

No Brasil, o movimento teve início em 1878 com a chegada do missionário inglês Richard Holden. As comunidades locais, conhecidas como “Casas de Oração”, enfatizam a autonomia congregacional, a liderança colegiada de anciãos e a dedicação ao evangelismo. No Brasil as estatísticas mais recentes indicam a existência de centenas de igrejas locais, concentradas principalmente em Minas Gerais e no Rio de Janeiro.

O Movimento dos Irmãos na Itália teve sua origem nas Igrejas Cristãs Livres, fundadas na Toscana em 1833 pelo conde Piero Guicciardini e Teodorico Pietrocola Rossetti, que tiveram contato com o movimento no exílio. Influenciadas pelos Irmãos de Plymouth, essas igrejas rejeitaram a organização hierárquica e a ordenação de pastores, preferindo que a liderança fosse exercida por anciãos. A autonomia das igrejas locais se tornou um princípio central.

O movimento se expandiu da Toscana para o resto do país, com a ajuda de missionários ingleses. Em 1891, foi criada a Opera delle Chiese Cristiane dei Fratelli, um ente moral que centralizava a administração material das igrejas, permitindo sua continuidade e crescimento. Durante o período fascista, enfrentaram repressão devido à falta de uma estrutura formal centralizada. Após a Segunda Guerra Mundial, o movimento consolidou-se, estabelecendo fortes laços com o evangelicalismo internacional. Atualmente, existem 286 assembleias dos Irmãos na Itália, que se consideram um movimento de igrejas autônomas e não uma denominação formal.

No mundo, o movimento cresceu e se expandiu, contando com mais de dois milhões de seguidores em mais de 140 países.

George Müller

George Müller (1805-1898) foi um evangelista e líder do movimento dos Irmãos (de Plymouth), além de humanitário e defensor dos órfãos.

Nascido na Alemanha, Müller tornou-se missionário na Inglaterra onde fundou vários orfanatos e escolas que cuidaram de milhares de crianças.

Müller ficou conhecido por sua fé na provisão de Deus e sua confiança na oração pelas necessidades de seus ministérios. Fundou seu primeiro orfanato em Bristol e recusava a pedir dinheiro ou fazer apelos de arrecadação de fundos, mas, em vez disso, confiou que Deus supriria as necessidades dos orfanatos e escolas.

Seus diários e escritos documentam muitos exemplos da provisão milagrosa de Deus, incluindo a provisão de alimentos, roupas e até mesmo edifícios.

A influência de Müller no movimento dos irmãos foi significativa, pois sua fé e confiança na oração inspiraram muitos crentes a confiar na provisão de Deus para suas próprias vidas e ministérios. Defendeu o estudo pessoal da Bíblia e do evangelismo, encorajando os crentes a compartilhar sua fé e fazer discípulos.

Brian McLaren

Brian D. McLaren (nascido em 1956) é um pastor, autor e líder do movimento da igreja emergente.

McLaren nasceu em uma família aderente ao movimento dos Irmãos. Nos anos 1980 tornou-se pastor em uma igreja evangelical, testemunhando seu crescimento.

Nos anos 2000 foi expoente de uma tendência evangelical ecumênica e progessista, defendendo uma “ortodoxia generosa” pluralista.

BIBLIOGRAFIA

McLaren, Brian. A Generous Orthodoxy: Why I Am a Missional, Evangelical, Post/Protestant, Liberal/Conservative, Mystical/Poetic, Biblical, Charismatic/Contemplative, Fundamentalist/Calvinist, Anabaptist/Anglican, Methodist, Catholic, Green, Incarnational, Depressed-yet-Hopeful, Emergent, Unfinished CHRISTIAN. Zondervan, September 2004.

John Nelson Darby 

John Nelson Darby  (1800-1882) foi um pregador do movimento que se tornou os Irmãos (de Plymouth), por vezes referidos como Darbistas por sua influência.

Inicialmente treinado como jurista e pastor anglicano, aderiu a um movimento antidenominacional primitivista que examinava a Bíblia na Irlanda e sul da Inglaterra. Leitor ávido das Escrituras, elaborou uma interpretação dispensacionalista da história e escatologia.

Esteve na Europa continental onde animou o Réveil genebrino, bem como propagou suas ideias nos Estados Unidos, tendo influenciado D. L. Moody.