Haustafeln

Haustafeln (alemão tabelas ou mesas da casa). A origem do termo é atribuída a Martinho Lutero e refere-se ao gênero textual sobre conselhos das relações domésticas.

Esse tipo de conselhos para maridos, esposas, filhos e servos ocorrem vagamente em autores estóicos como Sêneca, Plutarco e Epiteto e entre judeus helenistas, como Filo e Pseudo-Focílides (versos 175-227).

Aparece distintivamente como um gênero textual altamente desenvolvido nos escritos do Novo Testamento.

Lembrando que as igrejas primitivas eram instituições domésticas, não havia distinção entre Igreja e a Casa. É possível que em Paulo, Pedro ou Tiago haja uma apologia: o senhorio de Cristo já não colocavam os cristãos sob o controle da Lei, mas isso não significava uma imoralidade libertina. Antes havia um senhorio universal dos quais todos os crentes seriam partícipes e conviviam entre si com uma ética do amor e confiança na mesma Casa (domus ou domínio).

Entre escritos cristãos do século II, alguns atos apócrifos ou as epístolas de Inácio, retratam, de modo menos elaborado, os cristãos em uma relação de comensalidade. Essa literatura apresentava os cristão como boas pessoas e honrando a família, não o povo esquisito que os detratores queriam apresentar. Não seriam libertinos (vide o Satiricon de Petrônio para constatar o clima dos banquetes romanos), nem misteriosos como os cultos iniciáticos ou associações mortuárias. É uma evidência e ideal de como o cristianismo primitivo se via como uma irmandade, sob o pater familias que seria Cristo.

Os principais textos desse gênero são:

Ef 5:22-6:9, com paralelos em Cl 3:18-4:1.

Aparições menos explícitas ocorrem em 1 Tm 2:1-8; 3:1; 5:17; 6:1; Tt 2:1-10; 1 Pe 2:13-3:7.

BIBLIOGRAFIA

Standhartinger, Angela. “The Origin and Intention of the Household Code in the Letter to the Colossians.” Journal for the Study of the New Testament 23, no. 79 (2001): 117-130.

Martin, Clarice. “The Haustafeln (Household Codes) in African American Biblical Interpretation: ‘Free Slaves’ and ‘Subordinate Women.’ ” In Stony the Road We Trod: African American Biblical Interpretation, edited by Cain Hope Felder, 206–231. Minneapolis: Fortress, 1991.

Rebeca

Rebeca, em hebraico רִבְקָ֣ה, em grego, Ῥεβέκκα, é uma das matriarcas. Aparece em Gênesis em dois ciclos narrativos (Gn 24–27) . Um é o romance do matrimônio com Isaque. Outro ciclo é sua relação com seus filhos e sua preferência por Jacó.

O significado do nome Rebeca é incerto. Uma sugestão é que seja cognato com o árabe, rabqat, corda de amarrar para animais ou um laço. Figurativamente, indicaria uma beleza cativante.

O primeiro ciclo narrativo começa quando Abraão enviou seu servo Eleazar à Padã-Arã para arranjar o casamento para Isaque. O servo acaba por encontrar-se com Rebeca. É peculiar a linhagem identificada por linha materna. Rebeca diz a Eleazar que é filha de Betuel, filho de Milca e Naor (Gn 24:24) e irmã de Labão, o arameu (Gn 25:20). Rebeca é um raro caso de monogamia nas narrativas patriarcais e aparece em uma relação de jocosa amizade com seu esposo.

No segundo ciclo narrativo, Rebeca é a mãe dos gêmeos Esaú e Jacó. Iniciamente, o casal não teve filhos e é atribuída a esterilidade a Rebeca, mas Deus atende a oração de Isaque para que tenham filhos (Gn 25:21). Rebeca favorece o filho mais jovem. Não só a matriarca dá instruções a seu filho Jacó para enganar Isaque como depois instrui sua fuga e início de vida própria.

À época da partida de Jacó Rebeca e Isaque ficaram em Berseba (Gn 26:23) no Poço Laai-Roi (Gn 25:11), Manre, depois em Quiriate-Arba que é Hebrom (Gn 35:27).

À sua morte, Rebeca foi sepultada em Macpela (Gn 49:31).

Sua única menção fora de Gênesis aparece em Rm 9:10.

BIBLIOGRAFIA

DE ANDRADE, Altamir Celio. “Sobre rostos e distâncias: deslocamentos nas narrativas bíblicas de Sara e Rebeca.” Soletras 38 (2019): 72-88. DOI: https://doi.org/10.12957/soletras.2019.43412

HAVRELOCK, Rachel. “The Myth of Birthing the Hero: Heroic Barrenness in the Hebrew Bible.” Biblical Interpretation 16, no. 2 (2008): 154-78.

PERRY, Menakhem. “Counter-Stories in the Bible: Rebekah and Her Bridegroom, Abraham’s Servant.” Prooftexts 27, no. 2 (2007): 275-323.

QUESADA, Jan Jaynes. “Rebekah: Model Matriarch.” Review and Expositor (Berne) 115, no. 4 (2018): 559-64.

SASSON, Jack M. “The Servant’s Tale: How Rebekah Found a Spouse.” Journal of Near Eastern Studies 65 (2006): 241-265. https://www.jstor.org/stable/10.1086/511101

SCHLÜTER, Margarete. “Bible and Midrash: The Story of “The Wooing of Rebekah” (Gen. 24).” Journal for the Study of Judaism in the Persian, Hellenistic, and Roman Period 38, no. 3 (2007): 431-33.

TSYMBALYUK, Oleg M,; MELNIK, Valery V. “Rediscovering the Ancient Hermeneutic of Rebekah’s Character.” Hervormde Teologiese Studies 76, no. 1 (2020): 1-8.  DOI: https://doi.org/10.4102/hts.v76i1.5526

Raquel

Raquel, em hebraico רָחֵל‎, ovelha, em grego Ῥαχήλ, filha mais nova de Labão, irmã de Leia e segunda esposa de Jacó. Aparece no ciclo de Jacó (Gn 29-35) como sua esposa amada. Seria a mãe de José e Benjamim.

Jacó enamorou-se de Raquel (Gn 29), mas é engando a casar-se com sua irmã mais velha, Leia. Mais sete anos Jacó serviu ao sogro Labão para ter Raquel como esposa.

Quando a família de Jacó foge de Labão, Raquel rouba os terafim de seu pai (Gn 31:19).

Raquel, como Sara e Rebeca, não conseguia engravidar. Então, Raquel tornou-se mãe de Dã e Naftali mediante sua serva Bila.

Raquel é o primeiro caso relacionado de morte na gravidez na Bíblia, morrendo no nascimento de Benjamim. Foi sepultada em um lugar próximo a Belén, diferente de outros patriarcas e matriarcas sepultados em Macpela. (Gn 35:16-20).

Fora de Gênesis, Raquel aparece quatro vezes na Bíblia. Em Rute 4:11, Raquel é mencionada com Leia como as matriarcas do povo de Israel. Em 1 Sm 10:2, Samuel unge Saul e o instrui a encontrar dois homens perto do túmulo de Raquel. Em Jer 31:15 é retratada chorando pelo destino de seus filhos, os descendentes perdidos de Efraim, filho de José – as 10 tribos do norte dizimadas pelos assírios. Em Mateus 2:18, a alusão de Raquel chorando por seus filhos de Jer 31:15 refere-se ao massacre dos inocentes por Herodes.

BIBLIOGRAFIA

BELLIS, Alice Ogden. “A Sister Is a Forever Friend: Reflections on the Story of Rachel and Leah.” The Journal of Religious Thought 55, no. 2 (1999): 109.

CLAASSENS, Juliana. “Reading Trauma Narratives : Insidious Trauma in the Story of Rachel, Leah, Bilhah and Zilpah (Genesis 29-30) and Margaret Atwood’s The Handmaid’s Tale.” Old Testament Essays 33, no. 1 (2020): 10-31.

SCHNEIDER, Tammi. Mothers of Promise: Women in the Book of Genesis. Grand Rapids: Baker Academic, 2008.

WOLOWELSKY, Joel B. “Rachel’s Burial.” The Jewish Bible Quarterly 35, no. 2 (2017): 111-14.

Sara

Sara, em hebraico שָׂרָ֖ה, grego Σαρρα, a primeira das quatro matriarcas hebraicas, esposa de Abraão. Sua história aparece primariamente no Ciclo de Abraão (Gn 11:26-25:12) em Gênesis.

O nome Sarai, e sua variante Sara, significa “princesa” ou “dama”. Possivelmente é cognato do acadiano Sharratu, o nome da esposa do deus da lua Sin.

De origem provavelmente mesopotâmica, acompanhou o marido em suas peregrinações para Canaã e Egito. (Gn 11:29-31; 12:5). Chamada de irmã de Abraão (Gn 12:10-20; 20:1-18) em incidências quando ela foi tomada por governantes contra sua vontade.

Por um longo período, Sara não teve filhos (Gn 11:29-30). Depois que sua serva Agar deu à luz Ismael (Gn 16:1-6; 21:9-14), Deus disse a Abraão, cujo nome até então era Abrão, para mudar o nome de “Sarai” para “Sara” (Gn 17:15). E anunciou que ela viria a ser mãe de um filho.

No nascimento de seu filho, Isaque (que significa risos ou gargalhadas) teria dito “Deus me fez rir, para que todos os que ouvem riam de mim” (Gn 21:1-7).

A morte de Sara é registrada com brevidade. Teria morrido em Quiriate-arba ou Hebrom à idade de 127 anos. Foi enterrada por Abraão na caverna de Macpela (Gn 23; 25:10; 24:67).

Nenhuma outra referência a Sara aparece nas Escrituras Hebraicas, exceto em Is 51:2. Lá, o profeta apela “Olhai para Abraão, vosso pai, e para Sara, que vos deu à luz; porque, sendo ele só, eu o chamei, e o abençoei, e o multipliquei”.

No Novo Testamento Sara aparece no elenco dos heróis da fé de Hebreus 11: “Pela fé, também a mesma Sara recebeu a virtude de conceber e deu à luz já fora da idade; porquanto teve por fiel aquele que lho tinha prometido” (Hb 11:11). Paulo faz menções a ela (Rm 4:19; 9:9; Gl 4:21), utilizando-a como um tipo, principalmente em contraste com Agar.

Sara aparece citada em 1 Pe 3:6 como exemplo de obediência. Entretanto, não há parte em Gênesis em que Sara chama-o de Senhor, exceto Gn 18:12, onde não se refere a obediência. Ademais, Abraão é retratado obedecendo as vontades de Sara (Gn 16:2, 6; 21:12). Josefo (Contra Apião 2.25) e Filo (Hypothetica 7.3) retratam Sara como exemplo obediência, revelando ser esse o entendimento do século I d.C.

BIBLIOGRAFIA

AGUILAR, Grace. “Sarah The Women of Israel. Vol. 1. 1845

AMOS, Clare. “Genesis.” Global Bible Commentary. Edited by Daniel Patte. Nashville, Tenn.: Abingdon, 2004. Pp 1–16.

ANGEL, Hayyim. “Sarah’s Treatment of Hagar : Morals, Messages, and Mesopotamia.” The Jewish Bible Quarterly 41, no. 4 (2013): 211. 

BARBOSA, Tereza Virgínia Ribeiro. “Sara e Hagar: amor e sacrifício no caminho da família de Abraão.” Estudos Bíblicos 33.129 (2016): 45-57. https://revista.abib.org.br/EB/article/view/139

BAXTER, Elizabeth. “Sarah – Hebrews 11:2”. The Women in the Word. 1897. https://www.blueletterbible.org/Comm/baxter_mary/WitW/WitW03_Sarah1.cfm  e https://www.blueletterbible.org/Comm/baxter_mary/WitW/WitW04_Sarah2.cfm

BREWER-BOYDSTON, Ginny. “Sarah the Gevirah: A Comparison of Sarah and the Queen Mothers, of Matriarchs in the Dynastic Succession of Sons and Nations.” Review and Expositor (Berne) 115, no. 4 (2018): 500-12.

CLAASSENS, Juliana. “Just Emotions: Reading the Sarah and Hagar Narrative (Genesis 16, 21) through the Lens of Human Dignity.” Verbum Et Ecclesia 34, no. 2 (2013): 1-6. https://verbumetecclesia.org.za/index.php/VE/article/view/787

DIAS, Elizangela Chaves. Sarai como esposa e irmã de Abrão: um estudo
exegético de Gn 12,10-13,1a. (Dissertação de Mestrado). Pontifícia
Universidade Católica, Teologia, São Paulo, 2011.

DIAS, Elizangela Chaves. “Útero estéril e sepultura: a participação de Sara nas promessas feitas a Abraão.” Revista de Cultura Teológica 90 (2017): 69-81.

DIAS, Elizangela Chaves. “A vida de Sara e o cumprimento da Promessa-Aliança.” Atualidade Teologica 24.66 (2017).

FRANKEL, Ellen. The Five Books of Miriam: A Woman’s Commentary on the Torah. San Francisco: HarperSanFrancisco, 1996.

GARIN, Norberto. “Sara, uma mulher idosa: a manifestação da força de Javé.” Estudos Bíblicos 22.82 (2004): 42-48.

GOSSAI, Hemchand. Barrenness and Blessing. Havertown: Lutterworth Press, 2010.

HAVRELOCK, Rachel. “The Myth of Birthing the Hero: Heroic Barrenness in the Hebrew Bible.” Biblical Interpretation 16, no. 2 (2008): 154-78.

HEPNER, Gershon. “Abraham’s incestuous marriage with Sarah: a violation of the Holiness Code.” Vetus Testamentum 53, no. 2 (2003): 143-55.

KILEY, Mark. “Like Sara: The Tale of Terror behind 1 Peter 3:6.” Journal of Biblical Literature 106, no. 4 (Dec 1987):689–92.

LISBÔA, Célia Maria Patriarca; COSTA, Rute Ramos da Silva. “Não oprimirás o estrangeiro negro Aportes sobre migração no Ciclo de Abraão e Sara.” Bíblia e Migração: 73.  https://www.csem.org.br/wp-content/uploads/2022/01/E-book_BIBLIA_e_MIGRACAO_2022_FINAL.pdf#page=74

MCDONALD, Joseph Loren. Searching for Sarah in the second temple era: Portraits in the Hebrew Bible and Second Temple narratives. Texas Christian University, 2015.

OKOYE, James C. “Sarah and Hagar: Genesis 16 and 21.” Journal for the Study of the Old Testament 32, no. 2 (2007): 163-75.

REINHARTZ, Adele; WALFISH, Miriam-Simma. “Conflict and Coexistence in Jewish Interpretation.” Hagar, Sarah, and Their Children: Jewish, Christian, and Muslim Perspectives. Louisville, KY.: Westminster John Knox, 2006, pp. 101–126.

REIS, Pamela Tamarkin. “Take My Wife, Please.” Judaism 41, no. 4 (1992): 306-15.

ROSEN, Norma. Biblical Women Unbound: Counter-Tales. Philadelphia: Jewish Publication Society, 1996.

SABBATH, Roberta. “Jouissance and Trauma in Sarah’s Laugh and Aporia: The Construction of Collective Identity in the Parshat VaYera.” Journal of Ecumenical Studies 55, no. 3 (2020): 346-59. 

SLY, Dorothy I. “1 Peter 3:6b: In light of Philo and Josephus.” Journal of Biblical Literature 110, no. 1 (Spring 1991): 126–29.

TUSHIMA, Cephas T.A. “Exchange of Wife for Social and Food Security: A Famine Refugee’s Strategy for Survival (Gn 12:10–13:2).” Hervormde Teologiese Studies 74, no. 1 (2018): 1-9.

TRIBLE, Phyllis. Texts of Terror: Literary-Feminist Readings of Biblical Narratives. Philadelphia: Fortress, 1984.

YANOW, Dvora. “Sarah’s Silence: A Newly Discovered Commentary on Genesis 22 by Rashi’s Sister.” Judaism 43, no. 4 (1994): 398.

ZUCKER, David J. “What Sarah Saw.” The Jewish Bible Quarterly 36, no. 1 (2008): 54-62.

VER TAMBÉM

Tabuletas de Nuzi